VISTO DO SOFÁ - Um artigo de opinião de Álvaro Magalhães.
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Se não for hoje que o FC Porto alcança o seu 30º. campeonato nacional (prefiro chamar-lhe assim), será no próximo sábado, na Luz, o que acrescenta ao feito um certo simbolismo (ou será só um certo sadismo?).
Em último caso, será na última jornada, no Dragão. Junte-se-lhe uma Taça de Portugal, ainda mais inescapável, e teremos duas vitórias em quatro provas, o que é uma grande proeza, dadas as circunstâncias dos últimos anos, em que a qualidade do plantel tem sofrido muito com a penúria financeira do clube. Valeu o recurso providencial à geração Youth League e valeu, mais uma vez, Sérgio Conceição, que foi capaz de transformar essa desgraça (financeira) em graça (desportiva).
No entanto, para segurar estes dois pássaros foi preciso deixar voar para longe um passarinho e um passarão. O passarinho foi a Taça da Liga, essa excrescência, o passarão foi a vida internacional, que, essa sim, conta, e muito. Os portistas olhavam para a Champions, seu habitat natural, e viam lá o Sporting e o Benfica. Custou. Depois, veio o sonho da Liga Europa, dado o simbolismo de Sevilha, onde se jogará a final (lá está, mais vida simbólica, parece que precisamos disso). Não era, mas parecia o destino a juntar o 30º. campeonato à 3ª. Liga Europa: ora, digam lá 33 (30 + 3). Mas a venda forçada de Luis Díaz, depois das saídas de Corona e Sérgio Oliveira, logo soterrou o sonho. «Temos de rever os objectivos», disse, na altura, Sérgio Conceição. Entregar a eliminatória ao Lyon fez parte dessa revisão.
Para a realidade dos nossos clubes, com os seus plantéis escassos e débeis, viver a dobrar, cá dentro e lá fora, é problemático. O Sporting foi campeão e brilhou, na época passada, quando não teve vida europeia. Nesta época, teve dessa bela vida, mas logo pagou o preço. E o Benfica fez peito na Champions, enquanto acumulava fracassos caseiros (15 pontos perdidos, só em casa). Ou se tem isto ou se tem aquilo. Os portistas tiveram isto, e já foi muito bom. Aquilo fica para a próxima.
Vem aí, portanto, mais um alvoroço festivo da tribo azul e branca. E agora também com um certo aroma a fim de ciclo; e, claro, ao início de um outro. Limite e limiar, ao mesmo tempo. Explico: Sérgio Conceição quer partir para uma outra aventura, talvez mais descansada, pois considera que se cumpriu o ciclo dele no clube; e um ciclo de cinco anos, nos tempos que correm, é um ciclo alargado. Por sua vez, o presidente festeja impensáveis (o adjectivo é dele) 40 anos de presidência e por alguma razão falou da sua sucessão, garantindo neutralidade na hora de passar o testemunho (outra expressão dele).
Nunca o passado do clube foi tão evocado e nunca se falou tanto do futuro e de uma nova era, pós-Pinto da Costa, que sempre fora cuidadosamente omitida por toda a gente, como se não estivesse prevista. Daí que os portistas experimentem, por estes dias, uma espécie de sentimento de eternidade, que entretece o que já foi, o que é e o que será. E quando chegar o preciso instante em que o 30º. título está garantido, passado, presente e futuro serão uma coisa só.