PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 Ao contrário do que se diz, acho que se deve voltar sempre a um local onde se foi feliz. Na vida e futebolisticamente também.
Não se pode é esperar que, nesse regresso, as coisa estejam iguais e tenham o mesmo encanto de antes.
Esta pode ser uma forma algo rebuscada de sentir e analisar o atual momento da equipa do Sporting e como, no último instante, chegou ao empate contra o Midtjylland, regressando à mais básica e feliz estratégia de sucesso do passado: um cruzamento para Coates apanhar de cabeça na área. Este é, no entanto, apenas um "sub-local tático". Ou seja, é um refúgio onde só vai quando se sente desesperado. Não é onde a equipa vive (e viveu em felicidade plena com títulos épocas atrás) na maioria do tempo como expressão de vida e jogo.
2 Amorim falou da falta da confiança, das pernas que pesam 200 quilos, dos jogadores sentirem toda essa atmosfera e, por isso, perderem-se em campo. É verdade. O aspeto mental sempre teve um peso enorme mas é impossível nesta fase, vendo todo o curso da sua vida tática-emocional em Alvalade, não constatar que a cristalização de sistema (e seus princípios de jogo) se tornou uma prisão para o crescimento da equipa e busca de outras soluções de jogo. A saída, no decorrer do tempo, de jogadores-chave para a eficácia desse sistema também é decisiva para a crise de jogo atual mas a verdade é que entre o momento em que a mesma ideia foi primeiro revolucionária e tempos depois, desgastando-se, entrou em "contraciclo tático" mediou só um par de épocas.
É o que sucede com o atual modelo-Amorim que só a entrada de novos jogadores revitaliza. Por isso, tanto se saúda o emergir de Chermiti ou as fintas de Edwards como se desespera em ver Pote como médio, porque a equipa precisa disso, perdendo-se o melhor finalizador na frente.
Neste contexto, o jogo outrora inovador e entusiasmante tornou-se previsível e depressivo. Amorim precisa de reciclar ideias de jogo. Não digo abicar da sua filosofia mas perceber como o mesmo local pode ser um espaço de felicidade a partir do entendimento com contornos diferentes que adquire a cada momento (equipa e tudo que mexe, técnica-mentalmente, com o jogo).
3 Aquilo que fez Amorim taticamente ganhar não pode ser aquilo que o faz hoje perder. Para evitar esse estranho paradoxo o treinador tem de perceber que as condições (o espaço para a revolução) mudaram e porque os jogadores entram em campo agora com um peso amarrado aos pés. Só a (boa) tática os pode libertar neste momento. O fator-Coates é apenas uma ilusão de fuga.
Nada disto implica mudar a essência feliz do pensamento de jogo inicial. Insistir numa realidade que já não existe é que se torna perturbante ver jogo após jogo. É o treinador-Amorim, mais do que o presidente ou os jogadores assobiados, que está nesta fase taticamente em causa nesse limbo existencial.
Braga e o manual de Amrabat
A expulsão de Tormena precipitou a derrocada europeia bracarense contra a Fiorentina, mas desde o início, viu-se sempre uma equipa italiana excessivamente superior na iniciativa de pressão alta, não deixando o Braga sair a jogar desde trás, controlando a bola e o jogo. Artur Jorge disse que essa postura bracarense mais expectante era parte da sua estratégia mas rapidamente se percebeu que era mais do que isso e tem a ver com o nível de pressão e jogo que esta Fiorentina meteu em campo e que poucas equipas portuguesas conseguem fazer ao Braga. Perante esta realidade, a equipa mesmo montada em "modo-jogo grande", com os seus três médios para endurecer taticamente o sistema, não conseguiu colocar-se em campo.
Penso que a saída de Racic na segunda parte ainda tornou mais evidente essa diferença.
Do outro lado, o relógio italiano comandado por um trinco marroquino visionário: Amrabat. É impressionante como nunca pára, está sempre em jogo, onde a bola está, em posse ou no seu caminho, sem, no entanto, o vermos a fazer sprints. Pelo contrário, ele não dá uma correria a mais, um passo a mais ou um esforço a mais. Tudo é simplificado pela perceção perfeita de ocupação dos espaços. Um autêntico manual de "tática" individual expresso num jogador ultrassensível.