PONTAPÉ PARA A CLÍNICA - Um artigo de opinião de José João Torrinha.
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Há alturas em que nos sentimos verdadeiramente pequenos e impotentes face à tragédia que se revela ante o nosso olhar. Nas televisões, jornais e redes sociais as notícias dos terríveis acontecimentos que se vão sucedendo na Ucrânia reduzem outras preocupações à sua insignificância. Se falarmos em desporto então, essa insignificância ainda parece mais... insignificante.
Quando vemos pessoas a ficar fora de si por causa de um lance num jogo de futebol, ou de umas quaisquer declarações de um dirigente ou até a dar largas à sua indignação a propósito de uma campanha eleitoral para um clube, percebemos que há quem deva rever as prioridades da sua vida.
Apesar disso, o desporto pode ter um papel no meio desta a crise. Estamos naturalmente a falar de questões essencialmente simbólicas, mas importa, desde logo, que as maiores organizações mundiais que regem o mais impactante desporto do mundo tomem posições claras. Ontem ficámos a saber que as seleções da Polónia e da Suécia se recusam a jogar contra a Rússia no apuramento para o Mundial do Catar. Teria sido preferível que a FIFA se tivesse antecipado e assumido em primeira linha que aquele país ficava de fora da dita competição. Assim, das duas uma: ou vai a reboque dos acontecimentos ou (o que seria impensável) puniria aquelas duas seleções e daria o bilhete de ida à federação russa.
Infelizmente, o organismo máximo do futebol mundial não se costuma destacar pelas suas posições de princípio, mas antes por soçobrar permanentemente ante a tentação do vil metal. Não nos esquecemos que, já depois de ações inqualificáveis por parte do regime de Putin, a FIFA entendeu por bem entregar a esse país a realização de um Mundial de futebol. Oxalá me engane, mas dali não costuma vir nada de bom. Melhor andou a UEFA, que de imediato transferiu a final da Champions de São Petersburgo para Paris. Importa ainda tomar decisões quanto à participação das equipas russas nas competições europeias. Como dizia, são atos de mero simbolismo, mas por pequenos que sejam, todos os que sirvam para pôr pressão sob Moscovo serão seguramente poucos. Da mesma forma, ficámos a saber que o Grande Prémio de F1 da Rússia já não se realizará e que o COI recomendou às federações internacionais que retirem a Rússia e a Bielorrússia das suas competições.
O desporto pode ainda ter um papel na divulgação das mensagens certas na hora certa e no despertar de consciências. As estrelas do desporto mundial são seguidas por milhões de pessoas e devem ter voz ativa na denúncia das atrocidades que estão a ser cometidas no leste europeu. Felizmente, um pouco por todo o lado, vamos assistindo a declarações de solidariedade que vão muito para além dos atletas ucranianos. Porque este não é um problema só ucraniano. É um desafio à nossa civilização e uma barbárie que um dia pode bater à porta de cada um de nós.