Os clubes profissionais insistem em que toda a gente saiba que eles são péssimos a autorregular-se. Fazem-no a despeito da ameaça séria de perderem essa benesse e por motivos cada vez mais fúteis
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No mesmo dia em que Rui Costa se sentou a uns seis metros de mim, na homenagem ao presidente da FPF, o Benfica entendeu exigir a Fernando Gomes que demita o Conselho de Disciplina, coisa que ele não tem poderes para fazer, como os clubes sabem.
Por um misto de instinto pessoal e boa retaguarda, Gomes fez o milagre de criar à sua volta um consenso nunca visto, pelo menos nos últimos 40 anos, mas nem ele consegue ser poupado às pantominices.
Os clubes estão para a disciplina como as sociedades de advogados estão, demasiadas vezes, para as leis anticorrupção: legislam em causa própria. E é bastante claro que não sabem a sorte que têm, mesmo depois de travada uma conspiração política, na Assembleia da República, para retirar à Liga o poder de estabelecer os seus próprios regulamentos.
O mais absurdo é que esta confissão crónica de incapacidade para se autorregularem passou a fazer-se, desde a acalmia com José Manuel Meirim, pelos motivos mais fúteis: castigos por críticas à arbitragem, multas pelo comportamento dos adeptos, cartões amarelos e por aí adiante.
Nos velhos tempos, a fanfarra tocava por causa dos infames sumaríssimos, sombras nos túneis, membros da Comissão Disciplinar que alteravam relatórios dos árbitros, jogadores que arriscavam meses de suspensão, interferências diretas dos juristas nos onzes da jornada seguinte; coisas que podiam definir as épocas dos clubes. Agora, por razões que me escapam, eles sentem-se tão à vontade que acham seguríssimo chamar a atenção de quem, passe a expressão, lhes quer fazer a folha por causa de problemas que até já estão resolvidos - como deve ser o caso dos castigos imediatos a Conceição e Jesus.
Nem sequer o fizeram, no exemplo do Benfica, pela via construtiva (e vindo dali até é habitual) que seria exigir outra celeridade (ou explicações) à Comissão de Instrutores da SUA própria Liga. Foram antes acicatar a FPF, aí já com o FC Porto. Se foi de propósito, e o deputado Emídio Guerreiro (o da conspiração) estava atento, talvez tenha sido inteligente.