Taremi tem a memória do jogo impecável mas precisa de quem o entenda junto a ele
PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
Corpo do artigo
1 - Foi um lance como uma cena da Marvel. A velocidade com que o super herói de 40 anos recuperou metros ao ponta-de-lança que fugia isolado desde o meio-campo até o apanhar e, de carrinho, fazer o corte e travar o remate. Pepe desafia os limites humanos do futebolista e nesse lance segurou uma equipa que buscava o golo frente ao adversário que resistia com dez jogadores.
Colocando Otávio como nº8 dum meio-campo "a dois", Conceição ganhava a bola no setor central do jogo mas sentia falta mais à frente do último passe (a solicitar finalização) que o mesmo jogador, que também pode ser nº10 ou falso ala a fletir para dentro, dá ao jogo ofensivo da equipa.
Sem ele, a falta dessa definição tornou a equipa mais ansiosa mesmo resgatando a dupla Tarem-Evanilson. Nenhum está no seu melhor momento de forma. Taremi tem a memória do jogo impecável mas precisa de quem o entenda junto a ele, só que o melhor Evanilson (o de "só" rematar/encostar) não está com o mesmo nível de antes a adivinhar as jogadas.
Por isso, vê-se hoje mais a garra do que classe. No fundo, a explicação para Toni Martínez entrar sempre tão bem nestes últimos jogos embora, olhando o ataque, quem vejo melhor a mover-se, pensar (sem ansiedade) e executar seja Namaso. Como espécie de segundo avançado, é o jogador que mais evoluiu a nível de "tática individual" desde início da época.
2 - Schmidt cedeu ao sentimento de ter de mexer na equipa e criou um novo duplo pivô que tinha as melhores intenções em termos de construção em posse mas não tinha a melhor complementaridade de sentido posicional equilibrador para recuperar, passar e subir.
Ou seja, Chiquinho e João Neves pensam o jogo todo com bola ou à espera dela quando uma dupla de médios-centro necessita da complementaridade de quem antes segure a equipa sem ela para a recuperar e garantir o equilíbrio defesa-ataque-defesa.
Por isso, tudo mudo com Florentino, um jogador que pelas características de nº6 farol-recuperação-passe curto é indispensável ao onze até para fazer jogar melhor o nº8 que tem uns metros à frente. Neves ficou automaticamente melhor jogador (mais solto) quando Florentino passou a jogar atrás/perto dele. Sentiu que tinha as costas protegidas, o que naturalmente não acontecia com Chiquinho que pensa o jogo da mesma forma (embora execute diferente, sobretudo, com mais passes do que a condução).
Não é o único problema do atual Benfica mas taticamente é o mais sensível numa altura em que intriga ver a quebra de forma de Rafa no um-para-um e a colocação de Aursnes a lateral-direito para segurar as pontas da equipa desde a faixa. Um dilema tático sobredimensionado pelas brasas emocionais.
A "competitividade mimada"
Vendo o jogo, vi a equipa a perder na segunda parte a intensidade no meio-campo que revelara na primeira. As características dos jogadores eram uma explicação para isso, num meio-campo "a dois" (em 3x4x2x1). André André e Janvier têm mais agressividade mas Dani e Handel (não havendo Tiago Silva) podiam dar melhor saída de bola. O que a equipa perderia, porém, em termos de segurança posicional defensiva não ganhou em construção móvel ofensiva e dessa forma perdeu o meio-campo por onde o Sporting passou a jogar com Ugarte a lançar Morita (ganhando um jogo que antes estava dividido).
No fim, Moreno levou a análise além-tática falando nos "jogadores mimados" que jogaram duma forma competitivamente irreconhecível. Não digo que estaria a falar destes que entraram em particular ou dos que saíam no decorrer desse período no qual, nem na largura ofensiva (a atacar) nem na intensidade interior (a pressionar/organização), a equipa não existiu. Foram, porém, esses os espaços em que ela encolheu até perder o jogo.
Este Vitória é uma equipa conceptualmente complexa desde início da época. Desde as ilusões dos bons momentos (táticos e competitivos) até aos de imaturidade para aguentar (com qualidade e mentalidade) os mais difíceis, na tática e na cabeça.
Craque: deita-se tarde?
Será que se deita tarde? Será que treina mal? Que tem mau feitio? Não sei mas confesso que faço estas perguntas para perceber por que Gabriel Silva não joga a titular no Santa Clara e só entra perto do fim. O seu futebol tem criatividade, desequilíbrio no um-para-um, técnica e visão (para desmarcação e condução, passe ou remate). É um avançado que, de origem, cai bem na faixa e aparece bem no centro. Se eu tivesse responsabilidade em qualquer clube não o deixava fugir. É craque. O resto, não sei, mas o que faz em campo basta.
Tática: o 1-2 psicológico
Parecia ter o jogo ganho após primeira parte dominada em 3x4x3 (laterais Paulinho-Vitor Costa a subir e avançados em mobilidade, Félix Correia-Riascos-Vidigal). Fez 0-2 mas no decorrer da segunda parte sentiu-se a equipa a adormecer. O meio-campo (João Afonso-Val) começou a chegar mais tarde, os avançados a não pressionar e o Famalicão cresceu. Marcou e virou. José Gomes no fim falou em imaturidade e erros da equipa na qual demorou a mexer. Comentei o jogo e pressenti que, da forma como estava, a equipa não resistiria à adversidade de sofrer o 1-2. Assim foi. Um terceiro médio quando isso se pressentiu seria uma solução, até porque Xadas (que entrou) só joga com bola.
Goleador: Farense-Lucão
Onde acho mesmo que está um bom ponta-de-lança escondido, que nem sequer é titular, é na II Liga no Farense. Quem costuma jogar a nº9 é Pedro Henrique, mas o exemplar de que falo é Lucão. Tem presença entre centrais, velocidade de movimentos em espaços curtos e na execução do remate, forte e colocado. Com 22 anos, veio da Sanjoanense após ter chegado a Portugal em 2019 para o Braga sub-23. É potente (1,89m) e ágil. Não parece um jogador fácil mas tem de jogar mais e subir de nível.