ENTREVISTA >> Rui Silva, que é hoje em dia uma das mais altas figuras da equipa do FC Porto, passou por dias bastante complicados, em especial a morte do pai, Miguel, quando já era dragão
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A morte do pai, Miguel, de forma inesperada em 2015, foi um golpe muito rude para Rui Silva.
Recuando de novo aos 14 anos, e aos 15, em que começou a jogar na I Divisão, o que mudou em si enquanto jogador de andebol, agora que tem 28 anos?
-Se calhar eu apareci cedo de mais para o que é normal. Tive momentos bons, tive outros maus, tive momentos em que, se calhar, as pessoas acharam que eu não ia atingir aquilo que pensavam, mas soube-me adaptar, perceber que apenas o talento não chega e que o trabalho diário, e mesmo o que se passa fora do pavilhão, acaba por ser muito importante. Sou feliz e ambicioso, quero sempre mais de mim e de quem me rodeia. Eu sinto muito tudo o que gira à volta da equipa.
Isso deve-se a quê?
-Creio que se deve à formação e às pessoas que tive sempre próximas de mim. Por influência familiar, porque, quer queiramos quer não, o que vem dos nossos pais também influencia. Depois esta minha competitividade pessoal, em que sou super exigente comigo mesmo.
Meia distância dos azuis e brancos teve alguns períodos complicados a nível pessoal, que, admite, lhe afetaram o rendimento, mas deu a volta por cima e joga em "nome do pai, sem esquecer a mãe"
Como fica perante uma derrota?
-Fico de rastos. Quando era novo não sabia perder, chorava, se pudesse bater em alguém quando perdia batia, mas depois houve esse crescimento.
Costuma ir logo ver os jogos quando perde?
-Normalmente, corra bem ou corra mal, tenho a noção de quase tudo o que se passou no jogo. Se vir que há necessidade de o ver, vejo, mas não é coisa que faça muito. Eu sei bem onde errei.
O Rui Silva que hoje tem 28 anos é, portanto, um atleta que passou a lidar melhor com a derrota, mas altamente competitivo...
-Sim, eu adoro ganhar. Não sei se alguém gosta mais do que eu, mas na minha cabeça ninguém gosta mais. Eu sou trabalhador e percebi que só o talento não chega.
Quando é que percebeu isso?
-Quando as coisas começaram a correr menos bem, quando tive a noção que estava a ficar para trás e isso eu não queria. Foi no meu último ano de Sporting, o que também me fez querer mudar. No início complicado no FC Porto também, mas aí quis alterar a postura, nunca desisti, não queria ficar por ali, era muito novo, e o facto de ser tão competitivo comigo mesmo fez-me pensar que não queria que as pessoas olhassem para mim como alguém que tinha desistido.
"Em desistir mesmo, de verdade, nunca pensei, mas o momento do falecimento do meu pai incomodou-me muito"
Mas chegou a pensar em desistir da modalidade?
-Em desistir mesmo, de verdade, nunca pensei, mas o momento do falecimento do meu pai [Miguel] incomodou-me muito e, depois, o facto de no andebol as coisas não estarem a correr bem, piorou as coisas. Não foi querer desistir, mas foi o sentir-me conformado com aquilo que havia à minha volta e um dia perceber que aquele não era o caminho nem aquilo que eu queria. Da mesma forma que me custou muito o que me aconteceu, e a questão do luto é complicada, demorei a perceber qual seria a forma de continuar a fazer aquilo que gostava, e foi honrando a pessoa que tinha saído da minha vida e ser como o meu pai, que era um maluco da vida e um lutador, às vezes teimoso demais (ri-se), mas foi levar as coisas boas que ele tinha.
Muito desta grande carreira é "em nome do pai"?
-É, mas sem nunca esquecer o "em nome da mãe". Mas sim, quando alguém não está cá uma pessoa... A saudade faz parte de nós e do que a vida nos proporciona. Mas tudo o que fiz enquanto ele foi vivo, porque ele também me ajudou muito, por ter sido dirigente, e tudo o que os meus pais me proporcionaram, que foi uma formação boa e com qualidade porque também se dedicaram ao andebol, ajudou-me muito. Tudo o que tenho e sou devo-o ao que os meus pais trabalharam e, de certa forma, influenciaram.