PASSE DE LETRA - Opinião de Miguel Pedro
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António Salvador veio, em grande entrevista a uma televisão, falar sobre aquela que é a estratégia seguida pela administração da SAD bracarense para a gestão do futebol profissional.
Uma entrevista curiosa e esclarecedora e que revela, afinal, aquilo que já referi em várias crónicas anteriores: a grande dificuldade que existe em articular a gestão financeira de uma sociedade comercial com a vertente da gestão desportiva, da estrita competitividade dos plantéis que, época após época, são construídos.
Há muitos anos, estava eu no Conselho de Justiça da FPF e discutiam-se as primeira leis sobre as sociedades anónimas desportivas, um grande jurista e pensador afirmou que as sociedades desportivas seriam uma espécie de anacronismo, algo fora da sua época: como sociedades comerciais, teriam como objeto o lucro e a criação de mais valias para os seus acionistas, numa atitude típica de qualquer entidade capitalista; como entidades de gestão desportiva, o objetivo seria ganhar jogos e títulos, num espírito de associação cívica, dos antigos "clubes".
Afirmou, concluindo, que nem sempre estes dois objetivos poderiam coincidir numa estratégia de gestão e essa tensão, que se espelha na dicotomia acionista-adepto, seria algo que acompanharia sempre a gestão deste tipo de entidades societárias desportivas.
Estas palavras mostraram-se proféticas e a entrevista de Salvador revelou isso mesmo. Percebo bem muitas das preocupações que o presidente Salvador revelou e penso que, conceptualmente, a aposta na formação (que atualmente tem uma estrutura de excelência, com uma organização exemplar e resultados que estão à vista de todos) como criação de mais valia simultaneamente acionista (permitir venda de ativos) e competitiva (municiar a equipa principal com jogadores da formação) é o caminho certo para uma SAD com o contexto da SAD bracarense.
Ainda que, por vezes - como acontece esta época (e aqui discordo de Salvador) - o plantel principal fique desequilibrado nos vários setores (entre transferências e lesões) e se torne, na minha opinião, um dos menos "competitivos" dos últimos anos.
Por isso, admiro ainda mais o trabalho de Carvalhal, que consegue, ainda assim, garantir resultados globais bem aceitáveis (e neste particular a defesa do 4º lugar será o ponto de honra).
Além disso, esta situação tem vindo a ser compensada com uma entrega total dos jogadores, que se tem revelado profissionais de elevada estatura, num plantel onde a sua abnegação reforça o espírito de equipa. Foi o que sucedeu no jogo de ontem, que revelou, apesar de esforçada e merecida vitória, alguns dos deficits do plantel, que tem hoje em dia algumas deficiência no jogo exterior, pelas alas (agravadas pela saída de Galeno), e que se vê obrigado a reforçar e a apostar no jogo interior, nas entradas pelo miolo da defesa contrária, com a solução de Vitinha e Abel Ruiz a ser a que, desgastando as marcações adversárias, melhor consegue abrir espaços de finalização.
Mas fica a nota, acima de tudo, da coesão e da amizade entre todos os jogadores bracarenses, bem plasmada na forma como se festejou o segundo golo de Ricardo Horta