Zelão está há uma década na Luz, onde até já treina os juvenis, e destaca a vinda do técnico brasileiro para o triplete, sem esquecer as nove temporadas com o "prof" José Jardim
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Flávio Soares tem 1,96 metros e cumpriu uma década pelo Benfica. Ainda assim, por este nome poucos o conhecem. Ele é o Zelão, personagem de banda desenhada que apreciava quando era um menino brasileiro. A alcunha pegou a contragosto, mas hoje todos o conhecem assim. Tendo já renovado, contou a O JOGO como o Benfica alcançou o segundo triplete da década.
O Sporting chegou no ano passado e foi campeão. Não temeram que o vosso poder fosse apagado?
No ano passado estávamos prestes a ser campeões. Este ano, perdemos o Rui Mourinha [presidente da secção no Benfica] e só pensámos que queríamos que ele fosse [falecesse] com esse título. Foi especial dedicar-lhe o título este ano. Não chegou a existir pressão. Estávamos convictos de que conseguiríamos.
Foi capitão de equipa em outras épocas. O que foi dizendo aos colegas?
Passo a mensagem do trabalho. Tentava que o treino não fosse abaixo. Seria fatal. O Sporting tinha grande equipa. Não podiam existir tropeções, porque a Fonte do Bastardo também estava bem.
O que mudou com o treinador Marcel Matz?
Conhecia o Matz como estatístico. Vem de um voleibol mais avançado. Trouxe uma enorme vontade de ganhar. O professor Jardim também a tinha, mas o Marcel queria mostrar-se. No Brasil ainda não passou numa equipa de grande porte e mostrou que tem potencial para isso.
Houve momentos em que vos chamou à atenção?
Com um piscar de olhos, as equipas empatam o jogo e voltam à discussão. Sempre nos chamou à realidade. Pedia que lutássemos por cada ponto.
E a saída do José Jardim?
Já não o vemos na quadra. Observa, mas não intervém. A amizade e o apreço de nove anos de trabalho continuam. Há um laço forte, na vitória e na derrota. Continuamos a tratá-lo por "prof."
Em 2015, o Benfica chegou ao triplete. Repetiu-o agora. Era uma meta?
Fomos jogo a jogo. Dividimos a época. Primeiro, a Supertaça, depois a Taça. Nunca falámos do triplete, mas as metas iam sendo realizadas. Sempre vimos que era possível.
O voleibol é a modalidade de pavilhão que mais títulos deu nesta década. Não é falta de reconhecimento terem pouca gente na Luz?
Reconhecimento é uma palavra muito forte. Somos muito acarinhados, mas gostávamos de ter mais público. Já esteve pior, quando não tínhamos ninguém.
"Europa é um sonho possível"
É dos poucos que sabem o que era o Benfica há dez anos.
Ao chegar, fiquei de boca aberta. Não esperava encontrar a estrutura, este pavilhão. O atleta não tem de se preocupar. No Brasil não existe isto.
Estavam longe de dominar a modalidade...
Foram quatro épocas para ser campeão.
Conquistou 18 troféus, dos quais cinco campeonatos. Há algum especial?
Guardo com carinho a primeira Taça de Portugal, na minha segunda época. Perdemos a final do campeonato em 2009/10 e passámos um bom bocado para estar na final. A primeira liga, claro, quatro anos depois, foi especial.
O Benfica pode ganhar na Europa?
É um título que ainda falta. Já estivemos na final e nas meias-finais. Perdemos sempre para os campeões. É possível.
"Não vou acabar agora, mas é um sonho fazê-lo no Benfica"
"Não pretendo acabar agora, mas é um sonho fazê-lo no Benfica", diz Zelão, que aos 36 anos desenvolveu outro gosto, o de treinador. É técnico nos juvenis encarnados, onde joga o filho Pedro, de 16 anos, com 1,87 metros e "potencial". Dedicado a essa nova paixão, esquece que nunca jogou nem pelo Brasil nem por Portugal, seleções que no próximo domingo se defrontam em Gondomar, para a Liga das Nações. Neste momento Zelão olha, sobretudo, pela família. "Quando se deu a mudança para cá, brusca, ela quase perdeu o menino mais novo [David]. Passou sete meses internada e eu a treinar. Valeu a ajuda do meu colega Jardel e da mulher."