PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 Antes do inicio da história já existia uma pré-história, mais curta, mas ainda maior. É a sensação que me passa a cada festejo de um título de campeão nacional do FC Porto nos últimos 40 anos.
O sentimento que move como esses títulos são festejados é o mesmo desde o primeiro dessa era. A grande lacuna que, porém, sinto quando se contam esses títulos do "FC Porto de Pinto da Costa" é que nessa contabilidade faltam os dois mais importantes: os de 78 e 79 que, ainda "só" como responsável máximo pelo futebol, marcou a fundação, junto com o treinador ideólogo, do "FC Porto pedrotiano", da inteligência e da esperteza, catalisador do "jogar contra", inimigos reais e imaginários, desafiador do poder centralista do sul e capaz de, assim, criar um exército futebolístico que atravessou o tempo (e tantos ciclos de poder) ao ponto de sentir esse ponto de contacto entre o onze de 78 com Rodolfo, Oliveira ou Gomes, e o de 2022 com Pepe, Vitinha ou Otávio.
2 O maior mérito de Conceição foi saber entender, incorporar e resgatar essa raiz da história, numa fase em que essas bases genéticas estavam abaladas como nunca estiveram nesses 45 anos desde a sua fundação. Nesse contexto, o sentir e pulsar portista em relação a este título tem, nos festejos, as mesma bases da sua origem de criação ideológica.
A continuidade de Conceição não pode, por isso, ser debatida como a saída ou não dum mero treinador. O que está em causa é garantia de manter essa "marca Porto" numa altura em que, talvez mais do que nunca desde essa raiz, é o clube a depender mais de um treinador (sua forma de ser) do que o contrário (quando, dizia-se, ser fácil qualquer treinador ganhar no FC Porto).
3 Outra coisa é discutir a forma de jogar e nesse debate um treinador nasce para ser avaliado todas as épocas (independente de ganhar ou perder). Conceição sabe isso como sabe as razões de como um estilo pode só representar uma forma de jogar adaptada às circunstâncias, como pode representar mesmo a ideia de jogo preferida do treinador.
O que acho curioso (e invulgar) nessa dicotomia é que penso que a época em que a equipa jogou mais de acordo com o estilo preferido de Conceição foi a... primeira. Quando teve de se adaptar às circunstâncias (carências em função de limitações de contratações) e o seu futebol rápido, físico e vertical moldou um onze indomável de caráter tático-muscular do ataque à profundidade. Com esse, admito, ninguém adormecia (independentemente de saltar de alegria ou de susto).
Falar de estilos serve tanto para definir identidades como, sobretudo, para marcar diferenças entre umas equipas e outras. Neste caso serve para marcar um treinador e suas circunstâncias. Por isso, o futebol (e seus treinadores) merece ser debatido acima de críticas ou elogios.
As pedras fazem crescer
O segundo lugar do Sporting não pode ser, na frieza dos resultados, visto como um fracasso de quem não ganhou. A competitividade que a equipa mostrou (na sequência do título anterior) revelam a solidificação dum método que garante manter este rendimento na próxima época.
Por razões e políticas diferentes, Amorim tem hoje a mesma importância para o Sporting que Conceição para o FC Porto. São, no sentido da influência do treinador na estrutura do clube, "equipas de autor".
Esta época fez, talvez, crescer mais Amorim-treinador do que a anterior. O próprio caso-Slimani, vendo, primeiro, o seu impacto no jogo da equipa (quis dar-lhe alternativas de jogo e acabou confundindo-lhe princípios base) e, depois, o assomo disciplinar que exigiu de Amorim, fizeram-no evoluir mais como treinador a todos os níveis (pelo contacto direto que teve com as faces negativas, do jogo e do grupo, opções e gestão).
Olhando todo o trajeto do campeonato, penso que o momento-chave foi a derrota com o Braga em Alvalade. Até pela forma como perdeu (quando, desequilibrada, buscava a vitória no fim) mostrou como a equipa (e treinador) ainda não tinham aprendido a saber lidar com a derrota durante o jogo. Saber isso é imperioso para ganhar. O Sporting de Amorim fez esse curto caminho das pedras.