No tempo livre, o médio do Rio Ave dá palestras de borla sobre a gestão das carreiras desportivas. Tarantini acha incrível como a maioria dos jogadores jovens é tão despreocupada em relação ao seu futuro. Quer pô-los a estudar e a fazer um pé de meia
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Passou pouco mais de um mês desde que apresentou publicamente o projeto "A minha causa" e, depois disso, reuniu-se com alguns potenciais parceiros e assegurou a realização de um minidocumentário piloto sobre o tema. Tarantini, capitão do Rio Ave, quer alertar todos os desportistas para a necessidade de assegurarem o futuro, em termos ocupacionais e financeiros, quando terminarem as suas carreiras.
Vi no seu site "tarantini.pt" que, este mês, deu duas palestras, numa escola de futsal e numa escola básica e secundária.
Já tenho outras duas marcadas para novembro, uma no Porto, outra em Lisboa.
De que fala nas palestras?
Falo do meu trajeto pessoal, do trajeto de colegas de profissão, apresento dados internacionais. No fundo tento que percebam o quão importante é pouparem dinheiro e garantirem qualificações que lhes permitam continuar no mercado de trabalho após o fim das carreiras desportivas. É incrível a despreocupação dos jovens pelo futuro.
Diz isso com que base?
Pelo que vejo e ouço. Os jovens hoje pensam que vai ser muito fácil, todos pensam que vão chegar ao sucesso e aos milhões de euros, mas o cone é muito estreito. Alguns acham que lhes dou sermões, mas a minha mensagem não é negativa, é a realidade! Devem sonhar, é legítimo terem o objetivo de serem profissionais de futebol - eu também o tive -, mas devem ter uma retaguarda, pois quando deixarmos de jogar já ninguém vai querer saber de nós.
No seu caso, o que fez para assegurar esse futuro?
Optei pela formação académica. Tenho um mestrado em Ciências do Desporto, o nível II do curso de treinador e quero fazer ainda um doutoramento. Quando pendurar as chuteiras, quero ser capaz de dizer "estou aqui"! É muito importante passar esta mensagem agora, enquanto apareço nos jornais e nas cadernetas de cromos. Quando deixar de jogar, vai perder muito impacto.
Está com 33 anos. Pensa jogar até que idade?
Jogo enquanto fizer sentido para mim. Não tenho nada definido.
Acha que tem conseguido passar a sua mensagem?
Quero acreditar que sim, mas preciso de parceiros de maior envergadura, capazes de fazer este projeto crescer. Já tive uma reunião no Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ). É muito difícil entrar no futebol com este objetivo. É impensável um Benfica, um Sporting, um FC Porto ou até um Tondela convidarem-me para ir dar uma palestra aos seus jogadores. Não estão recetivos, é uma questão cultural.
Quais as maiores dificuldades que sentiu para conciliar os estudos com a carreira?
Fui estudar e jogar para a Covilhã e das coisas mais difíceis era ver a malta da faculdade ir para as noitadas e eu ter de ficar em casa. Vivia com eles e depois do jantar, lá iam... E tinha de ir para as aulas à segunda-feira de manhãzinha, que era o único dia de folga do plantel. Custava, prescindia de muita coisa, mas sentia que conseguia fazer tudo e a verdade é que consegui. Quando acabei a universidade, candidatei-me para dar aulas de Educação Física, cheguei a ser colocado, foi quando percebi que podia ir jogar para um clube da I Liga e optei pelo futebol.
Foram os seus pais que lhe passaram este juízo todo?
[risos] Sim. As minhas três irmãs, todas elas estudaram e eu quis ser como elas. Foi a educação que tive em casa e depois fui observando à minha volta.
Cristiano Ronaldo é um modelo para os jovens em todo o mundo. Costuma falar dele nas suas palestras?
O Cristiano Ronaldo ganha muito, mas se gastar muito também vai ficar pobre. É uma questão de atitude e é disso que falo nas palestras. Toda a gente vê o que o Cristiano tem, mas nem toda a gente se lembra do que fez para chegar a este nível. Nunca conheci ninguém que trabalhasse tanto como o Cristiano.
O que mais costuma dizer quando fala com os seus colegas de profissão sobre o assunto?
Costumo dizer que pelo menos uma casa têm de ter paga quando chegam ao final da carreira. Estamos a falar de prevenção e o problema é transversal a todas as modalidades e inclusive aos árbitros.
SAIBA QUE
Fora de Portugal, há vários estudos que indicam a quantidade de jogadores que têm de continuar a trabalhar ou que ficam falidos após terminarem as suas carreiras desportivas. Tarantini usa esses dados nas suas palestras e quer, no âmbito do seu projeto, quantificar também essa realidade em Portugal. "Isso é possível fazer-se através, por exemplo, da criação de bolsas de investigação", afirma o futebolista do Rio Ave. Enquanto não tem dados a nível interno, Tarantini aponta: "60% dos jogadores da NBA ficam falidos em cinco anos após o final da carreira. E três em cada cinco jogadores da liga inglesa de futebol declaram falência num máximo de cinco anos depois de se retirarem."