Considero que Florentino devia ser convocado e que Pote tem lugar indiscutível em 26 escolhas
PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - Aquilo não foi bem um remate à baliza. Foi um beijo ao futebol. Enviado de longe como a melhor declaração de amor. O guarda-redes estava uns passos adiantado, o suficiente para aquele voo de bola-pássaro ir até as redes com uma precisão poética.
Dias dias depois, parece que este grande jogo do Sporting em Londres foi só esse golo do outro mundo. Na verdade, com o passar dos tempos, todos irão recordar esta eliminatória como "aquela do golo do Pote do meio-campo" mas, durante todo o tempo, o Sporting foi muito mais do que isso.
Sobretudo na segunda parte (que teve esse golo dentro) em que pegou na bola e no jogo da melhor forma. Aumentou a pressão (com Ugarte comedor de bolas), boa visão de saída (com Esgaio regenerado da cabeça às chuteiras) e a defesa segura com um menino gigante no eixo dos três centrais onde costuma morar Coates.
Pois, sem ele, morou lá Diomande, 19 anos, também capaz de nas alturas falar com os pássaros, mas sobretudo com uma personalidade e serenidade (sentido posicional, corte e costura, entenda-se tirar e entregar simples). Não é muito rápido, mas como está sempre no sitio certo isso nem se nota porque quase nunca precisa de "sprintar" para chegar primeiro à bola. Ele já lá está por antecipação. Não é normal.
2 -Nessa segunda parte só faltou Edwards mais preciso no remate para resolver tudo no melhor período leonino. Depois, teve de sofrer e emergiu Adán e defesas de golo feito. Amorim disse que não mexeu porque via a equipa tão bem que receava tocar-lhe e estragar o que ela fazia, mas a verdade é que fui sentindo que as substituições pareciam ir entardecendo com o passar do jogo/tempo e o Arsenal crescia já tendo em campo Saka, depois Odegaard, e a maior dimensão física a meio-campo com Thomas Partey (de início, Arteta menorizou, claramente, o adversário e jogo). Sem dilemas estéticos, o onze leonino conseguiu aguentar-se e foi até ao ultimo penálti para decidir e ganhar. O jogo que recordarei por um golo até ao fim da vida.
3 - Além da teoria dos estímulos competitivos, exacerbado numa noite europeia em Inglaterra e adormecido em contextos nacionais sem esse apelo, este Sporting é uma equipa que cruza o valor que tem como potencial com a inconsistência exibicional-mental que ainda condiciona muitos jogadores. Falta-lhe a maturidade de nunca se deixar distrair em campo, seja o jogo contra que tipo de adversário for.
Este não é, porém, um problema normal de crescimento da equipa. É um problema da matéria de que ela é feita. Por isso a necessidade de mexer no seu interior mais profundo e não só esperar que ela cresça por si própria. Pelo contrário, esta equipa precisa mesmo de quem lhe dê ordens. Para, no limite, ser o que verdadeiramente é (ou pode ser, com outro "chip" de concentração-motivação competitiva instalado permanentemente).
A primeira vez de Martínez
Considero que Florentino devia ser convocado e que Pote tem lugar indiscutível em 26 escolhas, mas mais do que debater essas ausências ou opções de Martínez, acho mais importante olhar setor por setor, ouvir as suas explicações e, no global, ficar com a sensação que tem a intenção de, como ponto de partida, mudar o sistema tático da Seleção.
Isto é, vendo a chamada de seis defesas-centrais e quatro laterais, imagino a Seleção a passar a jogar com "defesa a 3" como sistema preferencial de arranque da era-Martínez. Depois, poderá resgatar o 4x2x3x1 e suas variantes que têm feito a nossa imagem tática de marca. Os jogos com Liechtenstein e Luxemburgo, adversários filhos de um Deus competitivo menor, podem ser ideais para ver como essa ideia funciona.
Fez-me recordar como, por exemplo, no passado, Scolari também quis no primeiro desafio jogar a "3" (particular em Itália) e Fernando Santos, na estreia, montou um 4x4x2 losango (particular em França). Nenhum funcionou, pelo que este possível primeiro ensaio é, no fundo, o novo selecionador a tomar o pulso ao nosso futebol. Com oito médios a duplicar três posições nas características, está garantido que a qualquer momento podemos voltar à nossa filosofia de que a bola é nossa e depois logo vemos o que fazemos com ela.