Sporting precisou de 40 anos para perceber o que é ir a casa do FC Porto disputar um título
A JOGAR FORA - Opinião de Jaime Cancella de Abreu
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1 - Ponho o chapéu (que não uso) para o tirar a Frederico Varandas: por ter falado nos termos em que o fez, no local onde o fez, no momento em que o fez. Todavia, precisou o Sporting de 40 anos para perceber o que é ir a casa do FC Porto disputar um jogo do título.
Quando o Benfica ali viveu episódios dos mais vergonhosos da história do futebol português, à vista dos quais o que se passou na sexta-feira à noite não passou de uma brincadeira de meninos de coro, o Sporting sempre assobiou para o lado - desde que o Benfica saísse a perder, pouco lhe importavam as inadmissíveis pressões sobre os árbitros, as assassinas entradas a pés juntos que não valiam cartões amarelos quanto mais vermelhos, os golos limpos anulados sem que até hoje se consiga vislumbrar o motivo, as agressões impunes, algumas fáceis de enxergar até pelos mais míopes. Bem-vindo ao clube, amigo Varandas (com "dor de corno").
2 - O presidente da B-SAD, enredado em múltiplas trapalhadas, garantiu até à última hora que tinha jogadores suficientes para disputar o dérbi; o Benfica, no escrupuloso cumprimento dos regulamentos, subiu ao relvado do Jamor para não arriscar derrota por falta de comparência; e eu tive que me bater na Sport TV com os comentadores-adeptos dos rivais que me atiravam à cara as graves responsabilidades do Benfica - veja-se só, do Benfica! - nas degradantes imagens que do futebol português iam (ou já estavam) a correr mundo. Como poderia eu não recordar todos estes colegas no momento em que observava as vergonhosas cenas finais do clássico?
3 - Na hora da saída, é mais ou menos esta a ideia que os adeptos fazem de Pizzi: com crescente peso no balneário, foi um mau "influencer", um catalisador de hábitos perniciosos, um coveiro de treinadores também - nem o todo-poderoso e autoritário Jorge Jesus escapou! Dentro de campo, nos momentos difíceis, com a equipa a afundar-se, jamais se lhe testemunhou um grito de alerta, um gesto de revolta próprio de um capitão, uma atitude de luta contra as adversidades.
Não era, diga-se, o único a padecer de todos os males - e é por isso que desejo que atrás de Pizzi outros, independentemente do estatuto ou da qualidade futebolística que apresentem, sigam o mesmo caminho da porta de saída do clube. O próximo treinador tem que encontrar o balneário limpo.
4 - Paços de Ferreira (casa), Moreirense (casa), Arouca (fora), Gil Vicente (casa), Tondela (fora) e Santa Clara (casa) - era ou não esta uma apetecível sequência de meia dúzia de jogos com que qualquer treinador poderia aspirar (ou mesmo sonhar) ao tomar conta da equipa de um dos grandes? Acontece que para este Benfica não há adversários mais ou menos difíceis, mais ou menos acessíveis - são todos montanhas dificílimas de escalar. Ganhámos ao Santa Clara, e ganhámos merecidamente, mas deixou-me assaz preocupado a condição física da equipa quando estamos a semana e meia de enfrentar o Ajax.
E deixo uma pergunta para quem estiver a tratar do futuro: é possível dar entidade a uma equipa que ontem apresentou jogadores de nacionalidades grega, austríaca, argentina, belga, espanhola, portuguesa, alemã, brasileira, uruguaia, marroquina, francesa e ucraniana?
5 - Os hackers e os piratas, quando atacam o Benfica, são considerados um indispensável "serviço público", mas, agora que começaram a violar os sistemas de grupos de comunicação social, de empresas de telecomunicações, redes de serviços de saúde ou departamentos do Estado, são tidos como perigosíssimos agentes do mal que nos podem até conduzir a uma espécie de Terceira Guerra Mundial. Aconselho, a este propósito, a leitura do artigo do advogado Rui Patrício publicado no jornal Público da passada 4ª feira. Está lá tudo.