37.º aniversário d' O JOGO - Num jogo da Seleção para menores de 18 anos, acertaram-lhe em cheio num tornozelo. Nunca conseguiu recuperar bem
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A 20 de abril de 1993, no Jamor, Portugal defrontava a Rússia no apuramento para o Europeu de sub-18, a disputar três meses depois em Inglaterra. E um nome emergiu nessa partida: Adriano, avançado de 18 anos do Benfica que apontou os dois golos do triunfo português por 2-1. "O Adriano tinha uma qualidade técnica impressionante com a bola nos pés. Não tinha medo nenhum de ter a bola e dava sempre solução às jogadas. Também era forte fisicamente e aguentava bem o choque", explica hoje Rogério Matias, autor das duas assistências para os golos dos portugueses.
"Rompi um menisco.Era para parar mês e meio e acabaram por ser quatro meses"
Na segunda mão, Adriano não conseguiu destacar-se da mesma forma, mas Portugal aguentou o nulo em Ryazan, assegurando o apuramento para a fase final. "Houve um penálti contra nós já perto do fim e, se os russos marcassem, éramos eliminados. Mas o Paulo Morais defendeu e Portugal foi ao Europeu", conta Matias a O JOGO. "Lembro-me que foi um jogo bastante duro. Os russos batiam em tudo o que mexia", acrescenta.
Um pormenor que viria a marcar Adriano. Para sempre. "Nesse jogo levei uma pancada tão forte no tornozelo que ainda hoje me impede de correr. Foi numa jogada para penálti, não assinalado, e provocou-me uma lesão que me obrigou mais tarde a deixar o futebol. Ainda joguei várias épocas, mas estava sempre a sofrer entorses de repetição. Numa época era capaz de ter esse problema umas quatro ou cinco vezes", explica o antigo jogador, hoje com 47 anos.
"O Sérgio tem uma vontade férrea de vencer, o que já o distinguia naquela idade", comenta agora o avançado, reconhecendo no portista uma sede cons"Querer ser melhor dia após dia. Isso é difícil, mas é uma caraterística que ele tem e que é importante."
A lesão não seria a única razão para a carreira de Adriano ter entrado numa direção oposta à que se previa. O primeiro sinal ocorreu até antes desse jogo na Rússia, quando começou a duvidar se era ao futebol que queria dedicar o resto dos seus dias: "Pelos 17 anos, tive uma fase de alguma saturação. Tinha dúvidas se queria jogar futebol. Senti saturação dos transportes, de ir treinar, das viagens, da escola. Muitas vezes pensei em não jogar mais."
Depois disso, enquanto dois colegas nos juniores das águias foram chamados para a equipa principal, ele ficou para trás. "Disseram-me que eu era do mesmo nível do Pedro Henriques e do Nuno Afonso, mas não fiquei. A verdade é que eles eram mais focados e tinham a consistência que era necessária." A solução encontrada foi um empréstimo, ao Portimonense, no caso. Só que a estadia no Algarve não jogou a seu favor. "Rompi um menisco. Era para parar mês e meio, mas acabaram por ser quatro meses. Além disso, gostava de me divertir. Não descansei aquilo que devia descansar. No Algarve tive uma fase de estrela de rock and roll. Tinha carro, casa, dinheiro... e 19 anos".
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A seguir foi emprestado ao Alverca, experiência que correu bem, mas depois foi operado a um joelho, teve problemas com um empresário e sofreu com o falecimento do pai. As águias não quiseram renovar e o V. Guimarães chegou a convidá-lo para fazer a pré-época de 1996/97, à experiência. "Fui de férias, mas depois perdeu-se a oportunidade. Em setembro, telefonei ao presidente do Portimonense e voltei para lá. Podia ter ficado na I Liga, mas fui parar à II B", diz, explicando que na primeira época já se sentia "limitado fisicamente". Na segunda o rendimento começou a cair e, depois disso, jogou sempre em escalões secundários, em clubes como Barreirense, Seixal ou Covilhã, entre outros. A despedida foi aos 31 anos, no Atlético do Cacém, mas há anos que estava a adiar o inadiável: "Nunca mais joguei a cem por cento. Foi sempre em sacrifício. Se treinava de manhã, já não conseguia treinar à tarde."
Lado a lado com Sérgio Conceição
No tal jogo do Jamor contra a Rússia, enquanto Adriano desequilibrava o jogo a favor de Portugal, um extremo veloz e aguerrido como poucos ia bocejando no banco de suplentes, à espera de entrar para poder ajudar a equipa. Um jogador que não suscitava tantas expetativas, mas que não mais parou de crescer, primeiro como jogador e depois como treinador, ao contrário do avançado benfiquista, que estava prestes a precipitar-se num trajeto descendente. Falamos de Sérgio Conceição, o atual treinador dos dragões, que, curiosamente, nasceu um dia antes de Adriano, a 15 de novembro de 1974. Mas as coincidências não se ficam por aqui. Isto porque a primeira chamada às camadas jovens da Seleção ocorreu ao mesmo tempo, na convocatória para o Torneio Internacional da Venezuela, em 1990, pelas mãos de Carlos Queiroz, que tinha sido campeão do mundo de sub-20 no ano anterior. Conceição foi o primeiro a estrear-se, frente ao Equador a 12 de agosto, "batizando-se" Adriano dois dias depois, contra o Brasil.
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"O Sérgio tem uma vontade férrea de vencer, o que já o distinguia naquela idade", comenta agora o avançado, reconhecendo no portista uma sede constante de evolução pessoal: "Querer ser melhor dia após dia. Isso é difícil, mas é uma caraterística que ele tem e que é importante." Adriano admite mesmo que, no caso dele, se passava o oposto. "Talvez me faltasse a ambição e o foco", reconhece, lamentando que ninguém lhe tenha dado os conselhos certos: "Naquela idade devia ter ouvido conselhos sobre higiene de vida, descanso, sono, factores importantes num atleta, em termos de reparação psicológica e física. Podia ter ouvido isso. Até porque alguém que não tem esses cuidados, que não tem uma boa higiéne de vida, está mais predisposto a aleijar-se."
Fisioterapeuta: Prazer em ajudar os outros
Adriano cedo percebeu que o futebol não seria o único destino profissional da sua vida e, aos poucos foi virando as atenções para a área da fisioterapia. Começou por ser massagista, no Barreirense, entre outros clubes, passando depois a ser fisioterapeuta, função que hoje exerce em parceria com uma dentista com quem casou. Numa clínica dentária das Caldas da Rainha, o antigo jogador tenta agora ajudar pessoas que sofrem de Disfunção temporomandibular. "Estou há nove anos nesta área e sinto que é uma vocação minha. Gosto muito de fazer as pessoas sentirem-se melhor", afirma.
Melhor do que Gonçalo Ramos
Rogério Matias acredita que, se fosse hoje, Adriano poderia ter ido bem mais longe na carreira de futebolista. "Ele teria sido um superjogador", defende, instado depois a compará-lo com um jogador da atualidade. "Talvez tivesse parecenças com o Gonçalo Ramos, mas era ainda melhor", afirma, abordando depois o lado humano do antigo colega de equipa: "Não era o protótipo da ideia que as pessoas têm sobre aquilo que é um futebolista. Era alternativo, tinha forte personalidade, lia muito e não gostava muito de falar. Mas era um jogador tremendo."
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