"No Benfica encontrei um presidente verdadeiramente interessado pelas modalidades"
Norberto Alves vive a segunda passagem pela Luz, assinalando, em entrevista a O JOGO, que as diferenças de 2004 para o presente são enormes. Entusiasmado com a ideia de comandar uma equipa lusa na Europa, depois de já ter sido campeão africano, Norberto Alves regressou às águias e faz um balanço positivo dos primeiros tempos.
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Ao fim de quatro temporadas na Oliveirense, o técnico de 53 anos ponderou o estrangeiro, mas voltou à Luz. A O JOGO, falou dessa mudança e, como a conversa foi na antecâmara de mais um ciclo infernal de jogos - podem ser 10 durante um mês, dependendo do que acontecer na Taça Hugo dos Santos -, o líder dos encarnados insistiu na necessidade de haver ajustes futuros do calendário, para que os clubes portugueses o conciliem melhor com os jogos europeus.
Como estão a ser os primeiros meses no Benfica?
-É uma adaptação fácil. Já conhecia algumas pessoas que estavam no clube, mas é um Benfica muito diferente do que conheci há muitos anos. Quando vim a primeira vez, não havia pavilhão. Estava a ser construído o Complexo da Luz e o basquete andava com a casa às costas. Encontrei um clube extremamente organizado, um presidente, Rui Costa, verdadeiramente interessado pelas modalidades, de falar com os jogadores e ir ao meu gabinete saber o que é preciso. É um clube muito diferente e eu também. Está a ser uma experiência muito interessante.
O que o convenceu a voltar?
-No último ano na Oliveirense senti que um ciclo se fechava. Também havia muito esforço físico da minha parte, fazer todos os dias a viagem Coimbra-Oliveira de Azeméis. Pensei realmente em mudar. A ideia era mudar para o estrangeiro. Surgiu o convite do Benfica que, logo à partida, nos faz pensar. E eu gostava de jogar com uma equipa portuguesa na Europa. Quando me abordaram, tentei esclarecer essa hipótese. Foi um argumento importante para vir.
Que balanço faz da experiência europeia?
-Possivelmente temos de refletir sobre a grande densidade competitiva das equipas portuguesas que estão na Europa. É preciso haver diálogo e tomar algumas decisões, como começar mais cedo o campeonato, no início de setembro, ou mudar o formato. Andamos a fazer uma média de nove jogos por mês e podemos chegar os 72 em oito meses. É um exagero e, em última análise, coloca a integridade física dos jogadores em causa.
Como trabalham neste ciclo infernal?
-Não há semanas iguais. Em alguns indicadores, nota-se, claramente, cansaço. Queremos estar na Europa, mas com hipóteses de sucesso. Na Liga, somos a equipa que mais pontos marca, a segunda melhor defesa, a equipa com mais assistências, mas temos de controlar melhor a bola e perceber porque vamos tão pouco à linha de lance-livre. Temos de melhorar estes detalhes, mas realizamos muitos treinos de recuperação. São treinos de baixo volume e perde-se qualidade. Quando acabar a época deve haver diálogo entre clubes, federação, treinadores e até os próprios atletas, que são o mais importante do jogo. Tem de se encontrar um equilíbrio.
Alimenta o sonho de ganhar uma prova como a FIBA Europe Cup, depois de já ter sido campeão africano?
-Tenho esse sonho. Começámos mal a segunda fase, mas disse aos meus jogadores que nós não participamos em nada por participar. Nós somos o Benfica. Passar esta segunda fase seria inédito para qualquer clube, mas nós, o Sporting e FC Porto provámos que nos podemos bater com essas equipas e vencer. Fomos a primeira equipa portuguesa a ganhar na Rússia. O Sporting ganhou pela primeira vez a uma equipa polaca. O FC Porto teve muito azar em não se qualificar. As equipas estão a jogar com muita dignidade, a mostrar que temos valor, sabendo que os investimentos que se fazem lá fora são enormes. Os sonhos comandam a vida: ninguém sonhava que a Académica fosse vice-campeã nacional, que a Oliveirense ganhasse dois campeonatos, que o Libolo fosse campeão de Angola e de África. A minha vida tem sido feita à base dos sonhos e de querer conquistá-los.
Quando começou na Oliveirense, disse aos jogadores que iam ser campeões no primeiro treino. No Benfica houve alguma mensagem dessas, ou fica para contar mais tarde?
-O meu perfil dominante de liderança é de coaching, de ajudar os atletas a descobrir o caminho. Portanto, disse-lhes a mesma coisa: "Estou aqui para vos ajudar a ganhar". Espero vir a celebrar com eles. No dia a dia, tenho muita alegria no processo de treino, de ir treinar, de estar com eles, de resolver problemas, de fazê-los sentir a importância de colocarem os objetivos da equipa à frente dos individuais. Gosto muito desta perspetiva de os ajudar. O tesouro dos treinadores são os jogadores.
"Somos uns privilegiados por estar nestes jogos"
Até 9 de fevereiro, o Benfica vai defrontar o Sporting pelo menos três vezes, duas para a Europa. Mas Norberto Alves alivia a tensão para esses jogos, numa resposta inspirada no discurso recente de Sarunas Jasikevicius (treinador do Barcelona): "Queremos vencer, o nosso adversário também. É um privilégio poder ter estes dérbis e sentir a pressão. É uma pressão positiva, em tempos difíceis em que houve pessoas que perderam o emprego. Essas pessoas é que têm verdadeira pressão. Nós somos uns privilegiados, por fazermos aquilo de que gostamos e estarmos nestes jogos".