VISTO DO SOFÁ - Um artigo de opinião de Álvaro Magalhães.
Corpo do artigo
A saída de Francisco Conceição, que tinha um contrato de formação com uma cláusula de rescisão irrisória, agitou o universo portista.
Na verdade, estas situações são recorrentes no futebol dos nossos dias, apenas têm encontrado a sua máxima expressão no FC Porto dos últimos anos.
Houve um tempo em que os jogadores eram propriedade dos clubes. Foi assim até ao início dos anos 90, quando se fizeram os primeiros contratos a termo. Em 1995, chegou o acórdão Bosman, que instituiu a livre circulação dos jogadores. E logo apareceram também as cláusulas de rescisão, que mitigavam os efeitos devastadores, para os clubes, da nova ordem. Essa mobilidade dos jogadores atiçou os negócios e abriu um espaço para os empresários, que se espalharam com a rapidez e o oportunismo das ervas daninhas. E são eles quem está no cerne destas questões, pois programam os jogadores para não renovarem contratos, o que facilita a ida para onde lhes pagam mais, incluindo prémios de assinatura. Foi assim que as renovações se tornaram mais difíceis e mais caras do que contratações de jogadores equivalentes. E assim também se passou da escravatura dos jogadores à ditadura da sua vontade e dos seu interesses.
A saída de Francisco Conceição está inscrita neste quadro. Os que agora criticaram a gestão portista esqueceram que são precisas duas assinaturas para qualquer contrato, o que corresponde à convergência de duas vontades. E os responsáveis do clube tentavam, há muito, renovar com o jogador. Sem resultado, pois o Ajax não chegou agora. O problema é que os portistas se cansaram de dizer adeus aos seus melhores jogadores. Desde Janeiro, viram partir quase uma equipa completa: Corona, Sérgio Oliveira, Luis Díaz, Vitinha, Fábio Vieira, Francisco Conceição, Mbemba. Faltava um guarda-redes, mas já não falta: Marchesín. Em Maio, lia-se neste jornal que a SAD tinha blindado Vitinha e Fábio Vieira, que eram para manter. Um mês depois, lá se foi a blindagem, que o garrote financeiro não abranda a pressão e obriga a vender e vender, o que vem lesando drasticamente a qualidade do plantel. E isso, apesar das vitórias recentes, deixa os adeptos ansiosos, a roerem as unhas.
A poucos dias do arranque da nova época, é este o estado de espírito dos adeptos das três grandes tribos que fazem o nosso mundo futebolístico girar: os benfiquistas estão à beirinha da euforia, os sportinguistas estão seguros, confiantes, enquanto os portistas, à falta de melhores argumentos para accionarem a esperança e a fé, esperam por outro milagre de S. Sérgio Conceição, mais uma vez forçado a reconstruir a equipa. E são tão reais esses milagres, tão prováveis (3 em cada cinco tentativas) que também os adversários dos portistas acreditam neles e os temem. Daí que a pivot da CMTV, na segunda-feira passada, tenha avançado a "fake new" da demissão de Conceição com a euforia de quem vê o inimigo a ser atingido por uma calamidade. Aquilo não era uma notícia, era um alvoroço de vitória, uma celebração. Deu para perceber a festança que farão quando a notícia for verdadeira.