VELUDO AZUL - Um artigo de opinião de Miguel Guedes.
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O FC Porto vive o seu melhor momento desde o início da época. Depois da hecatombe que se abateu sobre o Dragão com o habitual carrasco de Liverpool, a equipa dá quatro respostas convincentes em três competições distintas, ganhando os jogos de forma dominadora e absolutamente comprometida.
Mesmo no resultado magro da vitória sobre o Paços de Ferreira (2-1), sentiu-se que o controlo do jogo era absoluto e nunca assistimos à muito típica tremideira de 11 jogadores a recearem sofrer um golo nos minutos finais, recuando no terreno de jogo perante o desespero do treinador.
Na Taça de Portugal, a mão cheia de golos ao Sintrense provou que as segundas escolhas e os regressos se complementam, ligados à corrente. A vitória sobre o AC Milan é um compêndio de futebol jogado, tanto pelo que se fez como pelo que não se deixou fazer ao adversário. Ainda que desfalcada de algumas das suas principais peças, a equipa italiana foi metida num colete de forças, num jogo que só não foi perfeito pela manifesta falta de eficácia. Mas mesmo perante o golo que teimava em não surgir e perante o fantasma de um golo italiano, letal, contra a corrente do jogo, do FC Porto só se sentiu superioridade e maturidade competitiva, nunca ansiedade. Acerto e compromisso, como se a missão não pudesse ser executada com falhas e sem destino certo. Impressionante exibição.
Ontem, na deslocação a Tondela, uma vez mais uma equipa adulta a evitar ressacas europeias, a respirar saúde física e a acrescentar pontos à confiança. Uma equipa que ganha assim estes 4 jogos, após ter atravessado o porto de Liverpool a nado, não esmorece, não desarma e merece confiar em si, mesmo que entre no relvado com pitons de borracha.
O futuro em 4 dias
Os avançados partilham actos de solidão com os guarda-redes em muitos momentos do jogo. Deles, esperam-se actos decisivos, antagonistas e adversários nos desejos, específicos que são na sua função, especialistas. Jogam e estão nos antípodas do que 90 minutos podem oferecer. Marcar golos ou evitar golos, basicamente a síntese de finalidades últimas de um jogo de futebol desde que a bola sai do centro até ao apito final. O grande elemento diferenciador de afectos está na cobrança. Ninguém cobra um falhanço a um avançado da mesma forma que cobra um "frango" a um guarda-redes. Talvez porque aos avançados, esperamos sempre que acabem por marcar, mais cedo ou mais tarde. E, sobretudo, porque um golo sofrido é realidade, mas o golo que ficou por marcar é só futurologia.
Na Liga dos Campeões, Mehdi Taremi desperdiçou ocasiões de golo para avolumar o resultado do FC Porto - AC Milan para patamares históricos. É dele o golo da vitória mas ficou a ideia de que a exibição daquela noite ficou a dever golos à justiça final. Eis senão que, no regresso à realidade nacional frente ao Tondela, o avançado iraniano veste literalmente a pele de carrasco, fazendo um "hat-trick" pleno de oportunismo. Três golos em três oportunidades, inventando golos nos centímetros onde outros avançados reclamam metros para decidir. E assim, em 4 dias, transforma o perdulário em matador. O que confirma a tese de que tudo se perdoa a um avançado se ele souber tratar do futuro. Se um guarda-redes lida com o passado, mesmo aquele que acaba de acontecer, um avançado pode ter o privilégio de nos fazer augurar o que aí vem.