PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
Corpo do artigo
1 - No futebol não é possível olhar para dois jogadores da mesma maneira. Há, porém, uns que não conseguem escapar a uma mira mais implacável. Brincando com as categorias que compõem uma equipa, diria que nela existem nove posições e... duas profissões. Guarda-redes e ponta-de-lança.
Para estes ninguém pergunta se jogaram bem ou mal. Só se tiveram culpa nos golos sofridos ou se marcaram ou não. E, então, vai-se ver quanto custou, afinal, esse especialista.
Se olharmos um jogador pelo seu preço, o mais natural é acabarmos a concluir que foi caro demais. Não penso, claro, na casta de craques supranaturais que escapam a esse preâmbulo. Penso em todos os outros, afinal. Toldado por essa perspetiva, nunca será possível, em termos razoáveis, avaliar esse jogador unicamente pelo valor futebolístico.
2 - Darwin chegou ao Benfica, com 20 anos, por 24 milhões de euros, a mais cara compra encarnada de sempre. Nunca olhei para ele assim porque, dessa forma, nunca mais sairia daí. Discutir o preço é uma coisa (prisão de análise), debater o seu valor é outra (futebolisticamente libertadora).
Darwin vinha de fazer 14 golos pelo Almeria na II Liga espanhola. Chegou, irrompeu forte, arrancadas e golos. Depois, como a equipa, rendeu menos, deixou de ser titular, apanhou covid, regressou menos fulgurante, entristeceu e, sem marcar, passou a falar-se só no que custara e no que não rendia. Não faz sentido. Para se avaliar um jogador têm que se descolar do seu preço (isso é análise de política financeira do clube).
Ao vê-lo marcar nos últimos jogos, percebe-se a aposta de quando chegou (quase num exercício de imaginação porque só tinha um ano de Europa e num nível inferior) que via nele justificado potencial de futuro. Era (é), no entanto, um jogador, sendo esse talento-promessa resultante sobretudo da sua natureza (físico e jogo intuitivo), ainda a ser trabalhado nas bases da maturação da formação, para aprender fundamentos mais evoluídos de jogo e, até, como usar as suas forças. Isto funciona para todos miúdos ("pibes") naquela idade. Aos 22 anos, vê-se como isso está mais lapidado (mas calma nesse jogo de extremos de valoração).
3 - Não sei se alguma vez existirá encontro de análise entre o que custou e o que rende (ou, para responder ao vício inicial, por quanto será vendido). Sei é que não se pode olhar para um jogador como se tivesse a etiqueta do seu preço a esvoaçar na gola traseira da sua camisola a cada jogo.
Porque, visto assim, a esmagadora maioria falha, pois, indo pelo preço, hoje um dia qualquer jogador (goleador, ok) já custa, num grande campeonato europeu, mais do que 24 milhões. Assim, temos um problema inicial geral do qual só muito poucos se irão livrar. O jogador e o analista.
O jogador em folha de "Excel"
Noutra proporção e contexto de evolução (porque aqui se trata de um jogador já feito), Paulinho, no Sporting, também passou (e ainda passa) pelo mesmo tormento de avaliação bífida do que custou (os 16 milhões) e rende (ou seja, se marca ou não).
Por mais que digam que isso não o afeta, a verdade é que nunca o vi tão ansioso e até furioso quando falha um golo (o olhar dele turva-se de inconformado). Nunca tivera essa pressão ou imagem no Braga. E, em termos do que joga (algo até, em termos de equipa pelo modelo de jogo utilizado, mais relevante em Alvalade do que em Braga), o seu nível sempre foi muito alto. Mas não é possível fugir a esta tese das posições (nove) e das profissões (duas) dentro de um onze. Até Amorim explodiu em cima dessa critica disfuncional quando, no fim do jogo do titulo da época passada em que Paulinho fizera o golo da vitória, irrompeu pela "flash-interview" do jogador e agarrou-o gritando "agora, já podes dizer que foste barato!"
O dinheiro talvez seja mesmo tudo na vida do futebol moderno dos negócios e balanços financeiros. Mas, para perceber isso, não é com folhas de excel ou simples estatísticas. É com quadros de tática e gestos técnicos mesmo. Saberão mesmo todos (tantos) que falam hoje de futebol, quanto pesa uma bola?