A JOGAR FORA - Um artigo de opinião de Jaime Cancella de Abreu.
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1 Nem os vaticínios mais catastrofistas - e houve vários - foram capazes de prever que quatro jornadas bastariam para que a careca da liga ficasse destapada.
E tem sido tal o cardápio de erros arbitrais e falhas tecnológicas que se tornou impossível fugir à chacota internacional.
"Cenas bizarras e caóticas", "absurdo em Portugal", "surrealismo no Porto", "incomum e surreal" e "caos sem precedentes" foram algumas das muitas expressões utilizadas pela Imprensa desportiva do mundo para classificar as tristes cenas que ocorreram no Estádio do Dragão.
Cobardemente, como de costume, nenhum alto responsável do futebol português veio dar publicamente a cara pela vergonha. Cristiano Ronaldo assumiu as dores dos adeptos: "O que tem acontecido no futebol português acaba por ser um circo." Já Pinto da Costa referiu-se aos que falam de futebol, nomeadamente "um tal Mauro"! Hilariante.
2 Do fundo da minha ignorância, perguntei a quem sabe como é calculado o tempo de descontos dos jogos da Liga. A tarefa está entregue ao AVAR, que usa o cronómetro para contabilizar os tempos gastos nos festejos dos golos, nas substituições, nas paragens médicas, nas intervenções do VAR e na mostragem de cartões. O que espera o Conselho de Arbitragem para publicar, jogo a jogo, rubrica a rubrica, na base do "quem não deve não teme", e a bem da transparência, os números que estiveram na base da determinação dos tempos de descontos?
3 Saúda-se a divulgação dos áudios. Não se saúda: a divulgação ser feita uma vez por mês; contemplar apenas lances em que o árbitro foi ao monitor; editarem os áudios e não os revelarem em bruto; serem escolhidos apenas lances em que a equipa de arbitragem decidiu corretamente, já que são precisamente os outros, aqueles em que errou, que mais interesse têm; e não se saúda, por fim, que tenha sido escolhido para a sua divulgação um canal cujas transmissões são alvo de fortes e legítimas críticas, motivadas, precisamente, pelos critérios que utiliza na seleção das imagens para repetições de lances de certos clubes.
4 Não há como não aplaudir o regresso da SAD aos lucros (4,2 M€). É, todavia, preocupante constatar que sem a transferência do Jota, que, caída do céu, rendeu cerca de 6,9M€ líquidos, o exercício de 2022/23, que teve receitas correntes recorde, seria negativo. Há muito trabalho pela frente para que Rui Costa possa alimentar o sonho de um "Benfica campeão europeu". Lembro-me, a propósito, de duas máximas de Nelson Rodrigues, o maior adepto-cronista do passado, do presente e do futuro da língua portuguesa: "Nada mais barato do que um time caro"; "jamais um grande time levou um clube à falência." Cortar gorduras várias e concentrar recursos no futebol é bem capaz de ser o único caminho.