Miguel Ângelo, engenheiro informático, de 25 anos, sagrou-se bicampeão europeu de kung fu há poucos meses, na Geórgia, e existe nele um homem de punhos de urso. É o primeiro protagonista do espaço "Do sofá para o mundo", todos os domingos em O JOGO.
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Explica como é a modalidade celebrizada por Bruce Lee com um largo sorriso e nem parece o mesmo quando está no tapete a imitar os rugidos do urso, a ameaçar com valentes punhadas.
O kung fu português está em grande nível na Europa...
Portugal é quase um outsider. No nosso país, somos semiprofissionais, a federação tem poucos apoios, não temos um centro de treinos, nem infraestruturas e temos de treinar em diferentes tapetes. Em competição, os tapetes são diferentes - custam em média 15 mil euros - qual é o clube ou escola que consegue ter um tapete deste género numa sala exclusiva para a modalidade? No Europeu de 2015, éramos sete atletas, além do staff. A deslocação de um atleta pode custar até dois mil euros e nesse ano a federação custeou as despesas só aos três campeões da edição anterior, enquanto os restantes tiveram de pedir apoios.
O kung fu tem mais expressão do que aquela a que nos habituamos a ver nos filmes de Bruce Lee?
O Bruce Lee fez o boom do kung fu no Ocidente, com um estilo muito próprio, num modo um pouco cinematográfico. Há vários estilos, mais apelativos e estéticos para um determinado público, em relação ao que se espera ver nos pormenores de marcialidade. Aqui distingue-se o kung fu tradicional do moderno, este é quase considerado uma nova modalidade. O Bruce Lee inspirou-se no kung fu tradicional, retirando-lhe alguns movimentos de guerra e acrescentou-lhe acrobacias - mais focado na estética e não tanto na força.
Há assim tantas variações de estilos?
É uma arte marcial chinesa com diversos estilos oriundos de várias regiões da China. O que distingue o kung fu tradicional do de combate é a marcialidade com o objetivo de ferir para matar.
Para matar??!!
Antigamente, os povos chineses em situações de guerra engendraram técnicas defensivas e ofensivas a imitar os comportamentos agressivos de certos animais. O meu estilo é o choy lee fat, constituído por cinco animais - a minha performance é a do homem-urso. É uma forma exigente em poder físico e a aplicabilidade da força é muito mais realçada do que, por exemplo, a da serpente (caracterizada pela agilidade). Sendo mais bruto, o urso ataca de punhos fechados e ataca em gancho com alguma circularidade; já a serpente ataca as partes vitais, porque a força dela é muito menor, por isso tem de ser minuciosa na escolha do alvo a atacar. Já o urso não tem de preocupar-se com isso, basta-lhe um movimento colocado com a pata para atingir logo a cabeça, aniquilando o adversário. Também fiz a do tigre, antes de me lesionar. Nesse caso os movimentos são mais garras, com o propósito de rasgar os inimigos.
A escolha dos animais para o filme infanto-juvenil "Panda Kung Fu", pelos vistos, não foi por acaso.
É verdade. Já o filme "Karaté Kid" não tem nada a ver com o karaté: é em tudo kung fu. Além disso, o Jackie Chan, que faz a personagem do mestre, sempre praticou kung fu.
Por que será que escolheram aquele título?
Se calhar soa melhor do que "Kung Fu Kid", ou talvez por uma questão de marketing...Repito: aquilo não é karaté, é kung fu puro.