TEORIAS DO CAOS - Opinião de José Manuel Ribeiro
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Nas duas últimas décadas do século XX: dois campeonatos para o Sporting, sete para o Benfica e onze para o FC Porto. Nos primeiros 21 anos do século XXI: um campeonato para o Boavista, dois para o Sporting, sete para o Benfica e onze para o FC Porto (obviamente, sem contar o atual). Quarenta anos depois, o "statu quo" do futebol pós Pinto da Costa permanece intocado.
Percebem-se a perplexidade e o estado de negação perpétua dos adversários, de que esta última semana foi exemplo eloquente. Por estes dias, na Alemanha e na Imprensa internacional, a iminência do 10.º título seguido do Bayern pôs muita gente a refletir no aborrecimento que é uma Bundesliga tão monopolizada, mas há unanimidade quanto aos motivos.
O Bayern foge à lógica dos megaclubes, por saber gerir o dinheiro, influência e dimensão mundial que tem. Um tonto como o Manchester United melhoraria a competição. O FC Porto não cai na definição de megaclube. Só fugazmente teve mais dinheiro do que os adversários, não mora na capital, não tem boa Imprensa, não tem a maioria dos adeptos e não tem influência política comparável. E também, ao contrário do Bayern, não tem rivais a reconhecerem que vence por ser bem gerido.
Apesar disso, resistiu a quarenta anos de circunstâncias que variaram muito. O principal erro da expressão de Frederico Varandas é que não houve "quarenta anos disto". Foram muitos "disto" diferentes. Da profissionalização do futebol às regras pós-Bosman; de um tempo em que se fazia uma venda por ano até ao atual mercado; das equipas técnicas com dois elementos até aos pelotões de especialistas; dos adversários milionários aos adversários falidos; dos velhos estádios ao luxo do Euro"2004; da Taça dos Campeões à Liga dos Campeões: a tudo o FC Porto de Pinto Costa respondeu com a mesma quota-parte de vitórias, pontuadas pelas regulares explosões internacionais.
Mas não se manteve imune apenas a essas circunstâncias. Viveu bem com as batalhas nas assembleias gerais da FPF, em que cada elemento dos Conselhos de Arbitragem, Justiça e Disciplina significava uma guerra por si só. Viveu bem com o nascimento da Liga e, mais tarde, com a transferência para lá da organização do futebol profissional. Viveu bem com o regresso da Arbitragem e da Disciplina à FPF, ou seja, a Lisboa, por magistério de influência dos clubes da capital. Viveu bem com nomeações diretas e viveu bem com sorteio dos árbitros. Viveu bem com a arbitragem na mão de advogados, juízes, ex-árbitros, portuenses, lisboetas, castanhos e amarelos aos quadrados. Viveu bem antes do Apito Dourado e viveu ainda melhor depois. Viveu bem com os "Donos da Bola" (SIC), com o Correio da Manhã e com a CMTV. Viveu bem na pobreza, durante a intervenção da UEFA, e nos quatro ou cinco anos de vacas gordas deste século. Viveu bem quando Pinto da Costa foi amigo de Fernando Martins, Manuel Damásio, Dias da Cunha e Luís Filipe Vieira, e viveu bem em conflito com os três últimos.
Só um aspeto se manteve relativamente inalterado nas tais quatro décadas: a desvalorização de cada uma das suas vitórias pelos adversários. Passados tantos anos, deve estar bem claro para todos que resulta às mil maravilhas.