PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - Ouço os elogios ao jogo de Meité, surgido de surpresa no onze titular do Benfica, e sinto as bases do bom futebol de pernas para o ar.
Isto é, concordo que ele fez uma boa exibição em função das tarefas de contenção que lhe foram pedidas para dar maior robustez de recuperação/marcação ao meio-campo encarnado, mas, como descrito, a partir de princípios que colidem com a afirmação dominadora no jogo que penso uma equipa como o Benfica deve ter por natureza.
Entendo as preocupações táticas de Veríssimo para esta opção, mas quando a entrada dum jogador destes é o que a equipa mais precisa, é porque todo o resto do seu jogo está mesmo fragilizado ou deixou de fazer sentido na dimensão que deveria ter.
2 - Para se perceber como sinto perturbante esta opção (e o elogio à exibição de Meité) basta recordar que a jogada em que foi mais aplaudido, sucedeu quando, na primeira parte, se colou a Matheus Reis e, em contenção, o impediu fisicamente de sair a jogar desde trás, colando-se a ele até, já com os dois enrolados, lhe fazer uma falta, acabando, depois, ambos pegados, colocando cabeça com cabeça.
Na bancada, os adeptos vibraram e aplaudiram. Um contrassenso total para o que este Benfica (que não voltou a mudar de sistema mas mudou, com a entrada deste jogador para n.º 8, a dinâmica do seu meio-campo, sector chave para se dizer como se quer jogar). Uma coisa é o 4x3x3 com Weigl-João Mário e outro jogador para fazer jogar com bola (Paulo Bernardo, Taarabt ou o próprio Pizzi). Outra é um 4x3x3 no qual a essa dupla junte outro jogador para, sem bola, não deixar jogar o adversário.
3 - Poderia a intenção, dando esse trabalho mais sujo ao possante francês, ser a de libertar João Mário para terrenos mais adiantados mas as coisas não funcionam assim taticamente de estaca. Não existem rotinas nessa forma de jogar (em concreto, de ligar jogo a meio-campo) nas dinâmicas de saída para o ataque do Benfica. Assim, embora tivesse mostrado mais os dentes a defender, não conseguiu em nenhum momento gerir o jogo em posse, para, dessa forma, poder mostrar organização de controlo tático (algo que as circunstâncias do jogo, quando ficou em vantagem na primeira parte, lhe exigiam).
Perdeu, assim, a hipótese tática coletiva de gestão do jogo que esse golo inventado sozinho por Everton lhe tinha dado. Pelo contrário, foi o Sporting a crescer (com bola e qualidade de passe) em cima do bloco benfiquista, cada vez mais encolhido atrás.
Foi resistindo e acabou, naturalmente, por cair (face à mais valia técnica de Pote, Paulinho, Sarabia e a precisão com velocidade do regressado Porro, que, por si só, faz a velocidade do jogo exterior da equipa leonina subir). Tudo demasiado natural.
Os problemas do Vitória
É mais do que mera falta de agressividade. O problema deste Vitória está, sempre, no jogo, relacionado com deficiências defensivas. Reflete-se em todo o processo coletivo. Quando perde a bola e, sem médios que pressionem alto, sofre na transição defensiva sem poder de recuperação ou na dificuldade em controlar a profundidade. Quando já em organização defensiva, revela (para além do deficit de qualidade individual) descoordenação entre sentido posicional de corte e dobras. Os laterais têm lacunas a fechar por dentro e isso compromete a relação com centrais, abrindo espaços de penetração entre eles.
A introdução dum trinco físico como Alfa Semedo visa dar maior segurança mas tal leva a equipa a recuar mais porque como, a defender, ele tende a encostar-se aos centrais, todo o meio-campo sofre com isso. Falta um n.º 8 forte de saída/controlo, que (esse sim) podia ser mais físico, e um n.º 6 mais de construção. É esta a ordem, e não a inversa, de funcionamento duma boa equipa a pegar no jogo.
Tem bons avançados mas sem a defesa capaz de subir o bloco com segurança (ou sem tremer tanto em bloco mais baixo) e com o meio-campo incapaz de pressionar, toda a equipa, sem bola, perde intensidade. Um problema tático global que a faz parecer de papel mal perde a bola.
MODELOS
Guzzo: Jogar e gozar
Mais um caso intrigante de percurso. Quem o vê agora de regresso à elite no Vizela (após, formado no Benfica, passar por Tondela, Reus, Famalicão, Chaves...) pergunta o porquê de tanto talento não se ter firmado, até aos 27 anos, num nível superior. Completo a resgatar a bola como n.º 8 mais de contenção ou a sair a jogar em construção até surgir na frente quase como um nº. 10. Marca a diferença sempre que joga, explica o que é o médio a jogar bem, toca na bola muitas vezes sem a segurar muito tempo.
Táticas: Abel Ruiz
O Braga ganhou ao Moreirense com as três substituições ao intervalo mas a principal mudança foi a troca posicional dum jogador que já estava em campo: Abel Ruiz. Passou de n.º 9 (onde, pouco ágil em espaço curto, deu-se sempre à marcação dos três centrais cónegos) para jogar solto desde a meia-esquerda, fletindo em tabelas até voltar a surgir por dentro (junto de Vitinha, esse sim um n.º 9 que se move em todo tipo de espaços).
Uma mudança que prova como Ruiz rende mais partindo aberto do que metido por dentro. Mais do que para ele próprio, sabe fabricar espaços para a equipa. Não o vejo como um n.º 9. É mais avançado para jogar em dupla ou em espaços mais longos.
Danilovic: II Liga
Destaquei-o quando o vi numa anónima equipa bósnia, o FK Borac, contra o Rio Ave na Liga Europa. Um médio com técnica, visão e qualidade de passe, a jogar como 8 ou 10. Terá sido também aí que o Nacional reparou nele. Sentiu o ritmo de jogo mais alto do nosso futebol. Após uma época de adaptação está agora, na II liga, com mais bola e sem ter correr atrás dela, a mostrar que sabe jogar. Aos 22 anos, mexe com o meio-campo na Choupana. Veremos se continua a evoluir.