<strong>O JOGO - 35 ANOS || 2002 || A VÉNIA DE JOÃO VIEIRA PINTO </strong><strong>- </strong>Sporting vence campeonato, Taça e Supertaça, muito à conta das dúzias de assistências de João Vieira Pinto, que aqui recorda quem o descobriu para o futebol
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"O futebol não há de dar para todos, mas os laços ficam" e Alcindo Marques cuida das duas vertentes, já lá vão mais de 40 anos na formação do Boavista. Com seis bolas e 15 dias no Algarve, segurou João Vieira Pinto.
João Pinto retribui afeto àquele a quem, ainda menino, disse um dia: "Eu vou ser jogador!"
A porta 1 do Estádio do Bessa conduz a um gabinete onde se acomodam passado, presente e futuro do Boavista. Entre troféus do futebol de formação, galhardetes dos jogos europeus da era do xadrez campeão de Jaime Pacheco, imensos papéis do quotidiano das 12 equipas das camadas jovens e atrás de um computador portátil está o "senhor Marques das escolinhas".
Alcindo Marques tem 72 anos, mas isso pouco ou nada importa, porque ele é o mesmo, ano após ano, vai para 41 anos de trabalho com os mais novos. Em tempos, foi ele quem levou João Vieira Pinto para o clube, a troco de "seis bolas" para o Águias da Areosa e à boleia da "azia" de cinco golos do miúdo ao FC Porto, nos quartos de final do campeonato de infantis.
Quando o Águias, modesto, pediu para treinar em casa dos dragões, não foi muito bem recebido. Alcindo Marques soube do episódio nas meias-finais, no Bessa, e aproveitou essa mágoa para sacar o que viria a ser o "menino de ouro" do Boavista, do Benfica, dos campeões do Mundo de Sub-20 de Riade e de Lisboa. A concretização do negócio incluiu também umas férias. "O Águias pediu para jogar por eles, no torneio do Académico. Avisaram-me que o FC Porto andava em cima dele e eu fui ao Bairro do Falcão falar com a Mãe dele, a ver se o deixava vir comigo 15 dias para o Algarve".
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A estadia, e depois um contrato precoce, "sem validade jurídica", mas útil para João Vieira Pinto ajudar a família com "cinco contos [25euros agora, bom dinheiro na altura] por mês", afastaram a concorrência. Marques manteve-se por perto. Saía do trabalho - foi chefe de escritório e depois programador informático -, deixava a esposa em casa e ia buscar os miúdos para o treino.
"João Pinto, o guarda-redes Tó Ferreira e o Abreu", recorda, ouviam-lhe os conselhos para "terem juízo", condição essencial para fazer carreira. João não se ficava: "Os outros ouviam. Ele dizia-me: "Ó sr. Marques, não duvide que eu vou ser jogador"".
Desde esse tempo, milhares de miúdos passaram pela formação do Boavista, que se estendeu ao Bessa Futebol Clube, no ano passado. Depois da entrada de campeão no século XXI, o xadrez foi ao fundo. Tenta reerguer-se todos os dias. "Estive sempre cá", diz Alcindo Marques, contente por ver a normalidade a regressar, com instalações melhoradas, a mesma vontade de crescer e de ganhar mais do que talentos.
Com um sorriso de miúdo, orgulha-se de cativar os boavisteiros mais novos para a bancada - porque "o futebol não há-de dar para todos, mas os laços ficam", lembra. Tem lugar no camarote presidencial, mas nunca lá pôs os pés. Gosta mesmo é de ficar na bancada da claque. É onde se vibra mais, garante, e essa é também uma lição que os miúdos aprendem rapidamente.
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