PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 Um dérbi secular com banda sonora atualizada para os jogadores dos novos tempos.
A tradução livre de "The Scientist", tema dos Coldplay, tem palavras como perguntas, segredos, correndo em círculos e cabeça. Talvez numa delas esteja a resposta para o que acontecer neste jogo eterno, Sporting-Benfica. Penso em tudo o que o rodeia, dentro do campo, onde o jogo real se disputa, e fora dele, onde o virtual começa.
Foi o que sucedeu vendo jogadores do Sporting nesta semana prévia na noite de Coimbra, no concerto entre "Paradise" e "Fix you". Nada disto nos deve colocar em termos de antevisão ao jogo a "correr em círculos".
Os tais novos tempos mais do que mudar comportamentos tornam, sobretudo, tudo visível até à descontração da exibição. O problema (segredos para derrota ou vitórias) nunca estará em situações destas nas quais, jogadores e clubes (responsáveis técnicos), sabem perfeitamente o que muda as cabeças para o jogo e nenhum desses segredos está aqui.
2 Em suma: o futebol não pode ser uma ciência à parte da vida. Mais do que ir por segredos, planear a adaptação da realidade e evitar fugas/segredos. Clube e jogadores.
Nuno Santos é um agente provocador a todos os níveis. Provoca adversários, bancadas, no campo ou desde o banco, faz coisas incríveis com a bola, tem atitudes insolentes, exibe-se até colocar a análise ao seu comportamento em círculos (com a cabeça à roda de quem vê). É um craque mas em qual desses locais da sua expressão irá parar, no jogo, essa roda, é sempre a dúvida mais bem guardada que só o relvado revelará. Até lá, são só segredos e perguntas.
3 O Benfica entra em campo acariciando o título. Ainda terá o último jogo em casa contra o lanterna vermelha para a consagração, mas fazer saltar as rolhas no dérbi tem um significado extra incomparável.
Para o tentar deve entrar com o onze que o fez reagir ao susto após, em dois jogos, ter passado da liderança com 10 pontos de vantagem (e ponto final no campeonato) para curtos quatro (e o ponto de interrogação a surgir). Nele tem de estar o baixinho com a camisola sempre dentro dos calções (rato rotativo nº8 João Neves) e o extremo que anda fora-dentro e inventa coisas diferentes (o vagabundo soneca David Neres).
O Sporting poderá estar a pensar num sistema alternativo para a próxima época mas nesta o ADN tático não é para mexer. A dúvida está em saber se joga com o nº9 clássico mesmo sendo este um que prioritariamente joga de costas em apoios (Paulinho) ou com o trio atacante móvel. Acho que a melhor solução será jogar com... as duas. Começar com a habitual móvel e lançar a outra, de nº9, depois. A tática numa ciência à parte.
O futebol do antigamente
Gosto quando a antevisão aos jogos nos faz vasculhar na história. Vejo então os velhos registos da última vez que o Benfica cometeu a provocação de vencer o título num jogo em Alvalade. Passaram 48 anos, foi em 74/75. Tinha um ataque com Nené, Vítor Baptista e Moinhos com Simões, em fim de careira, a médio-centro como o treinador Pavic lhe pedira. O Sporting tinha Yazalde, "Bota de Ouro" e marcou por um médio franzino que jogava muito, o Fraguito. O "futebol do antigamente" sempre teve um prestígio enorme mas neste caso é mesmo uma questão de valores.
Então era outro futebol. Igual no orgulho, semelhante no sentimento mas muito diferente no "circo mediático" que hoje o rodeia (e corrói). Eram mais tempos de rádio e crenças do que de imagens e alienações. Era, afinal, outra forma de viver. A vida e o futebol. É, por isso, impossível fazer paralelos desse último antecedente com o presente. Não será pacífico dizê-lo mas os jogadores de hoje não sentem a história como os de antigamente (a não ser que seja para proveito próprio, um recorde, por exemplo). O dérbi lisboeta sobreviveu a tudo na sua essência mesmo mudando tanto a moldura. Este tem um significado histórico além desta época no qual surge já fora do tempo certo em termos de efeitos do resultado para os dois.