PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - É mais do que um mito urbano ou uma lenda. Ele existe mesmo. A cada quatro anos ele sai da quase clandestinidade duma carreira discreta e transforma-se num super-herói em forma de guarda-redes que faz defesas impossíveis, contorcionistas ou de borracha. São as fabulosas aventuras de Guilllermo Ochoa na baliza do México. A cada Mundial ele reaparece para defender como possuído por superpoderes que, antes, poucos desconfiavam ter. Inesquecíveis, no passado, as exibições de "outro mundo" contra Brasil e Alemanha.
Este ano, ele vai sair das redes do América, o clube onde começou e agora o recebe de volta, doze anos depois, ao futebol mexicano donde saíra em 2011 para jogar em França, no Ajaccio. Quando, porém, fez o seu primeiro grande Mundial (2014) o clube já tinha descido de divisão e Ochoa estava sem clube. As exibições levaram-no para o Málaga que então estava cheio de dinheiro árabe mas, apesar da fama, não fez um único jogo na Liga (jogou o camaronês Kameni). Voltou ao anonimato, em Granada e Liége, até reaparecer a voar no Mundial 2018.
Agora, com 37 anos, ele reaparece como a grande esperança "asteca" para, finalmente, conseguir um feito que busca desde as origens: disputar um "quinto jogo" na fase final dum Mundial. É, colocado nestes termos, a forma de desafiar a história passando, por fim, dos oitavos-final, algo que a seleção mexicana nunca conseguiu na sua história (mesmo jogando em casa e nos tempos dos golos acrobatas de Hugo Sanchez).
2 - Não será, no entanto, uma missão fácil vendo o momento indefinido que atravessa o onze "asteca". No banco, "El Tata" Martino, selecionador que busca implementar o futebol do toque, continua contestado. A equipa não está a jogar bem e os problemas no ataque são enormes.
Enquanto continua esperando a recuperação de Jimenez (a arrastar uma pubalgia no Wolves, mas a quem disse esperar até ao último dia), cortou relações com "Chicharito" Hernandez (que, com 34 anos, joga nos LA Galaxy) e aponta a Henry Martin, ponta-de-lança que explodiu tarde, mas que tem feito muitos golos no "Las Águilas" do América.
Ninguém marcou mais golos que ele nos últimos doze anos nos relvados mexicanos. Tem desmarcação e potência de remate. Os golos, porém, não têm aparecido na seleção, onde Funes Mori volta a ser hipótese para nº9, mesmo quando toda "nação asteca" olha para outro "pibe", que desponta na Holanda: "El Chaquito" Santiago Gimenez, 21 anos, que o Feyenoord contratou ao Cruz Azul.
Ainda precisa, naturalmente, de crescer, mas o seu talento é inegável. Elegante, com técnica, jogando bem em dupla ou fixo entre os centrais, tem estilo e golo. Precisa de ser aposta continuada e, com maturidade adquirida, tornar-se no novo ponta-de-lança referência de que o México necessita.
3 - A influência de estilo do futebol holandês nota-se, aliás, muito a meio-campo, com o comando do sector a pertencer a uma dupla que também joga entre túlipas: Edson Alvarez (nº6, pivot de saída no Ajax que também sabe baixar a defender entre centrais, o que pode levar o 4x3x3 preferencial de Martino a ganhar muitas vezes um terceiro elemento em linha) e Erick Gutierrez (mais nº8, com passe e agressividade no PSV, que pode jogar nas diferentes linhas do meio-campo e dá alma com técnica ao sector).
Junto deles, ainda podem aparecer Herrera e Guardado (ambos já na pré-reforma mas com grande estatuto no grupo) só que vendo a seleção jogar, é evidente que é com Rodriguez (do Cruz Azul) e Chávez (do Pachuca) que o ritmo sobe.
4 - Tendo uma intocável dupla de centrais patriarcal (Araújo-Moreno) a importância dos médios cresce para lançar o ataque que cria mais perigo pelos flancos. A lesão de Corona abanou essa dinâmica, mas "El Chucky" Lozano nunca costuma falhar nestas ocasiões. Também prontos a explodir, Antuna, desde a direita, veloz de finta curta e Vega, entroncado que nunca foge a uma dividida na esquerda.
Com qualquer opção, o México (que tem um grande campeonato que devia ser mais conhecido pela Europa) nunca falha no encontro com a alma competitiva certa na hora dos Mundiais. Este estanho ano de 2022 terá a mesma casta emocional e, na busca pelo mítico "quinto jogo" , está garantida mais uma, e talvez a última, quimera de defesas impossíveis de Ochoa.
MODELOS
Ricardo Pepi: pode o Texas gerar bons futebolistas?
É fascinante ver como a chegada dum Mundial faz aparecer jogadores que pareciam escondidos ou anuncia revelações a nascer. Neste contexto, é curioso ver como os EUA estão a lapidar um novo ponta-de-lança que, no Catar, pode mostrar as qualidades que aperfeiçoa no Groningen. É Ricardo Pepi, 19 anos, nascido (de ascendência mexicana) em El Paso, no Texas, local improvável para crescer um futebolista, mas que após jogar no FC Dallas e no North Texas, foi descoberto pelo Augsburg na seleção americana sub-17.
Agora está emprestado ao Groningen e o selecionador Berhalter aposta nele como possível nº9 da seleção no Mundial (manejando outras opções como Arriola, Ferreira ou até colocar de Sargent nesse lugar) Pepi tem mesmo pinta de nº 9, movimentação com critério, elegante, destro mas a jogar bem com o pé esquerdo, nos apoios ou na subtiliza de desmarcação na área para fazer golos. Não é explosivo por natureza mas revela inteligência a procurar jogo e bola, muitas vezes caindo em largura, recuando ou buscando tabelas. Em síntese: tem golo e jogo.
Nota-se já quase um perfil de escola europeia na forma como aculturou um nível de fundamentos de jogo superiores ao que trazia desde as bases. É um jogador que apetece ver crescer pelo potencial que denota. Veremos se saberá como o utilizar e mostrar que até o Texas pode gerar bons futebolistas!