PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - O campeonato entra na jornada (com possíveis estilhaços para as próximas) em que desafia o que parecia impossível. Os 10 e 12 pontos que o Benfica tinha de avanço para FC Porto e Braga a nove jogos do fim ameaçados de diluírem-se nas últimas quatro.
Tudo começou no clássico e como o exército de personalidade portista afirmou-se e ganhou em plena Luz. Agora, é a vez do onze bracarense, desafiando a história. Este Braga ganhou, nas últimas décadas, a dimensão de "quarto grande" e falta fazer... o que ainda não foi feito, o título.
É um confronto que revela, a este nível, um novo clássico do futebol português. Perante o campeonato, um jogo e a história (tudo ao mesmo tempo) o teste que o Braga enfrenta é conseguir, nesta hora única, ser o que foi tantas vezes esta época: a equipa que melhor futebol jogou.
2 - A forma como o terá de fazer é que exige uma força mental e tática superior a todas as anteriores. A meio da época, quando derrotou o Benfica na Pedreira, Artur Jorge revelara pela primeira vez a alternativa tática, a estrutura num 4x3x3 pressionante e construtivo com a introdução do terceiro médio, em vez do 4x4x2 com que sempre jogara até então e marcara muitos golos mas revelando desequilíbrios defensivos.
A partir dessa data, passou a jogar com essas variantes e o seu futebol ganhou maior poder tático de para dar diferentes respostas aos jogos. Este, na Luz, terá de ser jogado na esperteza e inteligência de quem sabe defender bem para atacar melhor. A colocação de Ricardo Horta como terceiro médio/segundo avançado após a saída de Vitinha deu o equilíbrio entre os dois sistemas e dinâmicas de jogo. Desviá-lo para uma ala e fazer um triângulo a meio-campo (juntando Racic à dupla Musrati-André Horta) poderá ser a primeira tentação tática de Artur Jorge. A outra, talvez a mais corajosa para assumir o momento, é manter o desenho e só mudar os traços duma peça do sector, o nº8, entre a saída leve de Horta ou a muscular de Racic.
3 - Schmidt terá visto como perdeu esse jogo e como então o seu 4x4x2 de quatro médios sem alas ficou preso num quadrado sem conseguir encontrar a saída que já viria a ver no confronto da Taça com um flanqueador, então Gonçalo Guedes. A situação é hoje a mesma. Para desmontar o Braga precisa desse tipo de jogador, hoje (como no acender e apagar das melhores e piores luzes exibicionais época) personificado em David Neres. Uma opção que exige também reforço tático do meio-campo. E assim vamos ter ao mesmo espaço onde Artur Jorge estará a pensar como epicentro do jogo. Uma consciência que pode levar Aursnes para a tal decisiva casa tática nº 8 (com Florentino a nº 6 guarda-costas do coletivo com bola). O meio-campo como o espaço onde, no fundo, se determina tudo o que acontece no ataque e defesa.
Musa e o lado mental do jogo
O Benfica terá mais dúvidas do que o Braga de como irá jogar. Não tanto em questões de dinâmica tática mas dos jogadores mais indicados para o fazer. Se para nº9, o futebol fino de apoios, passe e finalização com acrescento de jogo aéreo, aponta mais para meter Musa do que para a garra do remate de Gonçalo Ramos, a meio-campo é mais difícil tomar a opção sobre João Neves. Ele foi o oxigénio que a equipa teve numa fase em que ameaçava cair em profunda depressão mas os contornos do jogo podem não ser os ideais para ele (e para como a equipa terá de jogar nesse espaço) porque agora não se trata só de sair com a bola a atacar desde trás mas sim também como jogar sem ela numa dimensão físico-tática defensiva muito superior.
No fundo, as duas equipas terão de marcar-se uma à outra. Não acredito na tese do "sentir a pressão" do estádio cheio (medo cénico) como decisivo para condicionar o melhor Braga. Esse lado de "metralhadora mental" estará mais, em face do receio de perder a vantagem enorme que já teve, do lado encarnado. De um dia para o outro a equipa teve de se refazer mentalmente. É esse factor (mais do que o atraente debate tático) que, acredito, o entorno (estrutura e treinador) terá mais trabalhado perante os nervos e ansiedade dos recentes jogos.