"O rali mais perigoso era o de sábado à noite: ir para os copos com os amigos"
Começámos a falar sobre futebol, de que Luis Moya foi comentador para uma rádio durante dois anos. Na véspera do nosso encontro, o seu Barcelona empatou com o Atlético de Madrid e Messi sofreu uma rotura muscular. "Sou do Barcelona mas admiro o Cristiano Ronaldo, porque tenta sempre ser o melhor", diz.
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Está em Portugal para participar nas "Racing Stories", que junta personalidades do desporto motorizado para partilharem histórias da sua carreira e de bastidores.
Gostei muito da ideia e gosto muito de Portugal. Os meus pais traziam-me de férias, em miúdo, vínhamos de carro até Sesimbra.
Foi no Rali de Portugal que se estreou ao lado de Sainz...
Tínhamos acabado de chegar a Portugal, em 1988, e o Carlos pergunta-me: "Sabes porque vamos ao Mundial? Porque eu vou ser campeão". Nunca me esqueci disto, olhei para aqueles olhos grandes que ele tem e vi que acreditava mesmo naquilo.
Ao fim de apenas dois anos, foram campeões do mundo...
Foi muito rápido. Em 1990, a Espanha não tinha ainda ganho nada no desporto mundial. Não havia um Nadal, um Alonso... E foi peculiar, porque ganhámos o campeonato em San Remo, ficámos alegres, festejámos, mas quando à noite fui deitar-me, pensei que não mudava nada. Só quando cheguei a Madrid e vi milhares de pessoas à nossa espera é que me dei conta do que era ganhar um Mundial.
Como é agora o seu dia a dia?
Sou embaixador da Volkswagen no Mundial de Rali, estou a fazer, com a Castrol, vídeos informativos para a internet, convidam-me também para falar em empresas sobre motivação e trabalho de equipa. Há uma coisa de que não gosto: tende-se a falar apenas no piloto e copiloto quando se ganha. Só se fala do mecânico ou do engenheiro quando erram. Ganhamos e perdemos todos, é o que tento transmitir.
"Naquela noite chorei muito, mas na semana seguinte já estávamos na Suécia a fazer provas para o ano seguinte."
Porque nunca foi piloto?
Sou muito competitivo, conduzo melhor do que uma pessoa normal, mas nunca iria conduzir como o Carlos Sainz. E o trabalho do copiloto fascina-me. É o melhor exemplo de trabalho de equipa: duas pessoas dentro de um carro a tentarem ser os mais rápidos do mundo. Além disso, tive a sorte de correr com Carlos Sainz que não é só um amigo, mas uma pessoa extraordinária.
Competiram juntos durante 15 anos. Há casamentos que duram muito menos.
É mais difícil do que um matrimónio. Num matrimónio, se tens um problema em casa, podes esconder-te na sala ou no WC. Num carro não há escapatória possível, estão os dois num espaço muito pequeno e há que resolver os problemas.
Mas deverá existir algum desgaste, não?
Tínhamos a sorte de ser totalmente diferentes e continuamos a ter uma relação fantástica.
Discutiam muito?
Uma vez tivemos dois dias sem nos falarmos, mas chegámos rapidamente à conclusão de que nos estávamos a portar como uns miúdos. Estamos num desporto de risco, que tem uma grande equipa por trás, que depende de nós, não podemos estar pegados.
É incontornável falarmos do episódio de 1998, em que perdem o título mundial a 500 metros da meta devido a um avaria no motor. Há imagens em que se vê o Carlos Sainz, furioso, a bater com o capacete no vidro do carro.
Era eu [risos]. Ficou famosa a minha frase: "Trata de arrancarlo, por Dios". Tudo na vida tem algo positivo, o importante é ter vontade de vê-lo e eu encontrei a parte positiva daquele momento.
"É mais difícil do que um matrimónio. Num matrimónio, se tens um problema em casa, podes esconder-te na sala ou no WC. Num carro não há escapatória possível"
Qual foi?
Tentar alcançar o objetivo, mesmo quando estava a ver que o motor não ia funcionar eu disse "trata de arrancar", ainda que soubesse que não íamos conseguir.
Quanto tempo demorou a ver esse lado positivo?
Naquela noite chorei muito, mas na semana seguinte já estávamos na Suécia a fazer provas para o ano seguinte. Foi a 25 de novembro de 1998 e desde esse dia não há ninguém que, pelo menos uma vez por semana, não me lembre disso. A sorte é que sou positivo, senão já me tinha atirado por uma janela [risos].
Sentiu-se muitas vezes com a vida em perigo?
Nunca. Não há muitos acidentes graves, penso que andar de bicicleta na estrada é muito mais perigoso. Tenho medo da morte, porque não sei o que há depois, mas não de morrer de carro. O rali mais perigoso do mundo era o rali de sábado à noite: quando saía com os amigos para beber uns copos e fazia o que não devia!