PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 Quando Nélson Veríssimo decidiu, ao intervalo, afinar o processo defensivo da equipa metendo Meité como n.º 8 de contenção no lugar de Taarabt, que ocupava os mesmos espaços, não estava a renunciar a jogar. Estava a responder ao que o jogo pedia. O problema, em termos de conceito e capacidade, foi o jogo benfiquista ter chegado a um ponto em que uma decisão destas fez todo o sentido, porque, como o treinador disse, justificando, "se não dava para jogar com posse de bola, tinha de ser doutra forma".
Ver como esta substituição foi a grande questão debatida sobre a exibição e possíveis causas da vitória encarnada em Amesterdão diz tudo sobre o jogo. A estratégia de fechar atrás e jogar na expectativa era a única que, nesta fase, este Benfica poderia lançar para tentar ganhar, segurando o resultado e esperando encontrar uma bola, parada ou de contra-ataque. Assim foi.
2 Meité não entrou porque Veríssimo procurasse coisas novas. Pelo contrário, procurava reforçar a ideia defensiva original dessa posição no plano do jogo, num espaço em que o Ajax, na faixa esquerda, combinava em trocas posicionais desequilibradoras entre Tadic e Gravenberch (que estava a ser marcado individualmente), mais a subida de Blind.
Apontar o defeito de Taarabt, por estar a perder muitas bolas (sete, dizia a estatística), era razão suficiente para justificar a troca. Meité não iria, naturalmente, perder tantas vezes a bola. Por uma razão simples: porque não tenta sequer sair com ela encarando o adversário. Quem tenta mais vezes fazer isso, os criativos, são os jogadores que, em qualquer equipa, perdem mais vezes a bola. É uma consequência inevitável.
Quem se limita a fechar, marcar, cortar e passar para o lado, raramente a perde, como é óbvio. E era apenas isso que Veríssimo queria daquela posição como missão. Mas, atenção, este "apenas" era a raiz de toda a estratégia. Por isso, o Benfica não ganhou pela entrada de Meité, mas acrescentou eficácia defensiva com ele para não perder.
3 Foi a este ponto que o jogo do Benfica chegou devido a muitas razões ao longo da época. Tem, claramente, jogadores para jogar outro tipo de jogo, mas, nesta altura, pura e simplesmente não o sabe jogar. Perante esta desoladora realidade, Veríssimo converteu a equipa às ideias mais pragmáticas (criativamente repressivas) e ganhou, assim, um jogo que, no plano do jogo-jogado, não podia ousar discutir.
O objetivo foi meramente "resultadista" e quando, perto do fim, Darwin subiu e cabeceou aquela bola no meio da defesa, ganhando "ao homem" do Ajax, cumpria essa máxima do futebol moderno. Ganhar no resultado discutindo o jogo no local onde, desde o inicio, sabia que ele iria se disputar, o da sua organização defensiva, pelo que era nesse momento que teria de ser mais forte. E foi.
O poder da tática individual
Gonçalo Ramos tornou-se, claramente, na maior marca tática do ciclo de Veríssimo no comando do Benfica. Não por apostar no jogador (algo que se pressentia já com Jesus), mas sim pela forma como o utiliza para esburacar taticamente recuperações de bola no meio-campo, subindo a agressividade desse espaço onde, por ele, passou a conviver no mesmo jogador um segundo-avançado e um terceiro médio. É um estilo de tática individual que personifica (e define) o jogo de toda a equipa, subindo-lhe a agressividade num espaço onde antes queria tratar o jogo de outra forma a nível de posse. É, aliás, uma ideia que se estende por todos os espaços. Por isso, o eclipse de João Mário, a aposta em Meité ou o resgate de Taarabt.
Se é isto que o Benfica quer, em termos de política desportiva, para o seu futebol (em termos de construção de projeto futuro), essa é outra questão. Nesta fase, Veríssimo vive a realidade do momento com uma ideia de jogo que, quero acreditar, não será a sua como filosofia. Diz, no fundo, que um treinador hoje, mais do que um ideólogo, tem de ser um estratega que adapta as ideias à realidade crua em vez de procurar impor as que prefere. Nesta opção, nem precisa de mais nada: tem razão se ganhar, deixa de ter se perder. O futebol, a este nível, não pode ser isto.