FORA DE JOGO >> É uma voz inconfundível da TSF, um "cantor" de golos como não há em Portugal. E se não nasceu para fazer relatos de futebol, andou lá perto, porque desde miúdo que os faz. Muito estimado pelos colegas de profissão pela sua simpatia e camaradagem, o jornalista João Ricardo Pateiro conta-nos como foi e como é.
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Quando é que percebeste que tinhas jeito para fazer relatos de futebol?
-Desde miúdo que faço relatos, embora na brincadeira, principalmente de jogos de matraquilhos, para a família, para os amigos, naquelas feiras populares... Recordo que os donos das barracas de matraquilhos não achavam muita piada que eu fosse para lá jogar com os amigos, porque a nossa mesa tinha uma grande concentração de pessoas, que deixavam de jogar nas outras mesas para irem ver os nossos jogos. Em miúdo ouvia relatos. Tinha um rádio muito grande que o meu avô me deu, ainda de válvulas. Ofereceram-me depois um transístor cor de laranja e ouvi milhares de hora de relatos. Os meus pais pensavam que eu estava a dormir e eu estava na cama a ouvir relatos.
"Em miúdo, tinha um rádio muito grande, ainda de válvulas, que o meu avô me deu. Ouvi ali muitos relatos de futebol"...
Como é que orientas depois a tua vida para a rádio?
- Foi um acaso. Sou de Vila do Conde e ai por volta de 1988, havia um Varzim-Rio Ave e faltou um relatador. Os meus amigos sabiam que eu relatava na brincadeira e nesse dia convidaram-me; foi o Filipe Gomes, que insistiu comigo. Fui fazer o relato, gostaram e fui ficando... até hoje.
Não torceste pelo Rio Ave nesse jogo?
-Não, recordo que a única critica que tive foi a de ter dado muita ênfase nos golos do Varzim... Fiz aquilo como ouvia nas rádios nacionais e as pessoas de Vila do Conde não gostaram muito...
Mas é difícil um jornalista meter de lado a sua cor clubística, que também a tens certamente (por cortesia não te pergunto...)?
-Tu também és jornalista e percebes o que vou dizer; fazemos diariamente um exercício emocional de distanciamento em relação às nossas preferências. Ao fim de muitos anos, essa paixão que tens de criança ou de adolescente fica muito diluída.
Qual foi o momento mais alto que tu relataste aos portugueses?
-Já me fizeram essa pergunta várias vezes antes de 2016 e a resposta nunca foi fácil... Até então tinha tido vários momentos fortes, desde Gelsenkirchen, Sevilha, adorei relatar a final da Taça UEFA em que o FC Porto ganhou ao Celtic, os grandes clássicos portugueses... Tinham sido grandes momentos, mas a partir do dia em que relatei o golo do Éder aos portugueses, na final do Europeu em 2016, esse passou a ser o momento da minha carreira.
A determinada altura começas a cantar os golos. O que é que te deu?
-A ideia não foi minha, foi do João Paulo Meneses que era meu colega na TSF, na altura, aí em 2011. Sugeriu-me marcar o momento do golo com uma canção. Passado um bocado entrei na redacção e cantei uma letra que tinha feito para o Falcão (a cantar), " Jogou, fintou e marcou de cabeça, Falcão não há quem te não conheça, és um goleador, fazes com que o Porto mais cresça"... A seguir a esse episódio na redação, fui fazer um jogo do FC Porto com o Villareal. A única música que levava era essa. Por coincidência, o Falcao fez um poker nesse jogo. Cantei aquela música quatro vezes. Foi sorte, porque não tinha mais nenhuma...
Qual foi o feed back?
-Foi muito bom, positivo. Claro que nem toda a gente gosta, mas é difícil fazer uma coisa fora da caixa que agrade a todos. Arrisquei muito, mas resultou bem.
Tens algum relatador que te inspirou?
-Há vários, desde o António Pedro, ao Costa Monteiro, que hoje é comentador na TSF, Óscar Coelho, o David Borges... Sei lá, acho que bebi um bocadinho de cada um. O Jorge Petestrelo, que tinha um estilo muito particular, muito espetacular. O Carlos Daniel , da minha geração e que era fantástico.
Na Visão de Jogo, programa que diriges na TSF, com o José Manuel Ribeiro e o Luís Freitas Lobo, qual deles é que te dá mais trabalho?
-(risos) São os dois impecáveis, gosto imenso de trabalhar com os dois. Acho piada porque eles é que se picam um ao outro, e é saudável. É um programa que me dá imenso gozo fazer.
É um programa limpo, fala-se mesmo só de futebol...
-Não passamos ao lado de questões mais polémicas, de arbitragens e outras, mas não ficamos uma hora a discutir um penálti...
És uma pessoa feliz?
-Muito. Estou muito bem com a vida. Ultimamente temos sido marcados por acontecimentos tristes de pessoas que nos deixaram, e que nos fazem pensar ainda mais em termos de viver cada minuto da nossa vida com intensidade. O Dito, o Vítor Oliveira, o Carlos Machado, o Neno, só para dizer quatro boas pessoas que nos deixaram de uma forma brutal, não foi uma doença, foi de uma forma súbita. Tudo isso me faz pensar. Se calhar, às vezes aborrecemo-nos com coisas que não devemos. Tudo isso me faz pensar que é muito bom darmos valor à vida.