PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 O jogador. Na relação com a bola, eles continuam a ser os melhores guardiões da melhor cultura do futebol. De regresso aos nossos relvados, João Carlos Teixeira pode dar-se ao luxo de seguir o mandato do seu próprio instinto.
Numa jornada com dois dérbis minhotos da classe média, ele sentiu-se jogador dos pés à cabeça, fazendo o Famalicão atropelar o Moreirense, Com ambas as equipas submersas no fundo da classificação, Rui Pedro Silva ganhou novas formas de falar para o seu onze. Gustavo Assunção também regressou e reacendeu as luzes do passe a meio-campo num sistema de 3x4x3 que tem um extremo com pele de avançado a furar por dentro, Bruno Rodrigues, e outro, que, na verdade, está escondido como lateral, Ivo Rodrigues, invasor da faixa direita em profundidade, para permitir o tal jogo de invenções de Teixeira, ora aberto, ora metido no meio quase com pele de n.º 10, então mais médio de definição. No meio, um ponta-de-lança que sabe receber ou rodar, Banza.
O desespero, no início, e o desalento conformado, com o passar dos minutos, de Sá Pinto no banco cónego: nunca conseguiu descobrir como parar aquela asa-flanco que, com Pedro Amador sozinho nesse espaço da casa defensiva, desfez-lhe totalmente a equipa. O seu Moreirense tem subido o nível competitivo mas sem perceber a transição defensiva (que Rafael Martins, um bom n.º 9 que pode atacar bem desde a faixa mas não consegue recuar rápido para fechar em largura) fica no jogo subitamente desequilibrado, sem saber onde pisar. Até a goleada (5-0) ser natural.
2 Mais do que rotinas, a equipa tem um segurança quase mecânica na forma como interpreta os diferentes momentos do jogo partindo do mais velho (dentro da modernidade tática simples) e racional 4x3x3. Sempre seguro, o Gil Vicente de Ricardo Soares venceu (controlando o golo marcado cedo de penálti) o Vizela de Pacheco, uma equipa inquieta que nunca se esconde do jogo mas a quem conviria algumas vezes, durante o seu decorrer, esconder a bola. Até para então respirar e olhar à sua volta sem ser sempre a correr.
O "onze galo" tem isso porque tem um meio-campo com as peças, todas diferentes, certas para compor o motor da velha máquina tática do 4x3x3. Vítor Carvalho, Pedrinho, Fujimoto e na frente extremos com reminiscências da antiga rebeldia do um-para-um (daqueles que falham um e voltam logo a seguir a tentar outro) como Léautey e, claro, Samuel Lino, cada vez mais confiante em "zigzag".
3 Numa jornada que um dos grandes clássicos amarfanhou o futebol, estar nestes dois dérbis (um a comentar, outro na bancada) fez-me sentir, além das minhas orgulhosas raízes minhotas, que o amor emocional pelo jogo ainda terá refúgios redentores.
As "obras táticas" do Paços
É interessante ver como Uilton se tornou, nesta fase, um jogador fundamental na nova ideia de jogo que César Peixoto tentar lançar no Paços. De extremo ou lateral na direita, ele faz agora todo o flanco esquerdo e é o responsável pela metamorfose da linha defensiva para cinco quando, sem bola, recua e fecha a faixa, ficando Antunes como terceiro central por dentro. Em posse, solta-se e dá profundidade no ataque por esse lado, enquanto na direita, os anteriores falsos-ala (em flancos opostos) fazem agora dupla no mesmo atrás e à frente (Delgado desde lateral e Lucas Silva extremo).
É um sistema muito desgastante pelo que exige de rigor nas transições, sobretudo defensivas. Em Braga tal passou fatura física na parte final do jogo ao desmontar-se o encaixe de coberturas nesse lado esquerdo e, no centro, com Matchoi (um belo jogador, com sentido posicional e saída) a estourar a missão de enganche meio-campo/ataque onde foi decisivo no melhor período da equipa (que, no inicio de construção aprende a jogar sem Eustáquio, pedindo mais saída a Rui Pires).
Uma ideia de jogo tão atraente como difícil de implementar a meio da época (muito diferente da de Jorge Simão) pelo que, muitas vezes, sente-se a dificuldade da equipa em adaptar-se nesses desdobramentos.