PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 A fúria pelo jogo de Taremi tem a serenidade do talento. Tem muita mobilidade mas não é hiperativo. O seu jogo é relaxado, técnico e inteligente. No seu catálogo está, primeiro, o critério de movimentos para procurar o melhor local para receber a bola e sentir o passe tão importante como o remate.
Por isso, joga dentro e fora da área com a mesma naturalidade. Foi esta visão dupla dos espaços que Conceição usou para fazer aparecer e desaparecer o 4x4x2. Na maioria do tempo, em Roma, Taremi foi mesmo o construtor dum 4x2x3x1, tal a possibilidade de se meter entre linhas (entre defesas e médios da Lázio) e juntar a equipa (construção e definição) mesmo no momentos mais difícil do jogo.
O penálti que arrancou e o passe-chapéu que fez levitar a bola por toda a defesa italiana foi a melhor forma de mostrar que, mesmo com os espaços a reduzirem-se tanto, existe sempre como os abrir pelo ar.
2 Após uma primeira parte sem definir da melhor forma o controlo da ligação entre sectores, o segredo para o crescimento tático portista esteve em dar diferentes linhas ao seu meio-campo. Ou seja, após começar o jogo com bola mas com a dupla Vitinha-Otávio demasiado de perfil, jogando lado a lado no centro ao pegar no jogo mais atrás (com Uribe a olhar a meia-direita), meteu a chave tática certa quando definiu claramente três linhas no meio-campo: Uribe pivô de segurança, Vitinha n.º 8 de saída em posse/passe, e Otávio mais adiantado quase "10". Dessa forma, estendendo na profundidade do jogo interior estes três jogadores que definiam três linhas de progressão, passou a ligar o jogo desde trás, sempre com superfícies de passe visíveis. Passou, assim, a jogar por dentro do meio-campo italiano, controlando o jogo duma área a outra. Até encontrarem Taremi.
3 Os penáltis foram o último ato duma eliminatória que se tornou mais dramática do que devia como a primeira parte em Braga mostrou. Nesse período, num 3x4x3 com largura e mobilidade com bola (pelos passes) e sem bola (pelas desmarcações), o Braga jogou em cima do Sheriff.
Da visão geométrica de saída de Al Musrati, até à ligação Ricardo Horta-Iuri Medeiros como dupla atacante de "duendes tecnicistas". Acrescento nota individual para como Yan Couto cresce a nível de fundamentos de jogo e solidez tático-atlética a fazer todo o flanco direito.
Não tem sido uma época fácil para Carvalhal mas a fidelidade à sua ideia de jogo tem sido decisiva para a equipa nunca perder referências mesmo que de todas as posições do onze só três se tornaram pilares: Al Musrati, a "6", e Horta, diferenciador ofensivo com critério (mais o guarda-redes Matheus). Todas as outras (por lesões, opções, rendimento, etc.) estiveram permanentemente em obras. As improvisações criam impacto mas um treinador tem de olhar para a equipa sempre com a visão duma época inteira.
Por que desapareceu João Mário?
Quando um jogador sai da equipa a meio da época, raramente a culpa é só dele. Em geral, mudam as ideias de jogo ou muda mesmo o treinador. Esta é uma forma de olhar para o que se passa com João Mário.
No início, com Jesus, foi visto como a peça chave que faltava para, com a sua leitra a "8", equilibrar todo um modelo de jogo que sem ele se partia a meio-campo. E, de facto, assim era. O seu futebol não mudou, entretanto. Com Veríssimo, porém, a tendência inverteu-se porque em vez da pausa e do passe apoiado que dava João Mário, o novo treinador busca outra coisa para esse espaço. Não penso, no entanto, que ele ainda saiba exatamente o quê, na busca que está em pleno curso da época de adaptação de uma ideia à equipa.
Por isso é que por esse lugar "8" começou por passar um jogador mais físico, recuperador que equilibrava atleticamente o sector, subindo a intensidade de segunda bola, Meité (em 4x3x3), e agora surge, num jogo de saída em posse vertical Taarabt, dando esticões de mudanças individuais de velocidade (que suporta o 4x4x2 nesse corredor central). Nesta mutações permanentes de ideia de jogo, sem definição de estilo, era natural que um jogador de toque como João Mário desaparecesse.
Dizem que busca-se aumentar a intensidade da equipa. Perde-se a sua identidade.