PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
Corpo do artigo
1 - Está jogada a primeira volta do campeonato. Os resultados coincidem na mesma classificação mas nela coexistem duas Ligas com outra no meio que é difícil definir. As que se distinguem em polos opostos são a dos três grandes que jogam para o título e, na outra ponta da tabela, a dos que lutam por não descer. Deveria existir, no meio, uma terceira Liga composta por uma classe média de gama alta. É onde está a falhar este campeonato. A cada temporada, a elite distancia-se cada vez mais e até o Braga criou uma ilha privada no quarto lugar que, neste momento, habita sozinho.
Neste cenário, é natural que seja visto quase como um drama quando um dos três candidatos perde pontos contra os da outra Liga, onde muitas equipas habitam mesmo na cave da tabela. A derrota do Sporting nos Açores pode, por isso, assustar mais do que devia. Pelo resultado e pelos sinais que o jogo deixou (após outro, contra o Portimonense, em que embora ganhando também falhou a segurança da exibição). A verdade é que não sucedeu nada de muito diferente do visto em tantos jogos anteriores que ganhou.
2 - Olhando o jogo/posicionamentos, a maior alteração está em Pedro Gonçalves a descair mais na meia-esquerda em vez da meia-direita, onde rende mais. A relação com a ocupação dos espaços encurtou-se perante o mérito defensivo do Santa Clara em meter o jogo em 30 metros.
A chave para iludir essa prisão está, muitas vezes, em sair desse espaço, mesmo que tal implique o recuar no terreno de um elemento atacante, para este, fugindo assim da marcação apertada, ir para um espaço livre que lhe permita ver o jogo de frente sem um adversário a respirar-lhe em cima. Depois, claro, é questão de usar a qualidade de passe. Foi assim que surgiu aquele golo de precisão com passe (Pedro Gonçalves a vir atrás) e remate de primeira de Sarabia. Não chegou, porém, para evitar a derrota.
3 - O FC Porto sofreu mas ganhou no Estoril, frente a um onze "canarinho" que após uma primeira parte de encaixe perfeito de marcações aos avançados portistas (subida dos laterais, inclusive) quis levar longe de mais esse "jogo de pares" quando, já na segunda parte, Conceição ia multiplicando o úmero de jogadores na frente.
Querendo seguir individualmente tantos talentos portistas, Bruno Pinheiro quis jogar quase um-para-um por todo o campo, entenda-se então este aqui já apenas como o seu meio-campo defensivo.
Perdeu, naturalmente, esses duelos nos espaços/confrontos mais decisivos face à superioridade técnica das individualidades portistas (exacerbada na forma como Luis Díaz fez dançar Soria para marcar o golo do empate e dar o da vitória).
De Sá Pinto a Ayestarán
Fazer uma equipa não é mesmo tipo micro-ondas, meter os jogadores lá dentro e esperar cinco minutos, mas dar-lhe um novo estado de ânimo sem mexer no onze e sistema terá um processo parecido no poder comunicacional. Penso nisso vendo como em Vizela (onde Álvaro Pacheco fizera a analogia do micro-ondas) o Moreirense surgia transfigurado na atitude perante cada bola. O "impacto Sá Pinto" deu um grande dérbi no plano emocional. Taticamente, seguiu Lito e manteve o sistema de três centrais (não é o seu preferido, mas era o que os jogadores usavam). À chicotada psicológica terá agora de seguir-se a metodológica.
E, nesse plano do método, há um treinador que organiza sempre bem a equipa e quase não é falado: Pako Ayestarán em Tondela. No Bessa, voltou a montar o seu 4x3x3, que não busca cultura de posse mas sim de eficácia rápida nas transições, o que se nota como, mal perdendo a bola, monta o 4x1x4x1 para cobrir em largura, ou na velocidade com que sai em contra-ataque, pela alas, com Salvador Agra ou Rafael Barbosa (terceiro médio feito segundo avançado) e um n.º 9 forte a segurar e com técnica a jogar (Dadashov). A prova que é mesmo trabalho de método está em a equipa manter o processo mesmo perdendo uma das setas (Murillo). A emoção e o método, de Moreira a Tondela, Sá Pinto e Ayestarán.
MODELOS
Guitane: soltou-se!
Na sua segunda época no Marítimo (agora emprestado pelo Stade Reims), subiu muito de rendimento. Aos 22 anos, o franco-argelino Rafik Guitane encontra no modelo de jogo mais solto de Vasco Seabra a liberdade de movimentos que precisava para, partindo desde uma ala (a direita puxando para o pé esquerdo) ou no meio como n.º 10 médio-avançado de rasgo, soltar toda a sua qualidade. É um criativo com visão e definição (passe e remate) que também tabela e abre espaços com a equipa.
Boavista: Sauer no meio
Em busca da melhor solução, Petit passou por três sistemas (3x4x3, 4x3x3, 4x4x2) mas acabou por deixar fugir o melhor, perdido na opção do meio. Foi quando na segunda parte (após lesão do central Ilori) desfez a defesa a 3 e passou para 4x3x3, onde estava a chave para o melhor funcionamento do onze: Sauer mais na zona central num triângulo de médios, com Pérez a n.º 6 e Makouta (ou Vukotic) mais subido. Embora jogue bem a partir da ala (da direita para dentro, para onde voltou em 4x4x2) é no meio que entra mais no jogo e dá à equipa a sua visão com passe, posse a sair da pressão, organização e definição entre linhas. O jogo da equipa necessita, claramente, desta sua influência.
Vital: Defesa-central
Vai aparecendo no centro da defesa do Estoril (joga sobretudo nos sub-23) mas contra o FC Porto surgiu na primeira equipa e voltou a dizer ser uma das promessas mais interessantes do campeonato em termos de defesas-centrais. Com 21 anos, Bernardo Vital (feito no clube desde os sub-17) tem sentido posicional, robustez nos duelos (1,87 m) sem receio de ir nas alturas e, destro, sabe ter a bola na primeira fase de construção. Será interessante ver a sua evolução, à zona ou marcando mais em cima.