PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - No primeiro lance, podem, numa linguagem técnico-futeboleira, chamar-lhe "ratice". No segundo, podem, em termos mais de visão, chamar-lhe inteligência de jogo. Em ambos, Otávio viu o jogo antes de todos em campo e deu os dois golos portistas contra o Gil. Repondo a bola rapidamente em jogo, marcando um livre com um passe preciso que isolou Galeno; rompendo sem bola para receber desmarcado e fazer um passe para Taremi só encostar.
Otávio é este tipo de jogador de "ratice e esperteza". Assim, voltou do Mundial e reentrou no onze portista para o guiar à final four da Taça da Liga, a estranha última quimera portista por conquistar.
2 - Não é fácil mudar o "chip" entre competições tão diferentes mas é nessa capacidade de, num ápice, adaptar-se a cada uma dessas realidades tão distantes (na dimensão) e tão próximas (no tempo) que se distingue o "poder de foco" do jogador que faz a diferença.
Gonçalo Ramos buscou entrar da mesma forma no onze benfiquista mas a equipa em muitos momentos não seguiu essas suas pistas. Estava no momento certo para cumprir a formalidade do ponta-de-lança e marcou mas a equipa não funcionou da mesma forma total durante todo o jogo contra um onze de II Liga com competitividade de primeira, o Moreirense de Paulo Alves (onde gosto de ver Franco a crescer a meio-campo e custa-me perceber que clubes maiores não vejam o bom n.º 9 que é André Luiz).
3 - Gostei de ver Chiquinho a pegar no jogo como espécie de "n.º 8 livre". Não é um jogador fácil de perceber. Sempre lhe reconheci qualidade. Mas sempre lhe senti hesitações para subir com a confiança e intensidade certas, o degrau para mostrar o mesmo num nível superior. Voltou a pisar as "quatro linhas caixa de fósforos" de Moreira onde se mostrara e como que resgatou esse nível.
Percebe-se que Roger Schmidt gosta de coisas nele mas não é fácil metê-lo na equipa. Aquele espaço tem mecanização Florentino-Enzo e o sistema não contempla um "10" no sentido tático. Aursnes pode ser o tal falso ala para completar o meio-campo indo dentro em jogos taticamente mais exigentes, mas em posse o onze perde largura ofensiva com ele descaído num flanco.
Talvez Chiquinho pudesse, num jogo de conflito e recuperações (como foi este) encontrar mais espaço nessas estradas de "fora para dentro".
4 - Fugir a zonas de conflito do jogo não é para todos. Cada vez mais o n.º 8 é um jogador militarizado na exigência de estilo. Quem souber melhor levar o jogo para outros territórios de estilo já começou a mandar no jogo. Eis uma razão porque Otávio é "rato". Encontra pedaços de queijo (perdão, de relva) onde mais ninguém vê.
Mercado? Conhecer jogadores
Não espero um mercado de inverno muito agitado a nível nacional (o internacional, no pós-Mundial, será muito diferente). No nosso espaço, talvez os grandes aproveitem para afinar algumas posições, colmatando lacunas que vêm já desde o início da época. Mas onde vejo estes momentos mais importantes (na possibilidade de fazer receitas) e delicados (no perigo de perder jogadores mais importantes) é para os clubes da chamada gama média-baixa. Em rigor, penso mesmo que para este tipo de clubes terem saúde financeira capaz de ir competindo contra outros de nível orçamental bem superior, eles não podem falhar uma janela de mercado. Isto é, sempre que possível fazer negócio (e tentar de imediato reinvestir proporcionalmente) para ganharem financeiramente e projetarem forças de investimentos (em jogadores, como o vendido, visto antes dos outros a preço/negócio acessível).
É, naturalmente, uma ginástica de gestão política desportiva-financeira difícil de fazer. Exige poder de visão de gestão a, pelo menos, médio prazo e visão astuta de prospeção de valores. No fundo, saber manejar (cruzando as duas entradas do mesmo edifício, a financeira e a desportiva, do clube) e conhecer a matéria-prima do futebol: os jogadores.