Nuno Resende, bicampeão em Itália: "Tenho muitas marcas na cara de bolas que apanhei"
Nuno Resende sagrou-se bicampeão de Itália e foi o primeiro a fechar a final do play-off (à melhor de cinco) em três jogos. O treinador, que está há três épocas em Itália e há duas no Lodi, tendo há um ano terminado com um jejum de 36 anos, bisou agora com dois registos inéditos: título ganho em casa e em final resolvida em três jogos
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Nuno Resende, treinador do Lodi, conquistou pela segunda vez consecutiva o título em Itália, após três vitórias sobre o Forte dei Marmi (campeão de 2013/14 a 2015/16) numa final do play-off à melhor cinco, algo inédito na Serie A1. Quando, em 2015/16, Nuno Resende chegou a Itália foi treinar o Matera e com uma equipa modesta atingiu as meias-finais do play-off da Serie A1 e as meias-finais da Taça de Itália, chegando ainda à final-four da Taça CERS. Em 2016/17, transferiu-se para o Lodi, onde foi campeão e ganhou a Supertaça. Agora, aos 42 anos, repetiu o título.
Segundo ano à frente do Lodi, segundo título consecutivo: como olha para esta época?
Conseguimos quebrar de ciclo do Forte dei Marmi. Foi completamente merecido, depois de um ano difícil, em que entraram muitos jogadores novos. Com uma equipa mais jovem fomos ganhando resistência e fizemos um grande play-off.
Como foi resolver a final em três jogos depois de uma meia-final superada na negra frente ao Viareggio de Reinaldo Ventura?
Ganhar o primeiro jogo desbloqueou muita coisa, depois em casa sentimo-nos mais tranquilos. A tensão e as dificuldades que nos colocaram o Viareggio foram muitas e, até certo ponto, mais complicadas. Nas meias-finais, depois de quatro jogos muito duros, tivemos um quinto jogo de excelência o que aumento mais os níveis de confiança.
Como foi a festa?
Lodi é uma cidade maluca por hóquei e o pavilhão estava fantástico. Foi um orgulho enorme dar-lhes o primeiro título em casa, mas depois de jantar foi recolher a casa. A festa é para quem merece, que são os jogadores, e também é dos adeptos. Eu já estou direcionado para a pré-época, porque não podemos deixar-nos ultrapassar pelos adversários, senão somos engolidos.
O que foi decisivo neste título?
A qualidade com que jogámos a parte final, com muitas soluções e preparados para qualquer situação, em que fomos fortes emocionalmente e estivemos prontos para a pressão, o que provou a qualidade das apostas que fizemos.
Continua a gostar do play-off?
É um modelo interessante do ponto de vista desportiva porque há níveis de adrenalina elevados, mas não deixa de ser muito desgastante com enorme exigência do ponto de vista da gestão física e emocional.
Quais foram os momentos mais marcantes?
Além da final e da "negra" na meia-final, pois aí, de certa forma, se jogava toda uma época, foi marcante não termos conseguido a Supertaça e Taça de Itália. A Liga Europeia também foi amarga, embora o grupo fosse muito difícil, e a equipa tenha crescido e se tenha tornado na equipa que é hoje.
Luís Querido e Gonçalo Pinto deixaram a sua marca no jogo da final. Foi especial também por isso?
Foram importantes e confirmaram o que se esperava deles.
Querido fica, mas Gonçalo Pinto sai para o Valongo e também perde Giullio Cocco para o FC Porto. O que levam eles aos clubes portugueses e o que representam para si estas saídas?
O Gonçalo é um jogador em evolução e dará intensidade aos ritmos que o Valongo gosta de imprimir. O Cocco chega a uma equipa trabalhada, com qualidade, e terá de ter paciência para ganhar preponderância na equipa, o que não será fácil mas que ele pode conseguir porque é de uma enorme disponibilidade e trabalha muito para a equipa. Sem eles, teremos de mexer na equipa, mas com tranquilidade. A pressão existirá sempre e será positiva, temos de manter os mesmos parâmetros.
"O Cocco chega a uma equipa [FC Porto] trabalhada, com qualidade, e terá de ter paciência para ganhar preponderância na equipa, o que não será fácil"
Como resume estes seus três anos em Itália: primeiro no Matera, depois no Lodi?
Sinto-me feliz com a minha evolução e os resultados dão consistência ao trabalho, o que me deixa satisfeito, porque na verdade estamos sempre sujeitos a essa chancela das conquistas.
Pensa no regresso a Portugal?
Para já, sim porque no dia 29 vou passar férias com a família. Mas não está presente no meu dia a dia. Encaro as coisas com tranquilidade. Algum dia hei-de regressar. Estou contente em Itália, focado e motivado no Lodi. Vejo o campeonato português como adepto e se algum dia tiver a oportunidade de voltar será um prazer.
Mais apaziguados com os adeptos?
As coisas a cada ano estão melhor. Na final foi um apoio extraordinário. Há sempre uma franja de adeptos que tenta encontrar motivos para estar em desacordo com opções, mas o importante é realçar que 90 por cento da cidade está connosco e neste play-off mostraram que a cidade de Lodi e a equipa é um só.
Não passar a fase de grupos da Liga Europeia foi uma desilusão?
Alguns jogos aconteceram demasiado cedo para nós. Não tínhamos ainda maturação individual nem coletiva. Na segunda volta, com a vitória em casa com Sporting e o empate na Corunha já estávamos melhor. Foi amargo porque o Liceo da Corunha e o Sporting estavam noutro patamar, mas nós com mais tempo daríamos outra resposta. Hoje em dia, há um grupo de elite muito forte e nós para estarmos nos quartos tínhamos de estar, em novembro, com outras capacidades. Temos de ter mais felicidade no sorteio.
A Liga Europeia será, em 2018/19, o objetivo principal ou será o tri?
O mais importante é o campeonato, mas todas as provas são importantes, como a Taça de Itália que nunca consegui ganhar. Na Liga Europeia temos de ver sorteio e claro apontar aos quartos de final.
Como viu a final-four do Dragão?
No FC Porto-Sporting, o fator casa foi decisivo para o desenrolar do jogo. A final acaba decidida na competência das bolas paradas. O Barcelona soube controlar o jogo frente a um FC Porto forte até ali, que parecia ser ali que ganhava, mas não concretizando bolas paradas, o Barcelona, com qualidade individual e coletiva, acabou por ganhar.
O que pensa da época falhada por parte da Oliveirense e o que prevê na luta pelo título?
A Oliveirense começou bem a ganhar a Taça Continental, mas a dada altura algo não funcionou e isso prolongou-se demasiado tempo. Pode acontecer e é difícil que os quatro candidatos mantenham sempre os mesmos níveis de excelência. Nas três jornadas que faltam prevejo algo espetacular com luta até ao fim. O Benfica tem algo a seu favor porque joga com o Sporting na qualidade de anfitrião, mas o grau de dificuldade é elevado. O Sporting tem tudo na mão, basta-lhe ganhar os três jogos. FC Porto e Sporting terão de ter uma grande determinação.
Acha que a instabilidade no Sporting pode afetar a equipa de hóquei em patins?
Não sei, parece que a equipa está bem. Uma equipa que tem como objetivo ganhar um campeonato e está em primeiro a três jornadas do fim tem de estar tranquila e confiante.
Como antevê o Europeu depois de Espanha ter ganho o Mundial na estreia de Alejandro Domínguez?
Uma análise mais concreta só será possível após a divulgação das convocatórias. No ano passado, com a rotura operada por Espanha ficou-se na expectativa mas teve frutos. Creio que Portugal irá mudar algo. O treinador talvez aproveite para rejuvenescer e mudar um pouco a estrutura da equipa. Itália não deve mudar muito. França continua em evolução e já tem jogadores que ganharam a Taça CERS pelo Lleida e com pódio na Taça Latina.
Como vê a ida de João Rodrigues para o Barcelona?
A ser verdade é um jogador que tem muita qualidade e capacidade para jogar em várias posições, muita experiência e que vingará. Não há dúvidas sobre o valor do João.
O que pensa sobre a discussão em torno da segurança após acidente de André Azevedo?
O hóquei tem evoluído muito na velocidade do jogo e potência de remate. Merece uma reflexão profunda relativamente à segurança. Quem joga mais na zona de interior sofre muito com isso. Eu tenho muitas marcas na cara de muitas bolas que apanhei, mas na altura um ou outro jogador rematava com mais violência, hoje a velocidade é mais elevada. Aqui, em Itália, nas camadas jovens as proteções são obrigatórias. Em Portugal, se calhar, terá de passar por aí e depois mais tarde talvez avançar para os seniores. É muito mau para quem sofre, são momentos de grande angústia. Terão de ser também as equipas médicas dos clubes e federação a ajudar a fazer uma análise mais concreta e tornar o desporto mais seguro.
"O hóquei tem evoluído muito na velocidade do jogo e potência de remate. Merece uma reflexão profunda relativamente à segurança. Quem joga mais na zona de interior sofre muito com isso."
Após três anos em Itália sofre menos com saudades de casa?
Ter a família por perto nestes últimos meses foi fundamental. Continuo a sofrer com a distância da minha filha.
Com foi gerir a vida de treinador com muitos jogos e treinos enquanto se tornava pai de gémeos?
Com a ajuda da minha mulher e da minha mãe foi menos difícil. São noites mal dormidas, mas prefiro tê-los aqui. Lembro-me perfeitamente ter chegado a casa nas duas derrotas com o Viareggio e mal os via, sorria logo. Naqueles momentos mais difíceis foram um fator motivacional muito forte.
Acompanha o que faz a equipa da sua terra, Sanjoanense, agora com o seu irmão no comando técnico?
Claro, vamos ver se ele consegue subir à I Divisão. Já que este Resende não está lá, que seja ele a estar [risos].