PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - Um golo no primeiro minuto nunca terá, por si só, o sentido de seguir a lógica do jogo (porque, em rigor tático, acontece antes de o verdadeiro jogo começar), mas a possibilidade do efeito deflagrador que ele pode ter nos restantes 89 pode ser terrível. Isto é, pode deixar de ser meramente circunstancial (sendo, mais tarde ou mais cedo, reduzido a essa realidade episódica) ou pode tornar-se numa amarra que motive ou prenda estruturalmente as equipas (seus jogos/estratégias e cabeça) durante todo o tempo.
Sucedeu na Suíça. O golo ao nascer do sol de Seferovic nem dera para perceber a preocupação de Fernando Santos no dia anterior: qual seria a posição de Shaqiri, na ala ou no meio? A verdade é que vendo bem o lance, essa resposta já está lá, porque foi ele, com simulação e passe, que, perante a passividade de Nuno Mendes e apoios, iniciara, colado à faixa direita, a jogada decisiva.
Sem sombra de pudor, o onze suíço, a atravessar uma fase de resgate de autoconfiança, aproveitou a vantagem para jogar taticamente com ela. Baixou o bloco, retirou profundidade nas costas ao ataque português, subiu a dimensão de lances divididos a meio-campo e ficou à espera dum contra-ataque (que sustentadamente nunca mais surgiu) para tentar o segundo golo.
2 - Custou muito a Portugal voltar a ter posse de bola em condições de pegar no jogo. Vitinha sentiu-se estranho num território de "segundas bolas" e sem ligação de pensamento entre os nossos construtores (Otávio-Bruno Fernandes mais Rúben Neves desde trás) não conseguimos impor o nosso estilo de jogo, que esbracejava nas areias movediças do meio-campo e defesa recuada suíça.
A situação melhorou, claro, na segunda parte, com a entrada de Bernardo Silva (para interior direito) e o desgaste que percorria as equipas. Surgiram as oportunidades, quase todas meio "mordidas" pelos suíços, que caíam em cima, e até ao fim ficou a valer o tal golo do primeiro minuto que já então ameaçara não ser mera obra do acaso circunstancial.
3 - Entendo a necessidade de gestão dos jogadores nesta fase da época mas se dos quatro jogos havia um que não se podia prescindir de Ronaldo era este na Suíça, o mais difícil em face do previsível bloco defensivo helvético. Nos jogos em casa, resolvidos cedo, até poderia ter sido poupado (gerido) para não jogar 90 minutos (ou, admito, nem jogar um deles). Não jogar na Suíça e ir de férias quatro dias mais cedo foi um equívoco, não de gestão do jogador, mas de gestão da equipa (o que, no conjunto dos quatro jogos, vai dar ao mesmo).
Não será fácil gerir este seu final de carreira (ego e físico) mas em nenhum momento poderá deixar de estar a Seleção primeiro que o jogador.
O Brasil precisa de definir um n.º 9
Os jogos do Brasil contra Coreia e Japão reforçaram as dúvidas sobre a posição n.º 9, que continua sem um dono em termos de especialização. A equipa produz muito jogo ofensivo mas falta esse elo final concretizador que, contra o Japão, só surgiu após entrar Richarlison, também extremo de origem mas nessa posição central no Everton. Não é, no entanto, uma solução de raiz, numa fase em que Hulk está fora dos convocados e que Rodrygo emerge cada vez mais nessa posição em Madrid.
Contra o Chile, no apuramento, Tite ensaiara uma dupla móvel de avançados-centro: Neymar-Lucas Paquetá. São craques mas nenhum deles se fixa no "espaço 9", entre centrais adversários. Ambos gostam de vagabundear, Paquetá como ala desde a esquerda e Neymar como 10 criativo. Neste sistema, Vinícius joga na esquerda e Raphinha na direita.
É um esquema com extremos e "falsos 9". Tira referências de marcação mas perde poder de remate na área, confundindo-se muitas vezes em trocas posicionais que embora com qualidade a abrir espaços, não tem depois recetor natural do último passe.
Um debate que merece análise profunda mas que neste momento vejo sobretudo a comprometer o melhor futebol de Vinícius, a jogar da ala para dentro no Real Madrid mas que não encaixa nessa posição no esquema de Tite, tal a forma como tantos jogadores querem ocupar os mesmo espaços (e nenhum é o 9).
MODELOS
Sub-21: os defesas
O 4x4x2 losango da Seleção Sub-21 apurou-se num grupo fácil. Ganhou à Grécia numa exibição em crescendo, na qual o que mais gostei foi a ação do quarteto defensivo (pelo presente e futuro promissor, mais acima). Muito bem os laterais (João Mário-Nuno Tavares) mas sobretudo os centrais, posição que urge renovar no onze principal e onde destaco o alto nível exibicional de Tiago Djaló, cada vez mais personalizado, forte, rápido, possante, corte e saída. Com Carmo, arrisco: a nossa dupla de centrais do futuro.
Táticas: total Sarabia
A influência de Sarabia na seleção espanhola diz tudo sobre a sua qualidade. Jogando, por tendência, a partir da faixa, esquerda ou direita, tem visão de jogo associativo como visão de finalização pura. Existe um n.º 9 (Morata) no onze, mas tendo também mobilidade de recuar e passar (abrir jogo), Sarabia torna-se um jogador de rutura (movimento sem bola), que o faz aparecer com mais perigo do que todos os outros nessa "zona 9". Marcou assim à Suíça e República Checa. Para defini-lo é necessário fazer uma combinação de espécies (entre médio e avançado). Não sei onde irá jogar na próxima época mas um jogador destes cabe sempre nas melhores equipas europeias.
Alemanha: entre sistemas
Após o 4x2x3x1 no primeiro jogo com a Itália, a Alemanha de Flick voltou ao sistema a 3 (3x4x2x1) usado por Low. Embora se projete melhor pelas faixas neste sistema (Hoffmann entrou bem na direita), é com a estrutura ofensiva "3x1" (em ambos os sistemas segura pelo duplo pivô Kimmich-Gundogan) que aproveita melhor os avançados ao dispor. No sistema a 3 sai sempre um deles, exceto se Gnabry fizer toda a faixa, como Flick o usava no Bayern, mas que na seleção desequilibra no pós-perda e obriga a defender a 4.