No Ajax, Francisco Conceição já não será arruaceiro, muito menos simulador ou antidesportivo
VELUDO AZUL - Opinião de Miguel Guedes
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A confirmar-se a saída de Francisco Conceição para o Ajax pelo valor da cláusula de rescisão de cinco milhões de euros, o FC Porto vende mais uma pérola da sua formação neste defeso, somando arritmias e sístoles descompensadas aos seus sócios e adeptos.
Depois de Vitinha e Fábio Vieira, começa a assomar uma certeza para o futuro próximo: para o ano, poderão sair Diogo Costa e João Mário.
A possibilidade de um outro paradigma parece ter-se instalado. Já não é apenas difícil manter jogadores mais antigos por muito tempo sem que saiam do clube. Olhando para os casos de Otávio (a começar a 7ª época), Pepe e Marcano (a entrarem para a 5ª) ou de Uribe e Marchesín (de pedra e cal para a 4ª), o mais difícil começa mesmo a ser a manutenção dos jogadores que, vindos do Olival, se afirmam como predominantes e influentes no presente da equipa e que todas as semanas confirmam futuro.
Esperemos que a profecia de Carlos Carvalhal, prevendo a manutenção de David Carmo por não mais do que uma época, não se concretize. Lidar com uma só mudança de paradigma já é desafio bastante.
A adição das idades de Vitinha, Fábio e Francisco (63 anos, bem somados), quase bate o valor conjunto da venda dos três jogadores (cerca de 81,5 milhões) e, como tal, das duas uma: ou o valor global é demasiado curto ou a idade em que são vendidos parece precoce.
Certo é que se Francisco Conceição deixar o seu clube do coração pelo campeão holandês, passará a ser um jogador repleto de qualidades e de futuro, já nada intempérico ou arruaceiro, muito menos simulador ou antidesportivo. Saindo do ambiente minado do futebol português, passará a ser um formando da escola holandesa, desbloqueador de jogos e categórico na forma como parte para cima dos adversários, peça rara no futebol moderno e não mais o filho do seu treinador. É difícil imaginar que Sérgio Conceição não procure aliviar Francisco do podre jogo de intimidação e condicionamento que impera no futebol português, desejando que cresça sem comparações, ironias ou má-fé dos seus maiores detractores.
A dificuldade que o FC Porto tem revelado para assegurar a continuidade dos seus maiores valores da formação pode ter uma dupla leitura. A primeira, é de que esta "fornada" da formação é um sucesso e que o trabalho tem sido bem feito. A segunda, é a de que outros agentes (que não o clube) têm conseguido aliciar mais e melhor os jogadores da nossa "cantera". O regozijo dos nossos adversários não tem, porém, cabimento. Eles sabem, como nós sabemos, que estamos e estaremos mais próximos de ganhar qualquer jogo que constitua um desafio. Mesmo para o coração.