Saber apontar asneiras e erros à gestão do futebol nos clubes não habilita ninguém para um trabalho que é ligeiramente mais complicado do que virar frangos
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Por ingenuidade, deformação profissional, ou traumatizado por estar a gerir um jornal nos piores dez anos da história das notícias impressas, supunha que administrar um grande clube de futebol, sobretudo português, fosse complicado. Mas há dezenas de cidadãos capazes de tratar disso com uma perna às costas, alguns até com duas, e estou a limitar-me aos que aparecem nos jornais e nas televisões.
A maioria são pessoas que só conhecem o jogo a partir da bancada, por isso imaginem como serão geniais quando aprenderem que o golo de placa dispensa a intervenção de uma prótese dentária. Até ler e ouvir estes especialistas, não imaginava que o treinador perfeito estivesse sempre ali à mão para contratar; nem que fosse tão simples deslindar quem é esse príncipe encantado; ou que comprar um craque fosse como encomendar um DVD pela Amazon; que renovar contratos com jogadores aos quais o Brighton e o Watford oferecem o triplo fosse uma formalidade; que chovessem ofertas multimilionárias sempre que estalamos os dedos para vender um excedentário; que os balneários estivessem cheios de criancinhas doces e bem-mandadas; que os postes pudessem ser ensinados a desviarem-se das bolas nos play-off para a Liga dos Campeões, etc.
Ao fim de 32 anos, revela-se diante de mim um futebol maravilhoso e até aqui desconhecido, sem medos, nem incertezas, onde tudo sucede de acordo com as previsões, como nas fábricas de sabonetes ou nos tribunais portugueses quando julgam crimes de colarinho branco.
É evidente que nas administrações do Benfica, do FC Porto, do Sporting e do V. Guimarães, agora todas em debate por diferentes motivos, houve erros graves com consequências que, nalguns casos, se arrastam há anos e que levarão mais tempo ainda a desaparecer. Mas saber apontar-lhes o dedo não habilita ninguém para esse trabalho, mais ainda quando se começa por negar o óbvio: que gerir futebol, por estes dias, é uma missão difícil.