PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
Corpo do artigo
1 - Com a bola, uma equipa vive. Sem a bola, uma equipa sobrevive. O resultado pode confundir estes conceitos, mas antes, seguindo o jogo, eles são as suas linhas de orientação.
Esta é a forma de perceber a pergunta que terá deixado Vítor Campelos, treinador do Chaves, a pensar sobre o que dizer aos jogadores que ganharam sem posse ao Sporting e perderam com posse contra o FC Porto. Não é contradição, é futebol.
Sim, ficar a perder cedo no Dragão levou a equipa a procurar mais a bola enquanto ir empatando o jogo em Alvalade levou-a, pelo contrário, a procurar mais controlar por onde ela andava mas, além do jogar em função do resultado, existe algo mais do domínio do subconsciente tático que impede estas equipas de, nestes jogos, evoluir em termos de personalidade/confiança. Ficam presas na tal dicotomia viver-sobreviver e, no chamado "futebol realista", ganha sempre a segunda opção.
2 - Não duvido que Campelos prefira sempre a opção qualidade de vida mas a sua visão como treinador preso (como todos) às circunstâncias do jogo e seu resultado, levam-no a, pura e simplesmente, guardar (se lhe interessa) o que tem no momento ou (se não lhe interessa) ir à procura de o mudar. O facto disso mudar tanto uma equipa é que deverá ser ponderado pelos efeitos para jogos seguintes contra adversários de nível semelhante.
É um dilema de muitas equipa da classe média do futebol português e que as impede de crescer porque vê-se, tantas vezes, que têm jogadores para mais mas estão, em tantos momentos, mais agarradas ao instinto de sobrevivência.
Sentem-no, sobretudo, os avançados. Um exemplo neste Chaves dum jogador que gosto: Juninho. Tem técnica atlética por todo o corpo, percebe o jogo à largura e a fletir com baliza. Precisa, porém, de qualidade de vida com bola. Não é jogador para esbracejar para não se afogar.
3 - Sem João Mário, o falso-ala que se torna terceiro médio no jogo, e apostando no mesmo 4x4x2 clássico com dois extremos (Neres, a sentir desgaste, e Draxler, ainda desentrosado sem ritmo), o Benfica não teve controlo das mudanças de ritmo em Famalicão. Melhorou no segundo tempo (sem Draxler e apelando mais às subidas dos laterais) e ganhou pela classe de Rafa.
A equipa necessita de acrescentar variantes ao seu modelo. Ao jogar contra equipas fechadas e sem querer (e bem) entrar no confronto físico, tem de usar a posse com mais criatividade construtiva. Ao denunciar demasiado o jogo atrás, esfuma-se a vantagem de ter tantos avançados. Antes da zona de definição, tem de haver uma zona de construção (de jogo nos ritmos certos).
A qualidade individual decidiu. A coletiva, aprisionou.
A pressão muda a posse
Pode uma forma de jogar mudar pelo simples aumentar da capacidade de pressão de uma equipa em relação à outra? Luís Freire quis responder a esta questão falando mais no que a equipa passou a fazer de melhor com a bola, mas para isso acontecer (posse) teve de existir antes o poder de retirar da zona de conforto os médios-centro do Braga (Al Musrati-André Horta), que fazem a nascente do bom futebol da equipa de Artur Jorge. Este Braga pode impressionar pelos avançados e sua fábrica de golos, mas se o quiserem travar/perturbar é fechando e encurtando os espaços de saída daquela dupla. Muitas equipas ainda não perceberam isso e o Rio Ave (que entrou bem a querer jogar no meio-campo bracarense) sofreu com isso pela, no mesmo período, deficiência de transição defensiva pressionante. Ao mudar esse comportamento na segunda parte, mudou o jogo (e quase o resultado).
O Braga, nesse campo, sentiu dificuldades que antes não sentira mas isso só fará a equipa crescer, por provocar uma necessidade de buscar novas opções para o seu sair a jogar preferencial. O Rio Ave precisa de ter o bloco mais junto para melhorar na reação à perda da bola.
Uma nota extra individual vendo o Rio Ave jogar: gostava de ver a velocidade de Paulo Vítor, lateral-ala destro na esquerda, a jogar como extremo-direito. Acho que era um pequeno combo em potência.
Qualidade: bloco e ala
O Paços é uma equipa tático-mentalmente doente sem poder de controlar jogos (até a ganhar), mas desta vez defrontou uma das equipas mais bem trabalhadas nas rotinas de cobertura-saída em contra-ataque explorando os três corredores: o Casa Pia de Felipe Martins. Impressiona ver Godwin a explodir de igual forma com o jogo a acabar, mas quem vejo mesmo a crescer na carreira é o lateral-esquerdo: Lelo, 22 anos, rotativo sem ser possante, defende seguro, sobe com critério e define bem como servir na frente.
Tática: mudar sistema
Importante a mudança do sistema a 3 para 4x4x2 na segunda parte (em superioridade numérica) que fez o Boavista vencer em Arouca com Martim Tavares, "garoto-golo", junto de Bozenik na dupla atacante. Com Perez-Makouta a controlar o meio-campo, tem largura profunda a atacar na direita com o lateral Pedro Malheiro. Com esta possibilidade (já habitual em Petit) de trabalhar a equipa em dois sistemas, esta, partindo da agressividade tática sem bola a pressionar, pode olhar de forma diferente para os diferentes momentos do jogo. O Arouca fez um bom jogo e apertou no fim, mas este Boavista é hoje mais equipa.
Mecanização: sem tocar
Não é fácil tirar fotocópia de uma equipa para outra após terem saído jogadores-chave e, sobretudo, entrado um treinador novo que quer, naturalmente, meter as suas ideias. Ivo Vieira terá, mais tarde, essa possibilidade mas nesta fase quanto mais este Gil se assemelhar ao anterior melhor será como bloco competitivo. 4x3x3 em vez de 4x2x3x1 (após o disfuncional 4x4x2 com o AZ) e o onze joga com convicção. Deu, assim, a volta ao jogo na Madeira. O resto, claro, são os golos de Fran Navarro, n.º 9 puro.