<strong>O JOGO - 35 ANOS || 1990 || A VÉNIA DE AURORA CUNHA - </strong>A vencedora do campeonato do Mundo de estrada recorda um seu mentor
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António Oliveira, que Ronfe conhece por Toninho Serralheiro ou senhor Oliveira, jogou futebol no Juventude, o clube daquela freguesia do concelho de Guimarães, extinto em 2006 para dar lugar ao Desportivo. Até que ao fim de dez anos contraiu uma lesão o obrigou a terminar a carreira. Pendurou as botas, mas não abandonou os relvados, muito menos o desporto, porque voltou "a trabalhar com os jovens da vila", como já antes tinha feito.
Ex-futebolista, ao ver a miúda ganhar a rapazes e raparigas percebeu que seria uma campeã
Chegamos à década de 1970, tempos de revolução. "Para comemorar o primeiro aniversário do 25 de Abril, o clube organizou uma corrida com as crianças, a que demos o nome de Pés Descalços, porque sabíamos que muitas até iam aparecer sem sapatos, porque não tinham. E foi aí que a Aurora apareceu, ganhando a prova, a rapazes e raparigas", conta o antigo futebolista nos tempos livres, de profissão mecânico na mesma empresa têxtil em que Aurora trabalhava.
Aquela vitória surpreendente fez com que a jovem fosse convidada para treinar no Clube Juventude de Ronfe às segundas e sextas-feiras, sob a orientação de Toninho Serralheiro, o grande dinamizador dos treinos de atletismo: "As crianças começam desde pequenas a mostrar certas aptidões e a Aurora tinha aptidão para uma modalidade desportiva mais dura. Vi que ela tinha um grande potencial", recorda António Oliveira, que resolveu levar uma equipa de seis atletas aos campeonatos nacionais de 1976, no Estádio do Jamor.
Não havia dinheiro para pagar um hotel ou uma pensão, mas Toninho resolveu o problema. acomodando-os em casa de um primo, que vivia em Monsanto. E Aurora agradeceu-lhe "naquela pista vermelha, com oito corredores, que parecia um sonho."
Com os sapatos de bicos de número acima ao tamanho dos pés, bateu dois recordes nacionais - um nos 1500 metros, que pertencia a Rosa Mota, e outro nos 3000 - e tornou-se a figura da prova. "Deu-me sempre uma alegria enorme ver o percurso da Aurora com tantas conquistas. Às vezes até me comovia... Sabia que tinha feito pouco, mas que tinha tido alguma influência nesses feitos", confessa António Oliveira, o homem que descobriu Aurora Cunha.