PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
Corpo do artigo
1 Olho para ele, o instinto oportunista com que finaliza, o estilo de se mover e a forma como, após tanta mobilidade curta e remate, nunca se despenteia, e vejo uma espécie de "Pauleta 2.0". Muda a ilha de origem, mas mantém a linhagem estilística.
Henrique Araújo é um ponta-de-lança fino, seletivo nos espaços em que se mete e aparece. Tem o poder de fazer parecer o golo simples e isso só mesmo os predestinados têm. E ele, é, claramente, um caso desses. Paços de Ferreira foi só um esboço do futuro que guarda no seu corpo de nº9 com olhos de baliza por todo o corpo.
O Benfica deve apostar nele, sem pestanejar, já na próxima época. Está muito acima de Gonçalo Ramos nessa pura ação finalizadora. Ainda há pouco saiu da formação, mas parece que já nasceu adulto. Os golos são (serão) a sua forma de vida. Para longos anos sempre com o penteado (cabelo curto e risco ao lado) impecável.
2 Mesmo na mais longa travessia do desterro há sempre alguém que te vê passar. Será assim que, numa parábola futebolística, se pode olhar para o percurso de Fernando Andrade no último ano. A recuperação da grave lesão que fez nos treinos com o plantel portista acabaram por fazer Conceição olhar para ele como nunca antes o fizera. Talvez nem mesmo quando jogou e marcou num clássico na Taça da Liga. Um jogador que, agora, lutava tanto por voltar a jogar (sem saber onde) não podia ser um jogador qualquer.
A oportunidade que lhe deu de jogar os últimos minutos da última jornada tinham uma caixa de destino guardado. Sentiu-se quando a bola lhe chegou redonda no passe de Fábio Vieira e, no primeiro toque que lhe deu, fez golo. O remate saiu até meio mordido (o guarda-redes podia/devia ter feito mais) mas isso ali já pouco importava. Aquele era um remate saído do meio do deserto. O futebol tem coisas destas.
3 A última jornada deixou várias imagens para emoldurar a época. Ricardo Horta a ir à bancada beijar a família (mulher e filha) após marcar o golo que o tornou no melhor marcador da história do Braga (recorde que vinha dos anos 50) e Sarabia a despedir-se em Alvalade, findo o jogo, rindo-se abraçado a Pote, como dois duendes saídos de pregar partidas na floresta.
Todos eles são jogadores que fazem bem ao futebol porque são, no fundo, aqueles que mais nos divertem pela forma como jogam (como perguntando aos adversários "doçura ou travessura?"). O nosso campeonato necessita de mais exemplares destes.
Agora vem aí o período com a bola parada e o mercado a inventar nomes todos os dias. O bosque do futebol dos negócios. A constatação de que, afinal, o futebol não precisa da bola para continuar a ser uma brutal adição.
A estranha forma de ganhar
No fim, Luís Freire referiu que "a equipa teve de aprender a saber como se ganhar jogos na II Liga". É tão verdadeiro como perturbante. Porque, de facto, o Rio Ave começou a época a jogar melhor futebol do que findou, com o tal "jogo mais físico" e, nestes confrontos decisivos, numa estratégia mais de espera e saídas rápidas mantendo sempre a organização defensiva completa. Não receou tornar o jogo "mais feio" para, tantas vezes, roubar a ideia de expectativa aos adversários que antes, no tempo em que subia constantemente o bloco, o apanhava no contra-ataque. Nesta fase final, sucedeu o contrário e o último jogo/final contra o Chaves confirmou isso (facilitado pelo 1-0 no primeiro minuto).
Penso que o Chaves tinha o melhor plantel da II Liga, mas nunca tirou melhor partido dele. Sobretudo a meio-campo, onde ver Obiora como nº6 a recuar, retira, à partida, saída de qualidade ao jogo. No oposto, o Rio Ave teve em Guga o médio que (junto da experiência de Vítor Gomes) melhor tratou a bola em posse e isso é fundamental para gerir ritmos nos momentos mais difíceis dos jogos. No ataque, Aziz mostrou o bom segundo-avançado com golo que é neste modelo de saídas rápidas e as acelerações de Joca foram decisivas para criar perigo. No fundo, foi o bom futebol (estética-tacticamente falando) adaptado ao realismo da competição que fez a base da subida.