Não há qualquer memória que iniba uma equipa com este caráter de ganhar ao Atlético de Madrid
VELUDO AZUL - Opinião de Miguel Guedes
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Não acontece quando falha. Quando falha, a memória é inércia, matéria seca de química que nos mexa. É um lapso, quando muito. Pelo contrário, a memória não perdoa quando é capaz de fazer recordar os piores momentos nas piores ocasiões. Mas por vezes exulta. Quando a memória existe, ajuda e brilha, convoca aqueles instantes em que a alegria nasceu indomável e criou camadas de imagens nossas em cima de imagens reais.
Liga dos Campeões, Milão 96, 2-3. Foi com a mão esquerda que Jardel puxou insistentemente a camisola ao comemorar o golo do empate, como se quisesse agarrar todo o azul e branco para esse instante, convocar toda a força coletiva para abrir os braços em pleno voador? Ele que, saindo do banco, resolveu o jogo nos últimos 15 minutos, dois golos inteiros de oportunidade, cabeça e pé, a golpe duplo.
Uma noite onde, com Sérgio Conceição na equipa, Artur foi demónio e Jorge Costa imperial no duelo (que teria história, pois) com Weah. Jardel a correr para os braços de António Oliveira no terceiro golo. E o careca na baliza, Wozniack, o polaco que nunca fez esquecer Mlynarczyk (e como podia?...). Essa foi a "minha" vitória em Milão e ocupou-me as memórias do dia, como se estivessem guardadas numa caixa forte, vivas e intactas, antes do jogo da passada quarta-feira com o AC Milan.
Se, 15 dias antes, o jogo no Dragão havia sido esmagador, uma bandeira de rigor competitivo e qualidade de jogo, esperava-se que - em casa - o AC Milan utilizasse a sua (quase) derradeira oportunidade para entrar com tudo. Não é um Milan qualquer, aquele que habita (com o Nápoles) o primeiro lugar da Seria A italiana, sem derrotas e apenas um empate em 11 jogos. É um Milan, porém, que poderia comprometer-se ao nervosismo com um FC Porto em pressão alta e com uma entrada forte no jogo. Assim foi. Se a vitória do jogo de 96 em Milão foi histórica, histórico poderia ter sido o resultado do jogo desta semana. Uma mão cheia de oportunidades desperdiçadas para amealhar merecidíssimos 3 pontos que acabaram por tombar para uma divisão. Injusta, inglória e com o desalento espelhado na face dos jogadores.
Podia estar quase resolvido o que vai acabar por se resolver. Não há qualquer memória que atrapalhe ou iniba uma equipa com este caráter de ganhar ao Atlético de Madrid no Dragão. E fazer, cá, o que nos impediram de fazer em Madrid.