PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - Apenas noventa minutos para o fim. Da Luz ao Dragão, dois pontos de distância. O título a apenas um empate do Benfica. Pela frente, um onze do Santa Clara cheio de bons tecnicistas (Ricardinho, Bruno Almeida, Gabriel Silva e outros) que se deixaram enigmaticamente arrastar segurando a "lanterna vermelha". Podem, mesmo num cenário de tudo contra, jogar sem pressão e engatar jogadas de perigo porque para eles os últimos jogos têm essencialmente sido brincar com a bola.
Pode, por isso, ser um último jogo "meio partido", sem nuvens de tática, além daquela que pairou e, quando ficou perturbantemente nublada, mudou traços do jogo de Schmidt que até ficar com dez pontos de avanço na liderança quase jogava (e ganhava) em piloto tático automático. O sistema-Schmidt teve então de procurar novas nuances.
Descobriu, como o definiu o treinador, o "jogador especial e surpreendente" que andava a treinar bem e merecia oportunidade no onze principal (que então também precisa de algo especial) e deu a importância e utilização certa que há muito merecia David Neres (e a equipa clamava quando tantas vezes presa no 4x4x2 quadrado dos quatro médios) para, com o poder do extremo, de face moderna em diagonais, fintas, passes, golos (que mais existe para um avançado desequilibrador fazer?) a abrir as latas defensivas mais fechadas. Assim foi, e a equipa geriu a vantagem e margem de erro até este último jogo.
2 - Do outro lado, o FC Porto nunca desviou o olhar ou tremeu nervos da face. Ganhou os seus jogos todos. Manteve um foco invulgar para a equipa grande candidata que fica tão distante do primeiro lugar (quantas vezes no passado vimos isso acontecer) e nunca desligou da perseguição. Mesmo num clube que cresceu como movimento "contra poder centralista" esse foco teve um catalisador de ADN decisivo: o treinador Sérgio Conceição.
É incrível como tanto se fala das suas ações/reações (condenáveis nos bons costumes) no banco e proporcionalmente tão pouco do que é a questão tática e mental (armas em diferentes momentos ao longo das épocas) na expressão da equipa que dirige e faz jogar como um exército. O último jogo com o Vitória terá essa concentração e um atento neurónio subconsciente esperando o que todos dizem ser o tal "resultado impossível" do jogo da Luz.
3 - No futebol dialogam sempre as emoções e as razões. Sem uma delas, qualquer equipa estará incompleta. Benfica e FC Porto talvez comecem estes últimos jogos no sentido inverso dessas sensações: razão (na Luz) e emoção (no FC Porto) para no fim terminarem no polo oposto.
Pode ser estranho para a terrível dicotomia ganhador-perdedor, mas olhando todo o campeonato, acho possível dizer que ambos tiveram uma época de sucesso. Tiveram fome de futebol e a decisão merece ir até ao último jogo.
Os primeiros a ganhar ou cair
Ninguém ganha uma batalha sozinho por mais forte que seja. Por mais que alguém seja grande, o mundo que o rodeia é mais. Se nem Napoleão ou César (indo aos clássicos da história) conseguiram, por que o faria, no futebol (indo aos clássicos do nosso tempo e tema), um treinador?
A equipa faz-se de tantas variantes e impactos que é impossível o treinador a guiar sem esse suporte. Uns mais do que outros, é verdade. Ouço Amorim antes do último jogo, já desligado do campeonato, e percebe-se isso através da forma como ganhou e agora perdeu. Não há muita ciência de análise nisso.
O campeonato está a esvaziar-se e dos quatro que desde início se sabia irem meter-se lá em cima, o Sporting foi o primeiro a descer. O clube está com demasiados problemas para falar em superprojetos. O treinador sofre (sente) com isso. O Braga aguentou desafiando os seus limites e caiu quando estes (subindo o nível de exigência além da realidade virtual) o venceram. Restam os dois principais suspeitos do costume, Benfica e FC Porto, cada qual com "treinadores de autor" nas equipas (embora o impacto de Schmidt, só com uma época, ainda se terá de medir com o tempo e mais épocas). Em algum momento irá precisar de algo mais. É a impossível solidão do treinador. Em qualquer local.