PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 -O mundo está a mesmo mudar. Havia um tempo em que jogar com uma equipa escocesa era como entrar numa dimensão de chuta e corre (o "kick and rush" britânico) que nos fazia despentear tática e tecnicamente em campo, sem hipótese de fugir a esse vendaval de jogo. O registo dos resultados diz tudo.
Nunca uma equipa portuguesa tinha ganho ao Rangers (em 13 jogos no passado) sem, diga-se, eles terem assim grandes equipas. A questão é que impunham o estilo deles e levavam o jogo para um território onde nos sentíamos inconfortáveis (insustentavelmente leves) competitivamente.
Ver como agora este Rangers chegou a Braga e, depois de entrar, a tentar impor-se, rapidamente se assustou com o primeiro ataque minhoto (levou com a bola no poste, viu um golo anulado por pormenor e sofreu um golo) até entrar na segunda parte num bloco baixo, reforçando-se para uma defesa a cinco, com marcação individual do trinco (que recuou) a Ricardo Horta, tentando, assim, levar o resultado até ao fim só com 1-0, percebe-se como o receio do poder da equipa física é um mito. É essa definição mais fácil (e rudimentar) para este onze do Rangers (mais ainda sem o seu melhor jogador, o ponta-de-lança Morelos).
2 - Percebo o limbo em que ficou Carvalhal na segunda parte. Tinha o adversário fechado atrás, mas hesitou em encurralá-lo mais. Afinal, estava a ganhar. Apostou, sobretudo, que o talento da sua "horta de futebol" fizesse, por si só, o segundo golo. Não deu e o jogo ficou amarrado. Acho que o Vitinha entrou tarde demais. Só ele podia amassar e comer (no físico, com técnica superior) aqueles centrais escoceses, tendo o jogo ficado "pedra contra pedra". Quando, porém, os estilhaços do Ramadão fizeram tombar Al Musrati percebeu-se que já não dava mais. O líbio que é médio-centro como podia ser professor de geometria descritiva (o passe, sempre o passe, como essência do bom futebol), controla o jogo como quer. Sem ele, a equipa não é igual.
3 - Se o segredo é jogar com convicções, o Braga é das equipas que melhor sabe manter-se, mesmo com tantas mudanças no onze, fiel ao seu modelo de jogo (e sistema tático camaleónico como referência). O três-base Matheus-Al Musrati-Ricardo Horta cresceu na fase crucial da época com o regresso de David Carmo, o tipo de central que intimida os avançados, mas só poderá verdadeiramente crescer até ao topo quando limar a sua agressividade.
Defender bem como princípio é como jogar com a coragem ao contrário mas, neste duelos de duas mãos, tal pode ser decisivo em determinado momento dum dos jogos. Não sei se o Rangers foi demasiado sensível a esse facto, mas foi assim, a pensar latina e contra-culturalmente, que ficou vivo para o segundo jogo. Aquele em que o Braga terá de ter os dois tipos de coragem, a defensiva e atacante, para passar.
Sem "kits" táticos ou físicos
Seis jornadas para acabar o campeonato. Seis pontos de vantagem para o FC Porto gerir e, no seu ideal, ser campeão em quatro. Três saídas, Guimarães, Braga e Luz, que exigem mãos bem agarradas ao volante, como disse Vítor Bruno. Este é (mais do que nunca na época) o tempo dos jogadores.
No Sporting, é tempo para o reaparecimento de Pedro Gonçalves. No FC Porto, é tempo para a afirmação diferenciadora de Fábio Vieira. É a forma como mais gosto de começar a pensar nas duas equipas.
Sei a importância dos generais Pepe e Coates e o faro de baliza de Taremi ou Paulinho, mas aqueles jogadores são os que verdadeiramente conhecem a ciência de um jogo em que é preciso ter bola e fazê-la circular com inteligência rápida. Eles são como a inteligências das.... inteligências que cada coletivo soma porque recusam "kits" táticos ou físicos prontos-a-vestir. Sempre que a bola passa por eles, a cada jogada em que entram, o jogo melhora.
Não tiro mérito a Sérgio Conceição ou a Rúben Amorim, mas quando ouço como foram os treinadores que os fizeram crescer, tendo a encolher os ombros. Esta casta de jogadores são exemplares que, acredito, já nascem sabendo. Na maioria dos casos, eles é que fazem os treinadores serem (ou parecerem) melhores. No imite, até lhes mudam a vida.