PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
Corpo do artigo
1 - Existem momentos nas transmissões futebolísticas que parecem cinema. O Barcelona tinha acabado de sofrer o 0-1 e cada grande plano denunciava um estado emocional transversal, a cara de medo de muitos jogadores do Barça, Araújo a pedir cabeça para que a equipa não se perdesse e Xavi, agitado, chamando algum jogador para lhe dar mais ânimo do que indicações.
Na jogada seguinte, porém, um jogador subiu acima do jogo e deste seu sentimento até o mudar por si só. João Cancelo. Arrancou com a bola, na clássica diagonal do ala de “pé trocado” (lateral destro na esquerda) e fez um golo, empatando o jogo e impedindo que aquele estado de medo duma equipa claramente insegura não tivesse mais de um minuto para criar raízes. Depois, já na segunda parte, voltou a inventar outra “jogada acima do jogo” e deu para o “gato Félix” encostar e resolver. O filme mudava de guião com um protagonista claro.
2 - O FC Porto perdeu o seu momento de agarrar um jogo que, na atmosfera emocional criada, tinha tudo para dominar pela tática que começou forte na pressão alta de recuperação da bola. Conceição decidiu, mesmo nestes cenários supracompetitivos da Champions, voltar à fórmula que deu as melhores exibições e o 4x4x2 teve poder para atacar e logo fechar-se rapidamente a defender.
Era o tipo de jogo que necessitava de uma equipa adulta e o treinador encontrou-a na tática e em campo, onde Varela deu a consistência de autoridade no meio-campo que o coletivo necessita dele. Galeno mostrou que não precisa de jogar todos os dias para manter a memória dos esticões de ataque rápido. Cada ataque meteu nervos nas pernas da defesa catalã (poucas vezes na história isso acontece) mas, com as estranhas hesitações de Taremi, poucos olharam da forma certa a baliza.
3- O Inter não entrou, mentalmente e nas forças do onze, inteiro no jogo e o Benfica fez três golos (podia ter feito mais), ao ponto de sentir-se vencedor só com a primeira parte disputada. A noite parecia quase um universo paralelo do que tem acontecido, ao ponto de até a Tengstedt tudo estar a correr bem, nos passes, assistências mesmo com ressalto e desmarcações trincando a língua. O estado de ânimo move montanhas de jogadores.
A “mosca tsé-tsé” tática e mental, no balneário, durante o intervalo, terá picado toda a equipa que mudou em tudo na segunda parte. João Neves, com a “veterania” dos seus 19 anos, percebeu antes de todos o que podia acontecer e tentou reagir mas ninguém lhe deu demasiada importância. Schmidt, o treinador que então tinha de jogar desde o banco, cristalizou e, com o verdadeiro Inter em campo, o jogo (e resultado) mudou. Em poucos minutos, mudara, dos dois lados, o espírito e a ordem tática. O Benfica volta a mergulhar em dúvidas entre ilusões e realidade.
O regresso do campeonato após três semanas de paragem não irá trazer equipas diferentes mas será neste seu segundo terço (o núcleo central da época) que se podem definir os participantes em cada um dos três campeonatos: o do título, o de luta por lugares europeus e da fuga à descida. É sobretudo nestes dois últimos que essa definição depende de como entrarem nesta fase. As equipas que acompanharam a paragem com chicotadas, Arouca e Casa Pia, eram dois casos que via, à partida, mais da classe média-alta mas deixaram cristalizar o seu jogo. Crescer passa mais por redimensionar alguns jogadores do que reinventar o estilo.
Em busca da equipa-sensação, perceber até onde pode ir a projeção do Moreirense. É o clássico caso do sucesso do onze-base mas que para manter o nível atingido será confrontado com a dimensão do plantel. Neste jogo com o Benfica, sem um dos membros da sala de máquinas, Ofori, peça da dupla com Franco, o processo de jogo fica competitivamente mais sensível. É, no fundo, um linha muito ténue que pode separar dum campeonato de outro.
O Vitória está a crescer mais na dimensão das variações de jogo que a equipa consegue criar, abrindo-a a mais jogadores com características diferentes. É um processo de crescimento diferente mas com mais argumentos de sustentação a médio/longo prazo. Esse é o grande desafio que se coloca à maioria dos clubes.