"Chamamento à reza" é rito religioso que não deixa ninguém indiferente, assim como as desigualdades salariais entre aqueles que detêm cidadania catari e os imigrantes. Poligamia também é realidade.
Corpo do artigo
Os relógios marcam 4h45 em Doha, a madrugada vai longa e silenciosa. No minuto seguinte, tudo muda. Os altifalantes das mesquitas da cidade dão voz (bem audível) ao chamado "chamamento à reza", que motiva os habitantes da capital do Catar a cumprirem um rito que vão repetir mais quatro vezes ao longo do dia, mediante o curso do Sol.
Apenas um dos muitos costumes a que, ao longo do próximo mês, visitantes de todo o mundo terão de se habituar. Não há como negar: para quem vem do ocidente e nunca visitou o Médio Oriente, entrar nesta cultura representa uma mudança brusca de realidade nos mais diversos setores, da vida profissional à conjugal.
A população do país anfitrião do Mundial não chega aos três milhões e, desse número, apenas 300 mil são oficialmente cidadãos catari. A predominância é masculina - os homens vestem o "thobe", um traje tradicional branco - e, dentro desse lote mais restrito, há permissão para desposar até quatro mulheres, sendo que, como é sabido, a homossexualidade é considerada ilegal. O pai do atual emir, por exemplo, tem uma casa para cada uma das quatro esposas. Por norma, cada casal contrata uma "maid" (nome dado às amas) por cada filho que tem. Estas famílias recebem uma percentagem dos dividendos referentes ao setor do petróleo e, como tal, não são obrigadas a trabalhar, um direito que lhes é conferido pela ascendência. Há, ainda assim, quem o faça, originando injustiça salarial para com os imigrantes (ver caixa) - indianos, nepaleses, paquistaneses e mais -, que, por sua vez, constituem o grosso da população do Catar.
Há um cartão de saúde para todos os cidadãos legais, os hospitais privados recebem, muitas vezes, doentes encaminhados do público e, no que diz respeito à comunidade portuguesa, há cerca de 1500 representantes.
Nesta fase, os dias terminam cedo, por volta das 17h00. Depois dessa hora, os altifalantes ainda voltam a soar, pouco depois das 18h00. A música pára e, de certo modo, a cidade também. Um chamamento que não deixa esquecer onde se está.
FIFA estabeleceu salário mínimo
O salário mínimo só se tornou uma realidade no Catar em março de 2021, graças à intervenção da FIFA. O valor estabelecido é de 1000 reais - menos de 300 euros -, um valor francamente baixo e que ganha ainda menor dimensão quando se percebe que um imigrante só pode trazer o agregado familiar para o país se receber, no mínimo, 10 mil reais por mês. Refira-se, ainda, que só é possível permanecer no país por tempo indefinido na posse de um visto de trabalho e qualquer crime resulta em prisão ou deportação.