PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - Foi uma semana diferente das outras. Daquelas que, confesso, provocam sensações novas e outras estranhas. Nunca é tarde para descobrir formas de nos emocionarmos. Na vida, e no futebol, também.
Por isso senti esse estranho (porque não estava a contar) impulso interior, incontrolável e de arrepio, quando, de repente, a Ana Capeta foi quase Éder. O jogo estava a acabar e parecia impossível marcar quando aquela bola foi parar à frente da avançado com nome de quem vem de outro mundo. O remate saiu e no caminho deu então para sentir o "impossível".
A Seleção feminina tinha perfurado os nossos corações, mesmo daqueles que a olham ainda com desconfiança ancestral. Segundos de eternidade até a bola ser caprichosa com vontade própria, bater no poste e... ir embora sem entrar. Depois da primeira imagem, com as lágrimas e grito da Tatiana e da Jéssica, à flor da pele durante o hino no jogo inaugural, aquilo já era futebol mesmo, contra a melhor seleção do mundo, os ditos invencíveis EUA.
Capeta foi quase Éder. Ao contrário de Paris, aquela bola na longínqua Nova Zelândia bateu no poste. Não entrou. Entraria, porém, algo mais forte. Senti isso. A sensação que, como na voz de James Brown, isto pode ser um mundo de homens mas nunca seria nada sem uma mulher ou rapariga. No futebol é igual. Nas chuteiras das "novas Cinderelas".
2 - Ao mesmo tempo, a pré-época futebolística dos homens seguia nas areias movediças do mercado. A bola rola nos particulares mas fala-se mais dos jogadores que podem vir ou sair do que dos que estão verdadeiramente a jogar.
Lá longe, os donos do dinheiro com uma toalha na cabeça brincam com a realidade como se ela fosse um jogo de computador. Num local diferente mas com a mesma origem financeira, o PSG Qatar está a levar Gonçalo Ramos do Benfica com um empréstimo simulado para controlar regras do fair-play financeiro. O futebol desmontado por dentro da sua essência.
Entretanto, Varela, tão desejado para resolver o meio-campo do FC Porto, voltava a entrar em campo pelo Boca Juniors num jogo escaldante da Copa Libertadores. Um negócio nunca será fácil quando entram tantas variantes em jogo.
3 - Os treinadores vão, assim, tentando montar as equipas sem saber que terreno vão verdadeiramente passar durante a época. Perto do primeiro grande duelo, a Supertaça, Schmidt busca a melhor forma de distribuir a abundância de médios e avançados que, nas posições, alguns, os que criam mais dúvidas onde colocar, também vêm da casa dos médios.
Conceição debate-se com mais um processo de (re)invenção de jogadores para montar mais outra equipa desafiadora de qualquer adversário e até, sobretudo, das suas próprias capacidades. Origens diferentes que se esbatem, olhos nos olhos, dentro do campo.
Como irá crescer Gonçalo Ramos?
Debate-se muito a transferência, valores e negócio, de Gonçalo Ramos para o PSG mas pouco se fala do que futebolisticamente interessa, olhando o jogador: qual a margem de progressão/evolução de Gonalo Ramos nas próximas épocas?
Penso nisso vendo as diferentes expressões que já mostrou nas (poucas) épocas realizadas no Benfica. Do avançado raçudo que arrancava desde a faixa esquerda, passando pelo segundo avançado de luta que amassava marcações, até ao ponta-de-lança que, animal de área, se tornou um finalizador puro.
Acredito que se especialize e cresça como um n.º 9 goleador mas, neste processo, a tal evolução necessária não é fácil de garantir que aconteça até ao mais alto nível dos grandes campeonatos. Por isso, ir agora para França, uma Liga competitivamente suave mas num clube de exigência máxima europeia, pode ser o melhor contexto para essa evolução (se bem enquadrado num plano de rendimento e crescimento).
Gonçalo Ramos precisa dessa exigência competitiva mas o percurso tão híbrido pela forma tão diferente como treinadores distintos o viram (no valor e posição) não lhe deram as bases de sustentação para o ver como n.º 9 especialista indiscutível. A evolução terá, pois, de ser também uma maturação da especialização.