Desde Armindo Araújo, em 2012, que a prova lusa do Mundial não tinha um piloto nacional com um WRC
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A 58.ª edição do Rali de Portugal, que se inicia esta quinta-feira com a superespecial da Figueira da Foz, vai ter uma presença recorde de carros Rally1 esta temporada, atingindo os 12 com a inscrição do português Diogo Salvi entre os pilotos com os modelos mais potentes. O empresário de 55 anos, filho de Giovanni Salvi, campeão nacional de ralis em 1977, alugou um Ford Puma à M-Sport e vai correr ao lado dos craques do WRC, navegado pelo espanhol Axel Coronado.
“Faço ralis há mais de dez anos e era um sonho correr um rali que gosto tanto no melhor carro de sempre. Acaba por ser a Fórmula 1 dos ralis. Surgiu a hipótese de aproveitar, devido à minha vida empresarial”, explicou o piloto a O JOGO.
Salvi, que em 2002 fundou a TimWeTech, sediada em Lisboa, mas com faturação só proveniente do estrangeiro – e escritórios em 80 países, dos cinco continentes –, tem a empresa tecnológica de telecomunicações móveis a preencher toda a decoração do Puma, pagando uma aparição rara: desde 2012, último ano de Armindo Araújo na Mini, que não há um português ao volante de um WRC. A paixão de Diogo Salvi fez dele presença assídua nos ralis nacionais – foi décimo no Rali Casinos do Algarve já este ano –, correndo com um Skoda Fabia a partir de 2017, depois de três épocas com um Ford Fiesta e as quatro anteriores em Mitsubishi Lancer. Já com dez participações no Rali de Portugal, a maioria com o Skoda, foi 22.º (e terceiro português) em 2018, o seu melhor resultado. Esse historial ajudou ao aluguer por parte da M-Sport, pois além do (muito) dinheiro é necessária a licença FIA, currículo e alguma ligação à marca.
Este ano, e mesmo testando “com alguma regularidade”, uma “vida empresarial muito ativa” não lhe permitiu uma preparação completa para a quinta etapa do Mundial de ralis. O primeiro contacto com o carro aconteceu no sábado, na região de Mortágua. “Obviamente, com a minha idade, a parte física é um tema. Em termos desportivos, não existe qualquer tipo de aspiração”, adianta o “gentleman driver”, a expressão usada para designar os entusiastas do desporto automóvel que pagam para alinhar com os pilotos profissionais. Assim, Salvi apresenta-se apenas apostado em “desfrutar e ter a experiência de guiar um Fórmula 1 dos ralis”. “Tenho a completa noção que os mecanismos, a habituação ao carro não vão acontecer nesta prova. Na prática, vou andar mais devagar do que andaria se fosse no meu carro normal, independentemente de este ter mais performance”, finaliza.
Uma aventura de 300 mil euros
O grego Jourdan Serderidis é o mais conhecido dos “gentlemen drivers” do WRC, com 38 ralis do Mundial desde 2013, o italiano Lorenzo Bertelli, herdeiro da Prada, provavelmente o mais famoso (66 entradas no WRC), mas na realidade a lista de pilotos pagantes é reduzida, pois, além da necessidade de licença internacional, o preço não está ao alcance de qualquer um. “O custo é muito elevado e, por isso, é raríssima a situação deste tipo de aluguer. Isso é uma das coisas que a FIA está a fazer, tentar descer o valor. São preços proibitivos, diria, e isso não é bom. É preciso haver o máximo possível de carros de primeira linha para atrair cada vez mais espectadores”, defende Diogo Salvi, confirmando que esta presença no Rali de Portugal “foi, sem dúvida, um investimento pessoal”. Ao que O JOGO apurou, guiar um Rally1 numa prova do WRC como a portuguesa ou Acrópole nunca custa menos de 300 mil euros.
Contacto internacional frequente
A considerável experiência de Diogo Salvi nos ralis também se traduz num vasto leque de contactos internacionais, à imagem de como conduz os seus negócios. “Costumo trazer pilotos internacionais para me ajudarem nos testes que faço em Portugal”, relatou, destacando a proximidade com nomes como Teemu Suninen, Jan Solans, Nil Solans, Pierre-Louis Loubet ou Eric Camilli. “Já andei com todos e era muito próximo do Craig Breen, que foi com quem comecei”, acrescentou, recordando o malogrado norte-irlandês, falecido há pouco mais de dois anos. Lá fora, Salvi já participou no Rali da Acrópole (2022) e Turquia (2019) e uma ida ao novíssimo Rali da Arábia Saudita esteve em equação. “Recebi um feedback tão mau de quem esteve recentemente num rali próximo com troços que vão ser utilizados que não vou”, disse.
Bichinho paterno à vista
Filho de pais italianos, que se encontravam em Lisboa devido à Segunda Guerra Mundial, Giovanni Salvi, campeão nacional em 1977 num Ford Escort RS 2000, passou a Diogo Salvi a paixão pelos ralis. “Ficou o bichinho da adrenalina e da velocidade. Desde muito cedo comecei a ir às provas, lembro-me de ir a Castelo Branco, Açores, Madeira... Os ralis também têm essa parte, familiar, gastronómica, e acaba por se conhecer algo coisa do património. É uma envolvente muito gira em termos sociais”, atesta.