VELUDO AZUL - Um artigo de opinião de Miguel Guedes
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A vitória no Jamor não só permitiu o culminar de uma época vitoriosa, aliando a Taça de Portugal ao título de campeão, como fez de Sérgio Conceição o único treinador a conseguir, em dose dupla, uma "dobradinha" no FC Porto. Não duvido que, enquanto treinador, a primeira vez de Conceição em Oeiras tenha um sabor e significado especiais. Para quem, como ele, jogou finais no Jamor, será inesquecível voltar àquele estádio noutro contexto.
Já para o adepto, a festa é inesquecível pelas mais diversas e duais razões. A circunstância envolvente tem tanto de delicioso como de eventualmente trágico. Razões haverá que expliquem qual o motivo de alguns acessos (nomeadamente à porta da Maratona) se fazerem por caminhos de terra a pique, famílias amontoadas em filas com sentidos opostos, sem escadas senão as simuladas por raízes de troncos de árvore presos ao chão em-versão-vai-que-escorrega, no meio de um trilho aberto entre o matagal que ninguém se dignou sequer a cortar para que as pessoas pudessem passar com espaço. Para uma final da Taça de Portugal, este Estádio Nacional sem obras ou investimento em infraestruturas básicas é um desafio à lógica.
Duas horas antes, nenhum lugar para estacionamento nas redondezas, pessoas largadas nas estradas. Sem condições mínimas para continuar a acreditar que este romantismo se justifique. Não é por acaso que a Selecção não joga no Jamor ou que ele não pode albergar jogos internacionais. Porque se a beleza está nos detalhes e na romaria, é absurdo que ninguém considere que um património histórico destes está a praticar - amadora e permanentemente - um jogo de sorte, acaso e azar, sempre no limite de uma catástrofe. Ao lado, a Cidade do Futebol, resplandece e contrasta.
Uma vitória incontestável do FC Porto que, num jogo para ganhar ou ganhar, nunca esteve em causa, tal o domínio. Sem bom futebol, mas com a eficácia que se exige às grandes decisões. O passe de Otávio para o terceiro golo, o segundo de Taremi, foi o golpe de asa, a centelha que se recordará como recorte de beleza. O fair-play entre todos os adeptos, algo que se lembrará como o inverso da aversão e ódio serôdio que alguns continuam a querer semear no futebol. Sem desprimor para a bravura do Tondela, todos os outros minutos, funcionais, coroaram a equipa que passeou superioridade e arte durante a maior parte da temporada. Mais um ano de final da Taça de Portugal neste Jamor. A arte, o romantismo e a festa, ao arrepio de um património jogado ao desbarato.