Leonel Fernandes tem 23 anos, é ponta-esquerda e brilha no FC Porto e na Seleção. Superou a fase em que queria abandonar e gosta de jogar fora, "com o público pela outra equipa"
Corpo do artigo
Foi nas férias desportivas da Maia que, aos 9 anos, descobriu o andebol. A meio do caminho quis desistir, já mudou de posição e leva 15 internacionalizações A e 21 golos, sete deles na Hungria.
Leonel Fernandes, de 23 anos, é dos jovens portugueses de maior talento e em Budapeste tem impressionado. Leva sete golos em outros tantos remates, num deles disparou a 120 km/h e fez o quarto sprint mais rápido do Europeu, atingindo os 8,69 m/s. O JOGO conversou com o ponta portista, que se deu a conhecer melhor.
Como surgiu o andebol na sua vida?
-Tinha 9 anos e os meus pais inscreveram-me num campo de férias desportivas da Maia. Lá experimentamos diferentes desportos, um deles o andebol. Logo no início do exercício, um simples passe e remate, fui chamado à parte; até pensei que tinha feito algo mal.
E fez?
-Não. Pelo contrário, queriam levar-me para o andebol, para experimentar a sério. Havia a possibilidade do Santana e do Águas Santas, mas, depois de conversar com os meus pais, optámos pelo ISMAI, que ficava mais perto de casa. Desde aí percebi que tinha capacidades.
Depois, ainda cedo, surgiu o FC Porto?
-Sim, nos juvenis tive proposta do FC Porto. Estive lá três épocas, andava no 10.º ano nessa altura. Estive nos juvenis no primeiro ano, com o professor Graça, depois nos juniores e seniores B. A seguir voltei para o ISMAI. Fiz lá mais dois anos, mas durante o segundo voltei ao FC Porto, já para os seniores.
Nesse percurso mudou de central para ponta...
-Comecei a jogar na primeira linha, a central, lateral, e até jogava bem, entendia-me com o pivô. Até que, a certa altura, nas seleções, como era magro e rápido, sugeriram que jogasse à ponta. Passei a jogar nos clubes na meia-distância e nas seleções na ponta.
Foi uma mudança difícil?
-Ir para ponta foi uma batalha, mas agora sinto-me grato por ter sido aconselhado a isso pelo Nuno Santos e estou confortável. Agora é a minha posição.
É verdade que o Leonel pensou desistir?
-É verdade. Foi na altura em que voltei para o ISMAI. É interessante poder falar nisto, porque creio que acontecerá a muitos jovens. Não será falta de maturidade, mas aos 16/17 anos temos vontades, que não estão bem nem mal, são apenas vontades, naquela idade não há certos nem errados. Comecei a sentir que o desporto ocupava a maioria do meu tempo livre, via os meus amigos a passear, a divertirem-se e comecei a colocar o andebol em segundo plano. Os meus pais ajudaram-me a não desistir.
Tem noção do momento em que reconsiderou?
-Não foi um momento, foi um conjunto de situações, dentro e fora de campo, que me levaram a reconsiderar e a achar que o andebol seria uma boa opção. Percebi que o andebol era um investimento. Poucos atletas têm essa sorte e eu, com 9 anos, sem saber, já estava a investir nesta carreira.
Desistir nunca mais lhe passará pela cabeça?
-Não. O tempo das dúvidas já passou.
Leonel dentro de campo é muito diferente da pessoa fora dele?
-Sou uma pessoa tranquila, mas sempre fui bastante competitivo, sempre quis ser o mais rápido, o que saltava mais alto, isto um pouco incutido pelo meu pai. Sempre senti isso em mim e, na competição, gosto dos momentos de maior pressão. O jogo é uma hora, mas é uma hora muito intensa, estamos em campo super concentrados e, tendo entrado nesse estado, não existe mais nada à volta. Isso é uma das coisas que mais adoro. O mundo fora não existe, o foco é total. Acaba por ser uma libertação da mente, tem a ver com a adrenalina.
Quando recebe uma bola e tem o caminho livre para o contra-ataque, o que pensa?
-Correr, ninguém me conseguir apanhar e marcar golo. Mas na cabeça nem se passa nada, simplesmente estamos em modo de execução.
O Leonel diz que adora os momentos de pressão. Pode explicar melhor?
-Dá-me muito mais prazer jogar fora. Adoro jogar fora, para ter o público a apoiar a outra equipa. Tanto na Seleção como no FC Porto já tive jogos desses. Claro que também gosto de jogar em casa - já tivemos jogos incríveis e festejar com o nosso público é muito bom -, mas ir à casa dos outros, ganhar à França em França, por exemplo, é algo que adoro.
"Tive um crescimento gigantesco no FC Porto"
"O FC Porto é um clube que me preenche por completo. É curioso porque ainda há dias estava a pensar nisso. Cresci tanto como atleta e como pessoa... Quem eu era há quatro anos e quem sou agora, tive um crescimento gigantesco", reconheceu Leonel Fernandes sobre os azuis e brancos, pelos quais já disputou uma final-four da Taça EHF e está a jogar a terceira Liga dos Campeões. "Quando estou a jogar penso em alcançar coisas, mas sem grande pressão. Se tiver de ser vai ser, só tenho de fazer o meu trabalho", filosofou "Leo".
"Pesca é passatempo que limpa a cabeça"
Pescar é o passatempo predileto do ponta-esquerda do FC Porto e da Seleção.
O Leonel é pescador. De onde veio esse gosto?
-Desde pequeno, e também é "culpa" do meu pai, que eu, de uma maneira muito inocente, tenha a cena da pesca, de ir apanhar uns peixinhos. Acaba por ser uma parte interessante do verão: viajar, conviver, tudo isso faz parte da pesca.
Com o que partilha no Instagram percebe-se que, depois de pescar, brinca um pouco com o peixe e o devolve à água...
-Faço isso pela maneira como olho para as coisas. Podemos olhar para um peixe como alimento ou como um ser vivo, que tem o seu percurso de vida e deve ser respeitado. Por isso os devolvo à natureza. Mas gostava de dizer mais uma coisa, posso?
Claro, Leonel...
-Já que tenho esta oportunidade, gostava de falar da importância de se ter um passatempo, algo que nos ajude a distrair, a limpar a cabeça e deixar a noção do quanto isso ajuda no equilíbrio da nossa vida. Tudo o que gastamos em nós, seja tempo, seja dinheiro, desde que nos traga coisas positivas tem de ser visto como um investimento. Quero apelar a todos para que tenham essa energia, que acrescentem isso à vida.