Carlos Calado, que também foi recordista nacional dos 100 metros e detém ainda a segunda melhor marca de sempre (10,11s) atrás de Francis Obikwelu, considera Usain Bolt "um superdotado". Diz que do ponto de vista técnico e biomecânico, o jamaicano "dá 10-0 a qualquer um dos seus adversários" nos 100 e 200 metros.
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Nos Jogos Olímpicos de Sidney, em 2000, diz que foi atraiçoado pelos bicos dos sapatos, que, despregados da base, o deixaram no 10.º lugar da final. Carlos Calado nasceu em Alcanena, mudou-se para Leiria e vive agora em Coimbra, de onde está a acompanhar o Rio"2016. Em outubro, completa 41 anos.
Há quanto tempo deixou o atletismo?
Em definitivo, deixei em 2012. Voltei esse ano, porque o meu filho ia nascer e queria marcar a data com a ida aos Jogos Olímpicos de Londres. Ainda fiz os campeonatos de Portugal, mas sofri um arrancamento ósseo na bacia e tive de abandonar.
E desapareceu do meio...
Quem vive em Lisboa ou no Porto acaba por aparecer mais. Sempre que fui convidado para alguma iniciativa, aceitei, curiosamente mais em Espanha do que em Portugal. Mas também é verdade que tive de me concentrar em regressar ao mercado de trabalho. Foi difícil, mandava currículos, mandava, ia a entrevistas e nada. Ou era velho ou não tinha experiência.
A que acabou por se dedicar?
Ao ramo imobiliário. Fui descobrindo o meu caminho com a ajuda de alguns autarcas com quem eu tinha colaborado quando era ainda atleta profissional. Atualmente sou empresário por conta própria, trabalho com fundos de investimento na procura de imóveis, em Portugal e Espanha.
E gosta desta sua segunda vida?
Sim. É um desafio, igual ao desporto de alta competição. Para sermos os melhores, temos de ir à procura do que queremos. Durante toda a vida temos de estar a competir. Se não fizer mínimos, fico de fora [risos]. Não podemos ficar sentados à espera.
Ainda pratica desporto?
Agora faço caminhadas. Adoro andar a pé. Gostava de voltar a ter tempo para fazer mais qualquer coisa, mas neste momento tento estar o máximo de tempo possível com o meu filho, que está com quatro anos.
Não tem saudades do atletismo?
De treinar, não. Não tendo um objetivo, não me faz sentido.
Mas mantém-se atento?
Sou mais atento agora do que quando competia, na altura só queria treinar, treinar... Ainda há pouco assisti à prova dos 10 000 metros femininos, em que foi batido o recorde do mundo. E é giro como o meu filho fica quieto a ver atletismo na televisão. Atletismo e fórmula 1. Há pouco tempo, mostrei-lhe os vídeos de quando fui medalha de bronze nos Mundiais de Pista Coberta, no Pavilhão Atlântico, e nos Mundiais ao Ar Livre, no mesmo ano, no Canadá.
Desapareceu praticamente do atletismo, mas a verdade é que ainda é o recordista nacional de salto em comprimento, com 8,36 metros, feitos em 1997, há quase duas décadas. Mais quanto tempo espera tê-lo em seu poder?
Quem vai bater o meu recorde já nasceu, mas agora temos de dar tempo para crescer [risos]. A não ser que ocorra alguma naturalização, não acredito que algum português, nascido em Portugal, o consiga tão depressa.
Ainda é motivo de orgulho para si deter este recorde ou já se desligou destas questões?
Claro que sinto um enorme orgulho, até porque há 20 anos não tínhamos as condições que os atletas têm hoje. Como me orgulho de ter corrido 25 vezes os 100 metros abaixo dos 10,20 segundos.
Os atletas da atualidade continuam a queixar-se de falta de condições.
Vão queixar-se sempre, porque nunca passaram pelo que a minha geração passou. Agora, antes de irem treinar, estão mais preocupados em sintonizar as músicas para ouvir ou em colocar umas selfies nas redes sociais.
Parece um velho a falar...
[risos] Há alguns atletas em que acredito, dois deles estão nestes Jogos Olímpicos: a Patrícia Mamona e o Tsanko Arnaudov.
A nível físico, ressente-se agora dos anos na alta competição?
Sim! Nos joelhos e na coluna. Não havia literatura na altura, cometíamos muitos erros, no início só conhecíamos o trabalho dos russos e era carga, carga, carga! Só com o tempo fomos aprendendo que podíamos treinar com menos carga, mas de forma mais especializada a nível técnico, como faz o Nélson Évora, por exemplo, hoje em dia.