VISTO DO SOFÁ - Um artigo de opinião de Álvaro Magalhães.
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Os portistas festejaram ontem a conquista do 30º. campeonato, num clima de grande orgulho tribal, durante e depois de um jogo-festa com o Estoril. Por uma vez, as mulheres que pensam que os homens vão ao futebol para se divertirem e passarem um bom bocado tiveram razão.
Mas se os portistas cantam e riem, benfiquistas e sportinguistas de todos os géneros e quadrantes desfazem-se em queixas, desculpas, acusações. Para eles, o FC Porto é o campeão da liga da farsa e do jogo fora das quatro linhas. Rui Santos, na CNN, disse que este era o campeão das pressões, internas e externas. Leonor Pinhão, no CM, explicou esta vitória com as ajudas dos árbitros e dos VAR, que, diz ela, «jogaram» de azul e branco nos momentos mais difíceis. Por sua vez, Rui Pedro Braz considerou que marcar um fora-de-jogo tão pequeno, de apenas 2 centímetros, a um clube tão grande, era uma «falta de respeito». E, enquanto outro Braz (João Braz Frade), ex-vice presidente do Benfica e comentador na CMTV, dizia que o árbitro Luis Godinho parecia a criada de servir de Otávio, Tito Arantes Fontes, o alucinado presidente do Grupo Stromp, garantia que o VAR João Pinheiro era o padrinho dos portistas.
Estes cinco exemplos, ínfima parte de um coro vastíssimo, não diferem muito dos comentários rasos que os adeptos fanáticos deixam nas redes sociais e nas caixas do correio dos jornais. Afinal, eles são todos adeptos. E, embora usem modos de expressão diferentes, a intenção é a mesma: colocar a vitória portista no território da suspeita, longe, muito longe, do mérito.
Por outro lado, não houve qualquer manifestação institucional de «fair-play» desses rivais vencidos. E ainda bem, ou também teriam razão os que acham que o futebol deveria ser um exemplo de elevação e boas maneiras, quando se sabe que há actividades mais apropriadas ao exercício dessas qualidades.
O que não tem faltado por aí é aquela reflexão filosófica do tipo «Onde é que falhámos?». Vi um excerto de um programa, na CNN, em que a empertigada moderadora sugeria uma aliança dos dois clubes de Lisboa. Um triunfo do FC Porto é sempre escandaloso, uma anomalia, por ser o triunfo do provincianismo incivilizado sobre o centro luminoso e irradiante da vida. Logo, tem de haver explicações, planos para a correcção da anomalia e, já agora, alguns culpados. Ainda não culparam a verdura da relva, o formato das balizas ou a excessiva redondeza da bola, mas já andam lá perto.
Acontece que, para os portistas, a observação deste muito visível incómodo dos rivais, que sinaliza a sua frustração, tristeza e azedume (há quem, resumidamente, lhe chame azia), faz parte do menu de degustação de mais este triunfo, ou seja, do tal bom bocado. Afinal, foi o mau perder de Luis Filipe Vieira que tornou o campeonato de 2010/2011 inesquecível. E se, desta vez, a BTV tivesse mostrado os festejos dos novos campeões e a CMTV não preferisse falar da morte do adepto e dos incidentes na garagem do Dragão, se não tivesse soado, enfim, por aí a tal música lacrimejante dos perdedores, os festejos do 30º. não seriam a mesma coisa.